sexta-feira, 5 de junho de 2015

O papel dos estímulos na educação infantil

Claudia Ayres - imprensa@marista.org.br.
Pedagoga e coordenadora da educação infantil do Colégio Marista Nossa Senhora da Glória, em São Paulo (SP), da Rede de Colégios do Grupo Marista.



Habilidades não cognitivas, ou socioemocionais, não só podem como são efetivamente desenvolvidas desde a educação infantil. A escola, como está compreendida na pós-modernidade, vem mudando seu paradigma. O que se espera da escola hoje é o acolhimento à diversidade, a construção da aprendizagem por meio de múltiplas linguagens, a integração entre as pessoas, o olhar atento ao outro na perspectiva da solidariedade, a troca de saberes, a cooperação.

Essa concepção de educação aliada à entrada cada vez mais precoce das crianças na escola em função das demandas sociais geradas para as famílias (necessidade de mais horas de trabalho, mudança no papel social da mulher) trouxeram para a escola a ampliação do currículo, um novo olhar. Hoje (implícita ou explicitamente), cabe à escola a formação integral do indivíduo. Sendo assim, as habilidades não cognitivas, ou socioemocionais, compõem os currículos escolares desde a educação infantil.

A primeira infância é um período de crescimento em que os canais de aprendizagem estão todos abertos. Por ser o primeiro espaço com o qual convivem fora do âmbito familiar, a escola é um ambiente privilegiado não só para as aprendizagens formais, como também para o desenvolvimento das habilidades não cognitivas. Da mesma maneira que os alunos são receptivos ao letramento por meio de múltiplas linguagens, também o são para aprender a ser solidário, respeitoso, a negociar interesses e vontades, a argumentar, a esperar, a ter autocontrole, a perseverar, a tornar-se autônomo, reflexivo, curioso, a resolver problemas.

As crianças são essencialmente plásticas e, na escola, têm a oportunidade de experenciar situações que, em algumas gerações anteriores, eram vivenciadas apenas por intermédio das relações familiares.

As habilidades não cognitivas são estimuladas e vão sendo construídas, pelas crianças, na relação que fazem entre os seus saberes e o objeto de conhecimento e nas relações interpessoais próprias do ambiente escolar. Passam, assim, a se refletirem no modo de agir e de ver o mundo.

A educação infantil que compreende a educação de maneira interacionista atua em favor do desenvolvimento das habilidades não cognitivas de maneira constante, já intrínseca ao planejamento e à maneira de compreender como se processa a construção do conhecimento, seja em qual esfera for. Não há mais a dicotomia na ação educativa. O aluno é percebido de maneira integral – física, intelectual, pessoal e social.

Por isso, a informação é o melhor instrumento e ela se apresenta em múltiplas oportunidades: desde a apresentação inicial que se faz às famílias sobre a filosofia da instituição, passando pelas reuniões com pais e pela partilha de textos que validam essa perspectiva educativa, até a socialização de produções das crianças por meio de exposições, tarefas, campanhas solidárias e a mudança de comportamento percebida nos filhos. Essas últimas, talvez, sejam as de maior relevância porque são o demonstrativo da evolução, do crescimento de cada um deles como seres humanos preocupados com os outros e com o mundo em que vivem.

A vó que me ensinou a pensar tecnologia

Vinícius Soares Pinto - vinicius@colegiomedianeira.g12.br
É responsável pela Educação Digital e a Comunicação do Colégio Medianeira. É formado em Publicidade e Propaganda (UP), especialista em Comunicação, Cultura e Arte (PUCPR) e Cinema (Tuiuti).



Uma cozinha bem equipada com liquidificador, processador de alimentos, batedeira, fritadeira, chaleira elétrica, entre outras invenções do mundo moderno é o ambiente da casa em que a minha vó, uma senhora de quase setenta anos, mais gosta de passar o tempo. As máquinas, suas aliadas no preparo da comida simples e de sabor incomparável, dividem espaço com as toalhas bordadas, os pratos com detalhes na porcelana, além de panelas e travessas que, apesar de antigas, estão impecáveis como novas. Transformou a cozinha num ambiente em que a tecnologia divide espaço com a tradição e os costumes da família. Por exemplo, servir uma refeição sobre uma mesa sem toalha e guardanapos? Jamais!

Sempre comenta comigo das dificuldades que passava para fazer essa ou aquela receita quando não se tinha um liquidificador ou um freezer. Como cozinheira experiente, me conta que a culinária é como uma alquimia, em que experimentar ingredientes e técnicas novas são condições básicas para quem quer ter domínio sobre as receitas. Comenta também que errar faz parte do processo, pois nem sempre o resultado final fica como o planejado, como tudo na vida. No entanto, sempre me alerta: "Informe-se o máximo possível sobre aquilo que você gosta. É lendo, estudando, escutando e experimentando que a gente aprende a fazer direito e errar menos. Você já reparou que fora da cozinha tô sempre com uma revista nova de receitas e que conheço todos os programas de receitas da televisão? Ainda mais agora com a tv a cabo no quarto!".

Quando ganha ou compra alguma novidade para a cozinha, como um triturador novo de alimentos, já sabe com clareza como que o utensílio vai lhe ajudar a melhorar a consistência do recheio crocante daquela torta, ou que vai conseguir preparar com mais facilidade um tempero para a salada. Ao mesmo tempo, não é porque se tem agora um triturador, por exemplo, que ela irá preparar uma refeição toda em torno do novo equipamento. Afinal, a vó sabe identificar os processos que considera mais trabalhosos, que lhe tomam mais tempo e que, talvez, um utensílio doméstico poderia lhe ajudar a tirar de letra.

Portanto, saber identificar melhorias para as atividades diárias a partir da tecnologia, acho que é um dos pontos principais que a minha vó me ensinou. Poder ter os pés no chão e dizer "não!" ao modo como a tecnologia tem nos sido empurrada goela abaixo, criando novas necessidades a todo momento e entulhando nossos dias com novas demandas a uma velocidade em que não estamos conseguindo mais acompanhar. Algo mais ou menos assim: não é porque você comprou um carro com freios de última geração que você irá dirigir de maneira imprudente no trânsito, porém você sabe que a tecnologia do freio está ali disponível, caso você julgue necessário utilizá-la. Parece um exemplo bobo, mas o motorista que se torna imprudente porque agora tem a tecnologia nas mãos não é diferente do homem moderno que conseguiu tornar-se refém dos aparatos tecnológicos, acreditando que conseguiria mais liberdade e qualidade de vida.

