Dezesseis instituições, em Brasília, Rio e mais cinco estados, estão aptas a realizar o SAT, que serve de vestibular nos EUA
Fonte de inspiração para o Exame Nacional do ensino médio (Enem), o SAT Reasoning Test (teste de raciocínio), ou simplesmente SAT, é uma prova aplicada em mais de 170 países e territórios, entre eles, o Brasil. O exame serve de vestibular nos Estados Unidos e é realizado na mesma data no mundo inteiro. Diferentemente do Enem, que só é feito uma vez por ano, o SAT tem sete edições nos EUA e seis no resto do planeta, anualmente. O último sábado foi dia de prova em cerca de sete mil endereços, sendo 16 deles em Brasília, Rio e outros cinco estados brasileiros.
O Enem americano é apenas um dos critérios de seleção de universitários nos EUA. É que as instituições daquele país levam em conta o histórico escolar e cartas de recomendação dos professores de ensino médio das escolas por onde os alunos passaram. O teste consiste numa redação e em questões objetivas de inglês e matemática. Aplicado num único dia, dura cerca de cinco horas e meia, com direito a dois intervalos de cinco minutos.
Provas são montadas nos EUA e enviadas impressas
Os estudantes não só podem fazer a prova mais de uma vez, como têm a opção de utilizar as melhores notas de cada parte do teste para submeter às universidades. Assim, quem obteve melhor resultado em matemática, em um mês, e em inglês, em outro, pode selecionar as pontuações mais elevadas para encaminhar às instituições de ensino.
A escola Americana de Brasília é um dos centros credenciados para aplicar o exame no Brasil. As provas são montadas nos Estados Unidos e enviadas, em papel, por uma empresa privada de correio. A aplicação, porém, é feita por escolas credenciadas pelo College Board, instituto sem fins lucrativos criado em 1900, com sede em Nova York, e que responde pelo SAT. O exame propriamente dito surgiu em 1926.
O credenciamento prevê medidas de segurança e controle para evitar fraudes. Mas o SAT é feito anualmente sem a necessidade de operações de guerra como as que têm caracterizado o Enem brasileiro, até com uso das Forças Armadas. Sem falar que as três últimas edições do Enem - desde que o exame foi reformulado para substituir vestibulares em universidades federais - foram marcadas por vazamentos, erros de impressão e confusões que levaram a Justiça a suspender temporariamente ou mesmo a cancelar as provas para uma parcela dos participantes.
No Rio, há dois colégios credenciados
A parte logística do SAT fica sob responsabilidade da ETS, uma empresa privada localizada nos EUA. Indagada sobre como pode garantir a inviolabilidade de provas enviadas para mais de 170 países e territórios, a ETS respondeu: "É uma questão de confiança." A partir do próximo ano letivo nos EUA, que começa no segundo semestre, o SAT adotará critérios mais rígidos, como exigir que os estudantes enviem foto já no ato da inscrição, que é feita pela internet. Um dos desafios é impedir que uma pessoa faça a prova no lugar de outra.
A orientadora acadêmica da escola Americana de Brasília, Emily Dobson, diz que o credenciamento pode ser cassado, caso sejam detectadas irregularidades. Ela lembra que, diferentemente do Enem, o SAT não tem o condão de assegurar uma vaga na universidade, já que as instituições levam em conta também o histórico escolar e outros itens:
- Não temos essa pressão.
Emily esclarece ainda que o parecer de um orientador acadêmico - profissional que auxilia os estudantes em sua opção e acesso ao ensino superior - pode até mesmo valer mais do que a nota do aluno no SAT.
No Rio, a escola Americana do Rio de Janeiro e a escola Nossa Senhora da Misericórdia (Our Lady of Mercy School) estão credenciadas para aplicar o SAT. Em São Paulo, o Colégio Bandeirantes é outro apto a realizar a prova. O coordenador de assuntos internacionais da escola, José Olavo de Amorim, diz que 77 estudantes se inscreveram para a prova do último sábado. O lugar onde cada candidato vai se sentar para fazer o teste é previamente marcado. Quem tem mais de 21 anos fica nas fileiras da frente. A definição dos locais ocupados por cada estudante permite cruzar resultados e levantar indícios sobre eventuais casos de cola.
Amorim conta que o Bandeirantes ficou apto a realizar o SAT em 2010:
- Houve um crescimento do interesse das pessoas em fazer as provas - diz o coordenador.
Na escola Americana de Brasília, é oferecido um curso preparatório para o exame. É uma espécie de pré-vestibular para o SAT, com cinco aulas por videoconferência com um professor que está em Nova York. Os estudantes do 2 ano do ensino médio Luna Barroso, Julia Fonteles e Issa Nasr, de 16 anos, fizeram o curso preparatório.
- Não é aula de conteúdo. São dicas para eliminar as respostas erradas - comentou Luna, há duas semanas.
