terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Educomunicação - Novas possibilidades de protagonismo juvenil

Resenha de "Educomunicação: o conceito, o profissional, a aplicação: contribuições para a reforma do ensino médio", livro de Ismar de Oliveira Soares, lançado em 2011 pela Paulinas.

Resenha - "Educomunicação: o conceito, o profissional, a aplicação: contribuições para a reforma do ensino médio"
Por Antonia Alves (*)

Tendo a primeira edição lançada em fevereiro e a segunda, em agosto, a obra do coordenador do Núcleo de Comunicação e Educação (NCE) da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), professor Ismar de Oliveira Soares, é um brinde à sistematização do conceito de Educomunicação.

Desde o final dos anos 90, o pesquisador vem buscando identificar e sistematizar a existência desse novo campo, que não se encontra na comunicação nem na educação, pois tem seu próprio campo epistemológico do conhecimento. Constitui-se, portanto, numa interface apontando para uma nova realidade no âmbito da educação formal, não-formal e informal como atestam suas pesquisas.

A obra “Educomunicação: o conceito, o profissional, a aplicação: contribuições para a reforma do Ensino Médio” é uma verdadeira cartografia desse novo campo, resgatando os precursores das experiências oriundas dos anos 1970 na América Latina, principalmente, ligadas aos movimentos de educação popular, comunicação popular e comunicação alternativa e popular. Ainda aponta sua legitimação na sociedade civil mediante a criação de políticas públicas e atividades desenvolvidas em escolas com a parceria de ONGs que tem sua prática e metodologia fundada na perspectiva educomunicativa. Organizado em nove capítulos e prefaciado pelo jornalista, educomunicador e secretário executivo da Rede CEP (Comunicação, Educação e Participação), Alexandre Le Voci Sayad, o “livro-síntese” – como o autor o entende – surgiu da solicitação dos agentes que vêm trabalhando com o conceito. São três capítulos dedicados ao conceito: De experiência alternativa a política pública (capítulo 3); Educomunicação: ecossistema comunicativo e áreas de intervenção (capítulo 4); Educomunicação no debate sobre a política educacional (capítulo 5).

Para dar conta do item profissional são dedicados dois capítulos, o segundo e o sexto: “Os jovens e a comunicação: desafios para a educação” e “O educomunicador, a um só tempo: docente, consultor e pesquisador”, respectivamente. A aplicação é evidenciada em três capítulos: Educomunicação: a busca do diálogo entre a educação e a comunicação (capítulo 1); Tratamento educomunicativo para o tema do meio ambiente (capítulo 7); e Retomando a proposta de ação comunicativa do Ensino Médio (capítulo 8).

O Conceito

Da experiência alternativa à política pública – no terceiro capítulo – o autor resgata a história da educomunicação que vem sendo referendada desde os anos 80 para designar uma prática denominada de “media education” na Europa – educação para a recepção crítica dos meios de comunicação, e na América Latina por educação para comunicação.

Destacam-se as práticas que foram surgindo com grande volume na América Latina, dentre as quais as pesquisas que o NCE/ECA-USP vem realizando desde 1997 com pesquisadores desses países. Desde o ano 2000, o conceito como é concebido hoje passou a circular fora da fronteira nacional em artigos e livros.

Torna-se necessário para a existência do conceito que as práticas sejam realizadas num ecossistema comunicativo criado e desenvolvido pelos educadores a partir de ações inclusivas, democráticas, midiáticas e criativas. Esse ecossistema é considerado como uma teia de relações que, não emergem naturalmente do ambiente, “mas precisa ser construído intencionalmente. Existem obstáculos que têm de ser enfrentados e vencidos”. (SOARES, 2011, p. 37).

O quarto capítulo mostra o conceito como ecossistema comunicativo e suas áreas de intervenção. Busca esse sentido em Martín-Barbero, ressignificando o conceito como um ambiente educativo caracterizado pela

opção de seus construtores pela abertura à participação, garantindo não apenas a boa convivência entre as pessoas, mas simultaneamente, um efetivo diálogo sobre as práticas educativas elementos que conforma a pedagogia da comunicação. (p. 45).

Para essa construção os educomunicadores se valem das áreas de intervenção, consideradas portas de acesso pelo autor. Intervenção no sentido de possibilitar mudanças significativas no ambiente e não no sentido negativo de imposição. Essas áreas são: educação para a comunicação (media education); expressão comunicativa através das artes (criatividade); mediação tecnológica na educação (procedimentos e reflexões sobre a presença das TIC); pedagogia da comunicação (ensino escolar); gestão da comunicação (planejamento e execução de planos, programas e projetos); e reflexão epistemológica (sistematização das experiências).

Já o quinto capítulo apresenta práticas educomunicativas como ampliação do tempo disponível na escola como propõe a flexibilização do currículo do Ensino Médio. Ainda nesse capítulo, apresenta as políticas públicas na capital de São Paulo e no Estado de Mato Grosso surgidas pelo sucesso dos programas de rádio denominados “educom.rádio” e “educom.rádio.centro-oeste”, respectivamente. Essas políticas são uma forma de garantir continuidade aos programas, após mudanças governamentais.

O profissional

Os capítulos dois e seis apresentam o novo profissional desse campo de intervenção, ao mesmo tempo, como docente, consultor e pesquisador. É isso que pretende formar a Licenciatura em Educomunicação iniciada neste ano na ECA-USP. A licenciatura dá direito a esse profissional de lecionar na educação formal. No âmbito da consultoria pode atuar em escolas, empresas e ONG. Para Soares (p. 65) o educomunicador

tem uma extrema facilidade de se comunicar, expressa num conjunto de qualidades como abertura para o outro, o diálogo na gestão dos conflitos, capacidade de contextualizar os problemas e encontrar soluções de interesse para a coletividade, assegurando a adesão de seus interlocutores à propostas que defendem.