Esses exemplos podem ser muito bem aplicados à realidade escolar. Compreender que não é porque agora se pode ter uma lousa interativa ou um tablet em sala de aula, que precisamos, realmente, preparar aulas inteiras pensadas para esses equipamentos. Seria a mesma coisa se a minha vó só fizesse comida triturada depois da compra do triturador. Portanto, encerro citando o jornalista e educomunicador Alexandre Le Voci Sayad, autor do livro Idade Mídia: "Tecnologia sozinha não faz boa educação, mas é indispensável a ela, num projeto mais amplo."

Instituições são atendidas por rede de dados de alta velocidade


 Agência Brasil

Das 562 unidades da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, 455 estão interligadas à Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), que proporciona infraestrutura de redes avançada e altas taxas de transmissão de dados. Esse total representa 80% das instituições.

Com pontos de presença em 27 unidades da Federação, a RNP conecta 1.219 instituições brasileiras, nas capitais e no interior. São aproximadamente 3,5 milhões de usuários, que usufruem de alta tecnologia para comunicação, computação, armazenamento e experimentação.

Até 2002, as instituições da rede federal realizavam de forma individual a contratação de serviços de recepção e transmissão de dados. Em geral, eram serviços caros, com velocidade muito abaixo das reais necessidades das instituições e com grande impacto orçamentário. A partir de uma ação interministerial, os ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) criaram o programa de Implantação e Manutenção da Rede Nacional para Ensino e Pesquisa.

A RNP fornece às instituições da rede federal uma série de serviços avançados em tecnologia da informação e comunicação para o desenvolvimento das atividades de ensino, pesquisa e extensão. Entre os principais serviços destacam-se o Fone@RNP, de chamadas de longa distância para telefones fixos no Brasil e no exterior, sem custo; Vídeo@RNP, de gravação e fornecimento de conteúdo didático; CAFe, que possibilita a servidores e alunos o acesso a bases de conhecimentos, como o Portal de Períodicos da Capes; e o Eduroam, que possibilita a servidores e alunos o acesso à internet sem fio, com login e senha institucionais.

Para o coordenador-geral de planejamento e gestão da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec), Nilton Nelio Cometti, a parceria entre o MEC e a RNP resultou num salto de qualidade nos serviços de acesso à internet para as instituições da rede federal. “Estamos trabalhando para colocar 100% das unidades interligadas à RNP, mas ainda temos alguns campi que funcionam em instalações provisórias”, observa Cometti.

A indicação das unidades da rede federal a serem atendidas pelos serviços da RNP é realizada pela Setec, a partir de demanda apresentada pelo Fórum de Gestores de Tecnologia da Informação e da Comunicação (Forti) e pelo Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif).

Escolas do campo têm até o dia 15 para escolher livros didáticos


 Agência Brasil

O processo de escolha dos livros didáticos para escolas do campo já está aberto na internet. Professores, diretores e coordenadores pedagógicos têm até o dia 15 de junho para selecionar as obras didáticas mais adequadas ao sistema pedagógico de cada rede de ensino. A escolha é feita no site do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Esta é a segunda vez que o órgão vai distribuir material didático específico para estudantes de escolas do campo, com abordagem que considera a realidade social, cultural, ambiental, política e econômica dessa parcela da população. Pelo Programa Nacional do Livro Didático do Campo (PNLD Campo 2016), serão beneficiados, de acordo com a autarquia, 2,6 milhões de estudantes de quase 60 mil escolas em todo o país.

O responsável por cada secretaria de educação fará o registro da escolha no portal. Para que a seleção seja mais democrática, a recomendação é que haja reuniões com todas as escolas públicas rurais e seus professores.

“A escolha do livro deve ser um consenso, e não uma decisão imposta”, diz a coordenadora-geral dos Programas do Livro do FNDE, Sonia Schwartz. Ela explica que, para garantir a transparência, tanto a lista com as obras escolhidas na reunião quanto a lista final da escolha feita no site devem ser publicizadas nas escolas.

“A sugestão é que as redes de ensino façam uma ata da reunião na escola para dar transparência ao processo, e deixem disponível em local visível, para confrontar o que foi registrado no sistema”, afirma.

Serão selecionadas coleções para alunos dos anos iniciais do ensino fundamental, do 1º ao 5º ano. As obras serão de letramento e alfabetização, alfabetização matemática, língua portuguesa, matemática, ciências, história, geografia e arte, e livros com temáticas regionais.

No site, está disponível o Guia PNLD Campo 2016, com resenhas e avaliações das coleções e livros regionais aprovados para esta edição do programa.

Há 140 anos a primeira balsa ligava Cuiabá com Várzea Grande


Autor: *Wilson Pires de Andrade

Robson Silva / Secom VG


Constituía um sonho para os moradores situados as margens do Rio Cuiabá, que dessem início o quanto antes ao funcionamento de uma balsa, ligando a Capital Cuiabá, Várzea Grande e todos os municípios localizados à direita do rio, o que sem nenhuma dúvida seria fator de maior desenvolvimento para todos.

Dia 04 de junho de 1874, em festa, com a presença de parte da população cuiabana, com bandeirolas, foguetes, girândolas e roqueiras (antigo canhão de ferro, cujos projéteis eram pedras) e sob o acordes do instrumental da Banda de música do Arsenal de Guerra, a primeira “balsa” deu início a travessia, o que permitiu maiores volumes de transportes de mercadorias daquele entreposto comercial para a capital de todos os matogrossenses. E a balsa fez história.

O primeiro balseiro foi o livramentense descendente de bandeirante Luiz Monteiro de Aguiar, que adquiriu um casco de ferro em 1870, e sobre ele mandou construir a primeira balsa. Mais tarde transferiu os direitos adquiridos por Lei ao Estado, que passou a arrendá-la a diversos.

Em 1888, a balsa encontrava-se em mãos de Virgílio Carneiro Leão, com o porto situado na atual Rua Maria Metelo, nas proximidades da casa do senhor Licínio Monteiro da Silva. Com ele, por 18 anos permaneceu a barca pêndula, a fim de que melhorasse seus acessórios: cabos e bóias.

Ao final do século XIX, Joaquim Polido SEABRA adquiriu o arrendamento da balsa, passando mais tarde para a direção do senhor Francisco Cláudio.

Por muito tempo esteve como arrendatário da balsa, Sebastião Teodorico, que ficou até o final do século. Depois dessa administração, a balsa passou para o domínio de Antonio de Arruda Pinto, conhecido como Totó Bichinho, que a colocou sob a

direção de Delfino Monteiro de Aguiar, filho do primeiro proprietário. Já em 1918, achava-se nas mãos do arrendatário Francisco de Arruda Pinto, por cinco anos.

Ponto de encontro

Em 1924, sob administração direta de Benedito Leite de Figueiredo, o Didito, último arrendatário, subvencionado pelo Estado, que a remodelou, mudando o sistema de bóias para o de cabo movido a carretilha.