Um exame sólido e sem surpresas
O especialista em avaliação educacional da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Francisco Soares diz que o Enem tem muito a aprender com o SAT. Ele destaca o fato de que o exame americano define claramente os conteúdos e não é o único critério para ingresso no ensino superior.
O GLOBO: Quais as principais diferenças entre o SAT e o Enem?
FRANCISCO SOARES: A primeira diferença é que, no SAT, o aluno sabe claramente o que vai ser convidado a responder. É um exame sem surpresa. O Enem é genérico e com surpresa. Só se sabe (os assuntos que vão cair na prova) depois que o teste ocorre. E isso é ruim. Precisamos caminhar para ter especificações sólidas e claras. A segunda diferença é que o SAT não é um vestibular, mas um dos elementos levados em conta pelas universidades.
Nos EUA, são considerados o histórico escolar e as cartas de recomendação. É o melhor caminho?
SOARES: É muito bom que o SAT não seja o único critério. No Brasil, estamos na contramão, dizendo que o bom é usar só o Enem.
O senhor acha possível levar em conta o histórico escolar no Brasil?
SOARES: Não, por causa da nossa tradição clientelista. O Brasil é um país de desigualdade muito grande. Fica complicado aceitar notas de diferentes escolas, pois não há nada em comum entre elas. Criaria um sistema de muita iniquidade.
O senhor está dizendo que uma nota 5, numa escola de alto nível, pode representar um conhecimento maior do que uma nota 10, numa escola menos exigente?
SOARES: Sim. Como não temos condições de utilizar esse tipo de critério, nosso Enem deveria ser um exame para uma primeira etapa de seleção. E, na segunda, as diferentes carreiras colocariam diferentes necessidades. Se você quer ser jornalista e seu colega, engenheiro, não é adequado exigir o mesmo dos dois. Poderíamos sinalizar que a prova de português vai ter peso dois e a de física, um.
Como as redações são corrigidas no SAT?
SOARES: O SAT usa um método holístico. Qual a diferença? Lá, eles leem a redação completa e atribuem uma nota única, de 1 a 6. É muito mais fácil você olhar o conjunto da redação do que dar uma nota pelo critério 1, outra pelo critério 2, outra pelo 3 e assim por diante, como se faz aqui. A nossa grande fragilidade no Enem é a nota de redação, em que há uma flutuação muito grande.
Colégio gaúcho já está na sétima edição
Quem quer ingressar numa universidade dos Estados Unidos pode fazer as provas do SAT em Erechim, cidade de 96 mil habitantes localizada no norte do Rio Grande do Sul, quase na divisa com Santa Catarina, a 370 quilômetros de Porto Alegre. Desde o ano passado, a escola Particular já aplicou sete vezes o mais tradicional teste americano de seleção de calouros.
A irmã Cassilda Prigol, diretora-geral do católico Colégio São José, diz que atendeu ao pedido do pai de duas ex-alunas que costumavam ir a Porto Alegre fazer as provas. Para realizar o SAT em Erechim, a escola passou por um processo de credenciamento junto ao College Board, instituição sem fins lucrativos que administra o exame, com sede em Nova York.
- Precisamos de uma declaração do Conselho Estadual de educação de que somos sérios. E enviamos fotografias para mostrar que guardamos as provas em cofre quando elas chegam - conta.
Seis estudantes estavam inscritos em Erechim para a prova do último sábado. A diretora diz que a escola já recebeu não só estudantes de outros estados, como Rio de Janeiro e Santa Catarina, mas até um aluno dos Estados Unidos para fazer o SAT.
- Em outubro, um menino americano, da Flórida, estava de férias em Curitiba e veio para cá. Disse que era o lugar mais perto para ele.
O Colégio São José tem três profissionais aptos a trabalharem no dia da aplicação do exame. Segundo Cassilda, eles são pagos pelo College Board e recebem um cheque de 150 dólares. A escola providencia que o dinheiro seja trocado por reais em Porto Alegre.
- É tudo muito organizado. Às 13h30m, quando termina o exame, o correio está aqui para pegar as provas e levar para os Estados Unidos. Oito dias depois, os professores recebem o pagamento. O treinamento para aplicar o teste é feito on-line, em inglês. Eles pedem sigilo. Quando as provas chegam, temos que comunicar que chegaram e onde foram guardadas. Regularmente, eles nos solicitam fotos de onde elas se encontram.
Irmã Cassilda diz que moradores de Erechim têm feito o SAT, mas nenhum foi estudar nos EUA ainda:
- Seis alunos nossos fizeram. Estavam no 1 ano do ensino médio e, mesmo assim, se saíram bem. Um deles tem a intenção de ir para os Estados Unidos, mas a mãe quer que ele termine o ensino médio primeiro.
Fonte: O Globo/RJ 07/05/2012
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