Aponta quatro gerações de educomunicadores e ainda uma quinta que começa a despontar formada pelos adolescentes e jovens participantes de práticas educomunicativas. A primeira tem como precursores Paulo Freire e Mario Kaplún. A segunda é formada pelos especialistas por programas educomunicativos na ocasião da pesquisa realizada em 1997 pelo NCE/ECA-USP. A terceira por profissionais que no ano 2000 atuavam em organizações da sociedade civil (Rede CEP). Já a quarta geração é representada por jovens universitários que trabalham com projetos colaborativos.

Esse profissional no âmbito escolar é convidado a trabalhar com “uma juventude que deseja uma escola que responda a seus anseios” (p. 24), pois segundo as pesquisas recentes a maioria dos jovens abandona a escola, não por questão de trabalho, mas por desinteresse. É preciso querer trabalhar com uma juventude que se envolve com a comunicação fora da escola, que assimila e é assimilada pela cultura digital, que se envolve com práticas educomunicativas.

A aplicação

A aplicação da Educomunicação é evidenciada em três capítulos (1, 3 e 7). Logo no primeiro, aponta as atitudes de mudanças que vêm ocorrendo no ensino ante as TIC previstas nas metas da LDB e concretizadas nos PCNs que instaura uma visão interdisciplinar baseada em três áreas do conhecimento: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Ciências Humanas e suas Tecnologias; e Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias.

É a partir dessa contextualização que Soares propõe quatro linhas de articulação que facilitam o aprofundamento do diálogo entre a educomunicação e o sistema escolar: pressupostos; educomunicação como campo de interface; educomunicação nos distintos âmbitos da prática educativa (gestão escolar, disciplinar e transdisciplinar); e formação do professor-educomunicador.

A questão transdisciplinar é destacada no capítulo sétimo apresentando a possibilidade de se trabalhar os temas transversais, detendo-se como a questão ambiental que vem sendo trabalhada pelo Ministério do Ambiente com a sociedade civil e com as escolas; ainda, sobre a questão da violência no espaço escolar como o “bullying” – um conflito no ecossistema comunicativo escolar.

Por fim, no oitavo capítulo o autor deixa claro que quem assim vive a educomunicação, está diante do desafio de uma série de convocações: dialogar com o poder público, promover a formação de educomunicadores e fortalecer o Ensino Médio Inovador (EMI).

Para os desafios da Educomunicação para o EMI são precisos quatro itinerários a serem percorridos: pedagogia da comunicação; mediações tecnológicas; gestão; e formação docente e do educomunicador. Para isso são necessárias algumas linhas de ação destinadas a pensar a educomunicação no contexto do EMI: diálogo entre os campos, para além da grade curricular; âmbitos de ação no ambiente escolar; estabelecer metas programáticas; formação do educador-educomunicador; modalidade de formação docente; sobre os especialistas externos.

Ensino Médio Inovador

Todo o livro tem um traço marcante apontando para o Ensino Médio Inovador sem deixar de considerar outros vínculos da educomunicação com o ensino fundamental ou os movimentos fora da escola. Lembra que após dez anos da LDB, o Ministério da Educação deseja efetivar a introdução das tecnologias no Ensino Médio e para tanto criou o Programa Mais Educação para as escolas que queiram participar, tendo subsidiadas em suas atividades extraclasses, os “contraturnos” como são chamados. Essas atividades chamadas de macrocampos têm entre eles o macrocampo da educomunicação.

A relação da educomunicação com a escola na concepção do professor Ismar perpassa os âmbitos da gestão escolar, disciplinar e transdisciplinar. Nesse último podem se intervir as atividades extraclasses mediante a “realização de atividades práticas (oficinas regulares de ações educomunicativas) ou de mobilizações voltadas à socialização das experiências vivenciadas (mostras, seminários e encontros)” (p. 19).

E ainda é um convite à educação formal possa assimilar para seu próprio benefício essa “experiência que nasceu fora de suas paredes, no espaço das relações não formais de produção e difusão de sentidos, no contexto dos embates da luta social por novos e mais franqueados espaços de comunicação e de expressão” (p. 41).

O que acrescentar?

Linguagem simples e enxuta, não deixando de ser profunda, a obra apresenta-se como leitura obrigatória a todos aqueles que querem viver a educomunicação em sua essência. Ao ler a obra fica evidente que o conceito/prática tendo nascido no âmbito da sociedade civil enquanto práticas de mobilização social e resgate do cidadão, adentram no universo do ensino formal graças à abertura desse à inter-relação comunicação-educação.

São 95 páginas de puro encantamento, levando o leitor a uma descrição histórica do conceito entrelaçando-o com os personagens que fizeram história, ao mesmo tempo, em que aponta sua pontualidade nos dias atuais pelas conquistas realizadas e perspectivas futuras do campo.

Não cabe a pergunta: “só resta saber se os dirigentes governamentais vão agregá-la às escolas” porque já é uma realidade com o Programa “Mais Educação” desde 2007; no entanto, cabe outra pergunta: quando essa prática educomunicativa estará presente em todas as escolas públicas do Brasil, deixando alunos mais motivados por meio de um exercício pleno de cidadania?

Então, caro leitor, adentre nessa magnífica obra e encontre razões plausíveis que se colocam como possibilidades de transformação de uma nação pela presença de cidadãos criativos, participativos e empreendedores de comunicação.


(*) Antonia Alves é Mestranda em Ciências da Comunicação da Escola de Comunicação & Artes (ECA) do PPGCOM da Universidade de São Paulo (USP).
Fonte: http://www.educomunicacao.com/2011/10/educomunicacao-na-escola-possibilidades.html

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