A moderníssima barca-pêndula veio com bancos para passageiros e havia um lugar aberto destinado às carroças e animais. Era um verdadeiro ponto de encontro entre amigos e conhecidos sob os olhos atentos do senhor Didito. As conversas eram mantidas em clima de camaradagem, respeito e alegria. O fundo da balsa (barca) era feito de tubos enormes. Na hora de aportar, devido ao lugar raso, as zingas (movimento de hélice) empurravam a balsa até o local ideal para o desembarque de passageiros.

Às 06:00 saía à primeira balsa de Várzea Grande a Cuiabá, às 18:00 era a última viagem. Nos sábados quando havia festa em Várzea Grande, os canoeiros se alegravam com a arrecadação extra, após a última viagem da “barca-pêndula”, só havia jeito de recorrer aos eficientes canoeiros.

Imprevisto

Um caso bem raro sucedeu em certa ocasião, quando a barca aproximava-se do porto do lado de Várzea Grande, pendendo de um lado e virando. Mas como o local era raso, não houve conseqüência negativa, a não ser o susto e depois muito riso.

Didito Figueiredo foi o último arrendatário da balsa, pois, quando estava à frente desse negócio, inaugurava-se a ponte Júlio Muller, em 20 de janeiro de 1942.

*Wilson Pires de Andrade  é jornalista em Mato Grosso.

terça-feira, 2 de junho de 2015

Repetência no Brasil é uma das mais altas


O estudo também mostra que a taxa de matrícula na educação pré-primária ainda é baixa no País. Apenas 50% dos meninos e meninas entre 4 e 5 anos estavam matriculados nesse nível educacional, enquanto a média dos outros países da América Latina era de 65,3%.

Já o percentual de matriculas na educação primária (6 a 11 anos) era de 95%, perto da média da região (95,3%). No entanto, o aumento entre 2000 a 2008 foi de apenas 2,6%. Ontem, foram anunciados só parte dos dados. A pesquisa completa será divulgada em 2011.

Fonte: O Globo (RJ); Estado de Minas (MG)

Escolas já podem obter os resultados preliminares da ANA 2014

 Do Inep 


As escolas das redes públicas têm até o dia 12 de junho para acessar os resultados preliminares da Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA) 2014, no portal do Inep. Nessa etapa, o acesso é restrito aos diretores escolares, mediante cadastro prévio.
Durante este período, os gestores escolares podem consultar e discutir seu desempenho com as equipes pedagógicas e de gestão. Caso discordem, também podem interpor recurso no mesmo sistema, informando os motivos ao Inep.
Os resultados foram disponibilizados para os estabelecimentos de ensino que cumpriram o critério de participação de pelo menos 80% dos estudantes matriculados no 3.º ano do ensino fundamental.
Alfabetização na Idade Certa - A ANA compõe as ações do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic). O compromisso, assumido pelos governos federal, do Distrito Federal, dos estados e dos municípios que aderiram ao Pacto, é assegurar que todas as crianças estejam alfabetizadas em língua portuguesa e matemática até o final do ciclo de alfabetização, no 3.º ano do ensino fundamental. Em 2014, o teste foi aplicado dentre os dias 17 e 28 de novembro, para cerca de 2,3 milhões de estudantes, em 49 mil escolas.
Em caso de dúvidas, os gestores escolares podem contatar o Inep pelo e-mail [email protected] // .
Acesse o Sistema de Divulgação de Resultados.

Perto do fim do prazo, poucos estados e municípios entregaram planos de educação

Mariana Tokarnia - Repórter da Agência Brasil Edição: Aécio Amado

A pouco menos de um mês do fim do prazo para que estados e municípios tenham os próprios planos de educação, apenas 151 municípios dos quase 5,6 mil têm planos sancionados. Entre os estados, a meta foi cumprida por três: Maranhão, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. As informações são do site Planejando a Próxima Década do Ministério da Educação (MEC).
Os planos estaduais e municipais de educação estão previstos no Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado no ano passado pela presidenta Dilma Rousseff. Ele traça metas para serem cumpridas nos próximos dez anos. As metas vão desde a inclusão de crianças e adolescentes na escola até a pós-graduação. Trata ainda da valorização do professor e dos investimentos em educação, que até 2024 deverão ser de, no mínimo, 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Atualmente, o investimento na área é 6,6% do PIB.
Pela lei, os planos locais têm até o dia 24 de junho para serem sancionados. O prazo é o primeiro estipulado no PNE. Os planos municipais e estaduais devem, de acordo com a realidade local, estabelecer estratégias para o cumprimento de cada uma das metas do PNE. Eles têm liberdade, inclusive, para avançar nas metas caso elas estejam superadas.
A situação mais crítica é entre os municípios. "Não vamos cumprir em todos os municípios", disse a presidenta da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Cleuza Repulho. "Mas quero deixar claro que é muito importante que esses planos reflitam a realidade. Muito mais que prazo, é a importância que os planos têm na execução, que sejam feitos com a discussão ampla, com a participação de todo mundo, para refletir a realidade."
Segundo ela, mesmo após o fim do prazo, a Undime continuará trabalhando com os municípios para que todos tenham os planos aprovados.
Para constituir os planos, o MEC estipula fases. A primeira é a constituição de uma comissão coordenadora, depois, a produção de um diagnóstico da educação na localidade, a elaboração de um documento-base, consulta pública e elaboração de projeto de lei. O projeto é então enviado ao Legislativo, aprovado e sancionado.
Entre os municípios, um ainda não tem comissão coordenadora instituída;  só 531 instituíram a comissão e 1.049 concluíram apenas o diagnóstico. Os demais avançaram na elaboração do documento-base (1.560), fizeram consulta pública (1.185), têm o projeto de lei elaborado (505), enviaram o projeto ao Legislativo (534) e apenas 54 aprovaram a lei e 151 sancionaram a proposta.
Entre os estados, a expectativa é que até o fim do ano todos os planos estejam em vigor, segundo o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Eduardo Deschamps. "Temos um número significativo de estados que estão concluindo seus planos para remeter às assembleias legislativas. Eu acho que o número de estados que terão os planos aprovados até o dia 24 de junho vai ser reduzido, mas entre os que estarão com os planos nas assembleias legislativas, teremos um número significativo. Todos os estados estão trabalhando fortemente para isso", informou.
Todos os estados têm pelo menos o documento-base elaborado. Dois, o Rio Grande do Sul e o Paraná, além do Distrito Federal, avançaram até o envio dos projetos ao Legislativo. Rondônia tem o projeto aprovado, mas ainda não sancionado.
Como o prazo está em lei, de acordo com o MEC, ele não será adiado, a não ser que se altere a lei. Em entrevista, o ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, ressaltou que o MEC "não quer que os estados e as prefeituras se sintam coagidos com o prazo e acabem comprando um plano pronto de educação, que não vai emanar de uma discussão da sociedade. O mais importante é a sociedade se mobilizar e discutir o que quer para a educação”.

Religião e religiosidade


Autor: Gabriel Novis Neves


Nas diversas mesas de papo que costumamos frequentar, vez por outra, rolam discussões sobre religião. Logicamente, todos os interlocutores, em sua maioria de bom nível intelectual, discutem suas ideias sobre as mais variadas correntes religiosas e mais ainda as filosóficas daí advinda.

“Pessoas brilhantes falam sobre ideias. Pessoas medíocres sobre coisas.”

Entretanto, não posso garantir que pessoas brilhantes serão por toda a vida, como as medíocres também.

“Ainda há os que acreditam que pessoas normais, falam sobre coisas normais.”

Geralmente, os que se declaram agnósticos são os que mostram sinais mais fortes de religiosidade.

Mostram-se extremamente cautelosos nas suas verdades e a compaixão é a sua expressão de conduta.

Olhar vivo, porém sereno, voz baixa, postura firme sem arrogância, interesse anormal por tudo e por todos que estão à sua volta, são as características pessoais neles encontradas.

Isso exemplifica a nossa grande figura do século XXI, o querido Oscar Niemeyer, o ateu mais religioso de que temos notícia.

Viveu mais de um século calcado em beleza, em solidariedade e em compaixão, fazendo da sua arte a maneira de conseguir esses valores.

Rotulá-lo como pertencente a este ou aquele sistema filosófico é minimizar o que ele tinha de mais bonito, o seu lado humano, infelizmente pouco encontrado nos nossos dias.

Os preceitos religiosos, que deveriam funcionar para a humanidade como um plus, nem sempre conseguem os seus objetivos e nos deparamos com um mundo onde imperam a falsidade e a mentira.

Pessoas exibindo um belo discurso, mas tendo uma prática de vida absolutamente contrária ao que pregam.

Que as festas natalinas nos façam refletir no sentido de que deixemos para os nossos descendentes e para a humanidade em geral um mundo com mais solidariedade e mais compaixão, os grandes pilares da religiosidade verdadeira.

Madre Teresa de Calcutá - Centenário do seu nascimento


Dom José Mário Stroeher*

Dia 26 de agosto de 1910 nasceu, na Albânia Agnes Gonxha Bojaxhhiu, a Madre Teresa. Hoje é o centenário do seu nascimento. Ela foi uma mulher à frente do seu tempo. Fez da própria vida uma oferta aos outros, e um instrumento de realização da vontade de Deus.


Aos 12 anos de idade, ouviu de um padre jesuíta o seguinte ensinamento: ‘Cada qual em sua vida deve seguir seu próprio caminho’. Entrou na Congregação das Irmãs de Loreto, indo lecionar geografia em Bengala. Estudando depois enfermagem e, diante da miséria da cidade de Calcutá na Índia, se tornou o remédio que ajudou a tratar as
mazelas daquela cidade, onde a miséria e a desigualdade eram gritantes.


A pedido do Papa Pio 12, fundou a Congregação das Irmãs Missionárias da Caridade em 1949, cujo carisma incluía a educação básica de crianças e adultos, o aprendizado de hábitos de higiene básica entre eles e a coleta de donativos.


Nas cartas publicadas após a sua morte, revela a sua luta interior: o fato de não sentir palpavelmente o amor de Deus. Ao contrário de outros que abandonaram a caminhada diante das dificuldades, Madre Teresa perseverou. As pessoas que conviveram com ela sempre a viram com o rosário nas mãos, levando uma vida espiritual serena e tranquila. A última frase dita por ela teria sido ‘Jesus, eu te amo’.
Em 1979, recebeu o prêmio Nobel da Paz. Ela morreu em cinco de setembro de 1997, sendo proclamada bem-aventurada pelo Papa João Paulo 2º em 2003.
Grandes comemorações ocorrem especialmente na Índia, cujo governo decidiu cunhar uma moeda em homenagem ao centenário de Madre Teresa, iniciativa que contou com o apoio da superiora geral das Missionárias da Caridade, Irmã Mary Prema.
A Diocese do Rio Grande se associa a estas homenagens no mesmo ano em que celebra também o centenário de nascimento de seu primeiro bispo Dom Frederico Didonet.
Dia 12 de setembro deste ano, data da ordenação episcopal de Dom Frederico, faremos a abertura do início dos festejos deste centenário, tendo também em vista que em 2011 a Diocese completa 40 anos. Será para nós um Ano de Graça.


*2º bispo da Diocese do Rio Grande




Darcy Ribeiro e 'O Povo Brasileiro': obra ainda é chave para entender a formação étnica e cultural do Brasil

Andréia Martins

da Novelo 
O Brasil é um dos países mais miscigenados do mundo. Essa diversidade é resultado da contribuição de vários povos na formação da nossa identidade, como os índios, os primeiros colonizadores (os portugueses) e imigrantes (franceses, holandeses, italianos, japoneses, alemães entre outros), e os negros vindos da África.
O antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997) é autor de uma das obras importantes para se compreender a formação étnica e cultural do povo brasileiro, o ensaio histórico-antropológico O Povo Brasileiro – A formação e o sentido do Brasil, editado em 1995 e que completa 20 anos em 2015.
Direto ao ponto: Ficha-resumo
Na obra, Ribeiro quis responder à pergunta “por que o Brasil não deu certo?” e debruçou-se sobre a formação do povo brasileiro. No estudo, ele defendeu a miscigenação como fator preponderante da diversidade que caracteriza o Brasil. Essa fusão biológica e cultural teria se iniciado logo que os primeiros portugueses desembarcaram na América, e a gestação étnica do brasileiro se prolongou por todo o período colonial (1530 – 1815).
O que define um povo não é a demarcação territorial, mas sim um conjunto de características que faz dele um grupo identidário, diferenciando-o de outros grupos. As três matrizes étnicas que seriam as formadoras da identidade do povo brasileiro são o colonizador branco, no caso os portugueses, os índios e os negros africanos. Darcy usa a expressão “Nova Roma” para classificar o que seria o Brasil neste processo de formação do povo brasileiro através da desconstrução dessas três matrizes.
A mestiçagem no Brasil teria ocorrido de diferentes formas. Uma delas seria o cunhadismo. Essa antiga prática indígena, para incorporar estranhos à sua comunidade, consistia em lhes dar uma moça índia como mulher. Assim, estabeleciam-se laços que o aparentavam a todos os membros do grupo. Isso se alcançava graças ao sistema de parentesco classificatório dos índios, que relaciona, uns com os outros, todos os membros de um povo.
Ribeiro valorizava muito a cultura indígena e o papel do mameluco (mestiço de índio) na nossa formação étnica. A miscigenação através do cunhadismo teve em São Paulo o seu primeiro centro de desenvolvimento. Nessa região, onde a captura de índios para servirem de escravos tornou-se a principal atividade econômica, surgiram os brasilíndios ou mamelucos, um povo que não era índio e nem português, mas falava tupi e nheengatu e foram fundamentais, para Ribeiro, na formação étnica do brasileiro e na ocupação e expansão territorial do país. Dos brasilíndios paulistas é que saíram os bandeirantes.
No entanto, a formação do povo brasileiro foi fruto de um processo violento. Com relação aos africanos, arrancados de suas culturas e forçados a trabalhar como escravos, ele acreditava que a rica diversidade linguística e cultural dos povos africanos e a política de evitar concentrar escravos de uma mesma etnia nas mesmas propriedades dificultaram a formação de núcleos de preservação do patrimônio cultural africano.
Assim, o africano que chegou ao Brasil teve sua identidade negada e marginalizada, ele se tornou um ser sem identidade. Para o antropólogo, a contribuição da cultura negra para a identidade brasileira estaria principalmente no plano ideológico, na força física, nas crenças religiosas, na música e na gastronomia.
“Temos aqui duas instâncias. A do ser formado dentro de uma etnia, sempre irredutível por sua própria natureza, que amarga o destino do exilado, do desterrado, forçado a sobreviver no que sabia ser uma comunidade de estranhos, estrangeiro ele a ela, sozinho ele mesmo. A outra, do ser igualmente desgarrado, como cria da terra, que não cabia, porém, nas entidades étnicas aqui constituídas, repelido por elas como um estranho, vivendo à procura de sua identidade”, escreve o antropólogo.
Com toda essa mistura de culturas e referências, o brasilíndio, o mameluco e o afro-brasileiro perceberam-se em uma terra de ninguém – o termo usado pelo autor é “ninguendade”--, gerando a necessidade de criarem uma identidade, a brasileira.
Para Ribeiro, o “surgimento de uma etnia brasileira, inclusiva, que possa envolver e acolher a gente variada que aqui se juntou, passa tanto pela anulação das identificações étnicas de índios, africanos e europeus, como pela indiferenciação entre as várias formas de mestiçagem, como os mulatos (negros com brancos), caboclos (brancos com índios) ou curibocas (negros com índios)”.
Na obra, Ribeiro ainda apresenta outro traço particular da constituição do Brasil: a presença de cinco grandes culturas que, embora distintas, seriam complementares. São elas: o Brasil crioulo (que se estendia do litoral de São Luís ao Rio de Janeiro e era muito influenciado pela África), o Brasil caboclo (região Norte com a Amazônia e os índios), o Brasil sertanejo (Nordeste, seu sertão, caatinga), o Brasil caipira (centro-oeste, sudeste, influência da cidade de São Paulo na formação do país) e o Brasil sulino (mamelucos vivendo em uma área muito rica e fértil, os pampas gaúchos, e com forte interferência europeia).
A mestiçagem, classes e a democracia racial
Ao contrário de Gilberto Freyre (1900-1987), que acreditava “que a miscigenação que largamente se praticou aqui corrigiu a distância social que de outro modo se teria conservado enorme entre a casa-grande e a senzala”, Ribeiro não enxergava a mestiçagem ou essa mistura de diferentes Brasis em um como sinônimo de “democracia racial”. Para Ribeiro, para existir a democracia racial era preciso, antes, vivermos numa democracia social.
Ribeiro destaca a estratificação de classes que marcou a história do Brasil, com uma grande desigualdade entre as classes ricas e as pobres, a concentração de riqueza na mão de poucos e a desumanização das relações de trabalho.
Considerada uma obra importante para entender a formação do povo brasileiro, o livro recebeu críticas na academia. Para uns, Darcy havia romantizado demais a questão e, além disso, havia usado referências sobre escravidão e mestiçagem anteriores à década de 1980, deixando muitos textos e referências mais atuais para a época de lado.
A obra, para Ribeiro, tinha o objetivo de entender o porquê o Brasil não deu certo, tendo a oportunidade de ser um país criado de acordo com a vontade de seu povo miscigenado.  Afinal, uma identidade não definida permite que um país se invente. Mas que país nós fomos capazes de inventar?
Certa vez, discutindo sobre o povo da América Hispânica, o líder político venezuelano Simon Bolívar (1783-1830) foi questionado sobre quem era, afinal, esse povo, ao que respondeu: "é o que se tem, o que mora nesta terra, portanto, a base demográfica de um território (...) é com este que temos que contar, é com este que temos que trabalhar".
Para alguns estudiosos e historiadores que analisam o livro de Ribeiro, uma das questões importante para entender porque o Brasil não deu certo é o fato de o brasileiro não se orgulhar totalmente de ser brasileiro. Sendo assim, a assimilação da nossa identidade ocorreu de modo a continuar dividindo a sociedade em superiores e inferiores de acordo com a raça, a manter a visão exploradora do trabalho, que Ribeiro coloca como trazida pelos colonizadores e que se chocou com o modo de vida dos índios, entre outros. Talvez a questão não seja mais qual país podemos inventar, mas sim, como reinventá-lo.

DIRETO AO PONTO

O Brasil é um dos países mais miscigenados do mundo. Essa diversidade é resultado da contribuição de vários povos na formação da nossa identidade, como os índios, os primeiros colonizadores (os portugueses) e imigrantes (franceses, holandeses, italianos, japoneses, alemães entre outros), e os negros vindos da África.
O antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997) é autor de uma das obras importantes para se compreender a formação étnica e cultural do povo brasileiro, o ensaio histórico-antropológico O Povo Brasileiro – A formação e o sentido do Brasil, editado em 1995 e que completa 20 anos em 2015.
Na obra, Ribeiro quis responder à pergunta “por que o Brasil não deu certo?” e debruçou-se sobre a formação do povo brasileiro. No estudo, ele defendeu a miscigenação como fator preponderante da diversidade que caracteriza o Brasil. Essa fusão biológica e cultural teria se iniciado logo que os primeiros portugueses desembarcaram na América, e a gestação étnica do brasileiro se prolongou por todo o período colonial (1530 – 1815).
Andréia Martins 

Big Data: Como a inteligência de dados vai mudar o nosso dia a dia

Carolina Cunha

Da Novelo Comunicação

Pense na sua rotina diária. Da hora em que você acorda até a hora de dormir, mesmo sem perceber, você realiza diversas interações que geram informações sobre quem é você, o que você pensa e sobre os seus hábitos.
Nunca se gerou tanta informação no mundo como hoje. Num universo sempre conectado, produzimos um volume gigantesco e crescente de dados ao realizar todo tipo de atividade. Mas essas informações só tem valor se lhes foram atribuídas sentido. É aí que entra o Big Data.
Direto ao ponto: Ficha-resumo
Big Data é um termo utilizado para descrever o conjunto de soluções tecnológicas ou uma ciência feita a partir das megabases de dados disponíveis na internet, que analisam e dão sentido a essas informações.
Entre especialistas, há consenso de que esses dados apresentam três características principais, iniciadas pelos três ’Vs’: volume, velocidade e variedade -- há quem já trabalhe com a ideia de mais outros três ‘Vs’, acrescentando veracidade, variabilidade valor.
A novidade com relação ao que podia ser feito antes por qualquer banco de dados é que agora as soluções tecnológicas podem lidar também com os chamados dados não-estruturados, que antes só podiam ser compreendidos quando analisados por pessoas.
Considerados um dos grandes desenvolvimentos tecnológicos em computação do século passado, os Sistemas de Gerenciamento de Banco de Dados (SGBDs), nos quais permitem que tratemos de forma eficiente milhões de contas bancárias e outros sistemas, não tem uma linguagem compatível com os dados não-estruturados.
São exemplos desses dados Tweets, posts no Facebook, vídeos, fotos, informações de geolocalização entre outros que só fazem sentido quando contextualizados. Hoje, esse tipo de dado representa a maior parte das informações geradas na internet.
E como geramos tanta informação? Ao usar aplicativos de celular ou tablet, GPS, câmeras ou interagir em canais digitais como sites, redes sociais e outros dispositivos dos mais diversos tipos, além de sensores, equipamentos médicos e outras plataformas que reúnem grandes quantidades de informação.
Os dados são armazenados em plataformas e Data Centers, que contam com sistemas e ferramentas para compilar resultados em questão de minutos, horas ou dias, combinando matemática, estatística e ciência da computação.
Com o cruzamento de informações, empresas e instituições buscam capturar, armazenar e analisar uma série de dados para apoiar decisões estratégicas, inovar e entender melhor o comportamento do consumidor ou de um determinado público ou ainda para identificar tendências de eventos de vida e oferecer um produto com antecedência, como um casal que vai se casar e recebe uma oferta para comprar um apartamento.
O Big Data também pode ser usado em informações de interesse social como no jornalismo e na análise de políticas públicas pelo Governo. Com a análise de informações, o setor público pode avaliar a qualidade de seus serviços e gerar modelos de previsão. Estatísticas de boletins de ocorrência policiais, por exemplo, podem fornecer dados sobre tendências da violência urbana e ajudar na prevenção do crime.
O mercado de Big Data se insere na economia da informação. Segundo a consultoria Gartner, em 2012, o mercado global de Big Data já movimentava 70 bilhões por ano. No Brasil, a previsão é de que a área movimente cerca de US$ 965 milhões em 2018.
No Brasil, o uso mais comum da Big Data é na venda de produtos, no relacionamento com o consumidor e no monitoramento de redes sociais por marcas que buscam avaliar o que está sendo falado na web e apontar tendências. A indústria de petróleo, em especial, também é grande criadora de dados, que vão da pesquisa sísmica inicial e monitoração eletrônica de poços até a venda de combustível na bomba dos postos de abastecimento.
Um dos impulsionadores do Big Data é a ascensão da Internet das Coisas, nome dado à rede de dispositivos conectados que se comunicam entre si. Com dispositivos integrados, diversos dados poderão ser gerados sobre meio-ambiente, cidades, energia, saúde, entre outros.

Privacidade: a grande questão do Big Data

Se o armazenamento e análise de todo e qualquer dado na internet pode ajudar a traçar comportamentos e tendências, ele também levanta outras questões: o que empresas e governos fazem com tantos dados privados? Que informação pode ser deduzida a partir de dados?
Embora seja um direito não garantindo por lei em muitos países (no Brasil o direito é inviolável e garantido pela Constituição Federal), o direito à privacidade é considerado parte essencial da liberdade, mas passou a enfrentar novos desafios com o advento da internet. Na era da informação, muita gente acreditou que estaria seguro e isolado em seu computador, e que tudo o que acontecesse entre o indivíduo e a tela seria privado, o que não se mostrou verdadeiro.
No caso do Big Data, estamos falando de quantas informações sobre você podem ser armazenadas sem a garantia de que serão utilizadas de maneira ética ou compartilhadas sem que o indivíduo concorde.
A Internet criou um contexto em que as questões de privacidade precisam ser repensadas. Se por um lado acessar informações públicas ficou mais fácil, a coleta de informações particulares, sem autorização dos indivíduos, também se tornou mais frequente. E para conter este segundo avanço, marcos, leis e normas precisam ser criadas para atender ao que acontece no ciberespaço.
Os Estados Unidos e países europeus possuem regras para a manutenção desses dados. No entanto, isso não impediu a Agência de Segurança Nacional, a NSA, de coletar e armazenar inúmeros dados de cidadãos norte-americanos e chefes de Estado de outros países. O caso foi revelado ao mundo pelo ex-agente Edward Snowden.
No Brasil, o acesso a dados particulares é um dos pontos que o Marco Civil da internet regulamenta. Ficou estabelecido que a privacidade é um direito e uma condição para "o pleno exercício do direito de acesso à internet". O usuário tem direito à inviolabilidade da intimidade e da vida privada, "sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, salvo por ordem judicial". Além disso, está previsto que as operadoras não podem fornecer "a terceiros seus dados pessoais, inclusive registros de conexão, e de acesso a aplicações de internet, salvo mediante consentimento livre, expresso e informado ou nas hipóteses previstas em lei".
No entanto, o texto do Marco afirma que provedores de internet e sites ou aplicativos devem guardar registros de acesso de usuários -- e não o conteúdo acessado -- por um ano e por seis meses, respectivamente, o que ainda gera polêmica, já que para críticos, tais dados não deveriam ser mantidos.
O grande desafio do Big Data é armazenar com segurança esse “oceano de dados” e proporcionar um rápido acesso aos dados quando necessário, ou seja, a tarefa é equilibrar a balança entre capacidade de armazenamento e a velocidade de geração de dados. Será possível?

DIRETO AO PONTO

Nunca se gerou tanta informação no mundo como hoje. Num mundo sempre conectado, geramos um volume gigantesco e crescente de informações ao realizar todo tipo de atividade. Mas essas informações só tem valor se lhes foram atribuídas sentido. É aí que entra o Big Data.

Big Data é um termo utilizado para descrever o conjunto de soluções tecnológicas ou uma ciência feita a partir das megabases de dados disponíveis na internet, que analisam e dão sentido a essas informações.

Esse cruzamento de informações é usado por empresas, instituições e órgãos públicos que buscam capturar, armazenar e analisar uma série de dados para apoiar decisões estratégicas, entender melhor o comportamento do consumidor ou de um determinado público, identificar tendências de eventos de vida, avaliar a qualidade de serviços, entre outros.

Uma questão delicada sobre o tema diz respeito à privacidade. O que empresas e governos fazem com tantos dados privados? Que informação pode ser deduzida a partir de dados?

A Internet criou um contexto em que as questões de privacidade precisam ser repensadas. Se por um lado acessar informações públicas ficou mais fácil, a coleta de informações particulares, sem autorização dos indivíduos, também se tornou mais frequente. E para conter este segundo avanço, marcos, leis e normas precisam ser criadas para atender ao que acontece no ciberespaço. 
Carolina Cunha 

Como identificar, compreender e lidar com sentimentos despertados na criança

A neurociência começa a comprovar o efeito dos estados emocionais para o processo de aprendizagem; saiba como lidar com esses sentimentos na escola

Indisciplina, raiva manifesta em agressividade, desatenção. O emaranhado de comportamentos advindos da subjetividade dos alunos tem efeito bumerangue: provocam outras emoções no professor e podem desencadear frustração, perda de ânimo, impotência. Como um dos lugares privilegiados para as interações presenciais na contemporaneidade, a escola é o ambiente perfeito para o engatilhamento de processos emocionais. O que não se sabia, até agora, é o quanto essas emoções influenciam no aprendizado, seja de forma negativa, ou positiva.
A neurociência tem trazido informações importantes para entendermos a relação entre comportamento e função cerebral. Sabe-se hoje que perturbações que envolvem a sensorialidade, a percepção, o aprendizado, e a capacidade de lidar com problemas estão muitas vezes associadas às deficiências do relacionamento interpessoal, insegurança e baixa autoestima.
O roteiro abaixo mostra como identificar, compreender e lidar com sentimentos despertados na criança, como raiva, carência, desinteresse, ansiedade e tristeza. Aqui colocamos algumas emoções e/ou sentimentos de forma separada. Mas é importante ter em mente que todas se relacionam de forma dinâmica. "Essa é uma pequena mostra de como é possível compreender e manejar a delicada linguagem dos sentimentos e emoções nas relações que se estabelecem na escola", aponta a neuropsicóloga Adriana Fóz, que ofereceu as informações para este roteiro.
Os desenhos publicados fazem parte do trabalho que a professora Tatiana Luiza da Silva Lima desenvolveu com seus alunos de segundo ano do ensino fundamental na Escola Villare (SP), em 2014, quando ela pediu que as crianças criassem suas definições para alguns sentimentos.

+ Saiba mais na matéria "No limite"

 Sentimento/emoção: RAIVA
Como identificar:
A agressividade (com o professor e/ou os colegas) é uma expressão bastante evidente da raiva, mas não é a única. Um aluno que demonstra um comportamento muito omisso e indiferente pode estar interiorizando o sentimento de raiva - e será apenas uma questão de tempo até expressá-la agressivamente. Vale lembrar ainda que a raiva está, muitas vezes, associada à frustração.

Atuação reativa:
Com baixo grau de consciência e de distanciamento: agir de forma igualmente agressiva com o aluno, expulsá-lo da sala de forma agressiva, punir o aluno através de castigos.

Resultado provável:
Aumento da insatisfação do aluno, diminuição do vínculo entre aluno e professor, incremento da raiva e da agressividade.



Sugestão de manejo:
Ao perceber a expressão da raiva, é fundamental que o professor não entre na mesma vibração do aluno. Este distanciamento será muito importante para que o educador escolha qual o melhor direcionamento para a situação. "Quando a raiva explode todos nós necessitamos de um pouco de ar. Inclusive os alunos", pontua Adriana Foz. Algumas sugestões de manejo neste sentido vão desde pedir cuidadosamente para que o aluno se retire para respirar e acalmar-se, até oferecer a oportunidade para que fique quieto em seu lugar ainda em sala de aula. O importante é que exista um tempo para que as emoções se reequilibrem. Apenas após este período o professor pode buscar um novo contato com o aluno para tentar compreender melhor o que houve, abrindo o canal de conversa e diá­logo. Este canal também pode ser aberto com cuidado, de forma preventiva, quando se percebe que o aluno pode estar com a raiva mais interiorizada. Este diálogo pode trazer à tona a identificação da emoção e a busca por estratégias para que o equilíbrio das relações seja preservado.

Resultado provável:
Aumento do nível de confiança entre professor e aluno, fortalecimento do vínculo e maior possibilidade de colaboração em sala de aula.

 Sentimento/emoção: CARÊNCIA AFETIVA
Como identificar:
Em geral, a carência afetiva  é demonstrada de duas formas: tentando chamar a atenção do professor (inclusive dificultando a aula) ou agindo de forma distanciada, envolvendo-se cada vez menos nas atividades e nos relacionamentos pessoais.

Atuação reativa:
Agir de maneira agressiva com os que tentam chamar a atenção, ou ignorar a situação, dissociando o estado emocional do aluno da aprendizagem. Há ainda o risco de o professor envolver-se emocionalmente de forma nebulosa, tentando aplacar as carências e confundindo o seu papel com o de pai ou mãe.

Resultado provável:
Continuidade dos comportamentos gerados pela carência, tendência de o aluno ter cada vez mais dificuldades no processo de aprendizagem. Para o caso de uma aproximação com nebulosidade de papéis, corre-se o risco de que sejam criados vínculos afetivos pouco saudáveis, com cobranças emocionais e outras dificuldades que tendem a atrapalhar os processos em sala de aula.



Sugestão de manejo:
Observar o aluno e entender onde estão os seus pontos fortes para ressaltá-los sempre que tiver a oportunidade. Este caminho é indicado basicamente porque, em geral, carência afetiva e baixa autoestima estão fortemente associadas. Todas as ações de fortalecimento da autoestima da criança ou jovem devem ser priorizadas, de modo a fazê-lo perceber o valor de suas ideias, resultados, comportamentos, etc.

Resultado provável:
Fortalecimento da autoestima, com o incremento do sentimento de segurança e a diminuição da carência. Maior autonomia afetiva. Fortalecimento do vínculo com o professor e os colegas. Aumento do interesse nas atividades.

 Sentimento/emoção: DESINTERESSE
Como identificar:
O aluno não demonstra motivação para as atividades em sala de aula, deixa de realizar tarefas, presta pouca atenção às explicações e tem baixa participação em sala de aula. Vale lembrar que este desinteresse pode estar associado a outras emoções e sentimentos, como a raiva, a carência e a tristeza.

Atuação reativa:
Demonstrar irritação em relação ao desinteresse do aluno, acusá-lo por seu comportamento. Ignorar as demonstrações de desinteresse.

Resultado provável:
Maior afastamento do aluno, diminuição do vínculo entre aluno e professor, incremento do desinteresse pelos conteúdos e atividades.



Sugestão de manejo

A principal questão diante do desinteresse - que tende a gerar no professor sentimentos como frustração e raiva - é realizar o manejo das próprias emoções. Neste momento é necessário que o educador se posicione de maneira a observar suas práticas, compreendendo que uma possível mudança de percursos é algo natural. Uma ferramenta interessante de manejo para situações em que o desinteresse se instale são as rodas de conversas - em alguns contextos escolares chamadas de assembleias. O educador pode buscar informações sobre como realizar esse processo, que se baseia na possibilidade de criar momentos em que os alunos possam ser escutados sem medo de repreensão e nos quais expressem possíveis descontentamentos com a forma como as aulas são conduzidas - e, até, outros sentimentos e emoções capazes de gerar o desinteresse, como a tristeza ou a raiva internalizada (isto porque nem sempre é o método de aula, mas as questões internas dos alunos as causadoras do desinteresse). A partir destas informações o professor poderá ter um quadro mais claro e criar estratégias para aumentar a motivação da turma como um todo e também de alunos que tenham uma atitude mais desinteressada. Ressalte-se que as rodas de conversa não são rodas terapêuticas.

 Sentimento/emoção: ANSIEDADE EXCESSIVA
Como identificar:
A ansiedade em excesso pode ser percebida principalmente a partir de reações físicas: o aluno tende a mexer-se bastante na cadeira, balançar as pernas insistentemente, morder os lábios, roer as unhas. "Na ansiedade a sensação é de que não cabemos em nosso corpo, por isso externalizamos esses sinais", aponta Adriana Fóz. Outro sinal apontado pela especialista é a fala exagerada e a dificuldade de percepção do outro em momentos de fala coletiva - quando se percebe que o aluno interrompe constantemente os colegas em uma conversa, por exemplo.

Atuação reativa:
Criticar abertamente o aluno por seu comportamento exigindo que pare com seus gestos, agir de maneira agressiva ou constranger o aluno na frente dos colegas.

Provável resultado:
Aumento da ansiedade do aluno, diminuição da atenção e do foco, maiores dificuldades da aprendizagem, geração de outras emoções/sentimentos em seu aspecto negativo, como raiva e frustração.



Sugestão de manejo:
Diante de um aluno com ansiedade excessiva o educador deve buscar caminhos capazes de gerar calma e centramento. E aí vale desde pedir para que este aluno respire calmamente até sugerir que saia de sala para tomar uma água, lave o rosto, tranquilize-se. Quando se percebe que a ansiedade está muito presente em uma turma, a sugestão é privilegiar atividades coletivas que exijam a atenção focada, também chamada de atenção plena. Em uma turma de crianças é possível criar brincadeiras em que os alunos precisem imitar o professor em um jogo de ritmo marcado com os pés e as mãos, por exemplo. Outras técnicas de atenção focada voltadas a crianças e jovens podem ser pesquisadas - muitas delas se baseiam em exercícios físicos e de respiração.

 Sentimento/emoção: TRISTEZA
Como identificar:
A tristeza não é um sentimento fácil de ser identificado e pode ser o gerador de reações que vão desde a desmotivação, a apatia e o desinteresse até a própria agressividade. A melhor forma de identificar a tristeza é, ao perceber um comportamento de distanciamento ou agitação, tentar buscar o diálogo com o aluno para que este verbalize o que está sentindo.

Atuação reativa:
Ignorar os sinais de tristeza do aluno, exigir verbalmente que o aluno aja de forma menos apática e motivada.

Provável resultado:
Aumento do sentimento de tristeza do aluno, com a repetição dos comportamentos a ele associados, diminuição do vínculo entre aluno e professor.



Sugestão de manejo:
A tristeza é um sentimento que pode prejudicar consideravelmente a aprendizagem. Por isso, quando consegue identificá-la, o professor precisa tentar conhecer ao máximo o que a está causando no aluno e ajudá-lo, dentro de sua atuação como educador, a elaborá-la e expressá-la. Além da verbalização, outros canais podem ser a expressão artística (aproveitar a tristeza causada por uma rejeição amorosa de um aluno  para trazer conteúdos ligados a este sentimento em aulas como português ou história) ou dar vias de expressão artística . Mesmo em matérias como matemática ou ciências é possível buscar janelas onde a tristeza possa ser colocada em contexto - por exemplo, trazendo à turma a biografia de gênios dessas áreas.

Provável resultado:
Ao perceber no professor uma figura capaz de auxiliá-lo em seu momento de tristeza, a tendência é o amadurecimento de sentimentos positivos em relação ao educador, como confiança e  respeito. Ao identificar e expressar sua tristeza, o aluno ainda estará trabalhando o seu próprio amadurecimento emocional, o que tende a facilitar todas as suas ações futuras, dentro e fora da escola.
Veja projetos criados por professores para lidar com as emoções de seus alunos em sala de aula:
Conhecendo as emoções de um jeito
Tatiana Luiza da Silva Lima, atualmente professora do primeiro ano na Escola Villare, em São Caetano do Sul, dava aula para o segundo ano em 2014 quando decidiu tornar mais visível a relação de seus pequenos alunos com suas próprias emoções. A educadora começou a reparar nas assembleias (rodas de conversa onde todos podem se expressar e que conta com a mediação do professor) que muitas vezes as crianças sentiam dificuldades para nomear o que sentiam. "Com esta questão em mente, me lembrei do projeto 'A casa das estrelas - o universo contado pelas crianças' em que o professor colombiano Javier Naranjo apresenta as definições que seus alunos do curso primário (entre 3 e 10 anos) davam para palavras, objetos, pessoas e, principalmente sentimentos, em suas aulas de espanhol - e que ele reuniu ao longo de dez anos", conta.
A partir desta inspiração, Tatiana pediu para que as crianças criassem suas definições para sentimentos e emoções como raiva, ciúmes e frustração, de uma forma bastante livre. "O resultado é altamente revelador de como estão sendo construídas as percepções destas crianças sobre quem elas são e qual o papel das emoções em suas vidas. Esta conscientização é muito importante e, eu acredito, pode até prevenir dificuldades escolares futuras", aponta Tatiana. Dentre as definições criadas pelos pequenos estão: "Ciúmes: é como ter duas melhores amigas e as duas ficam (juntas) sem você" ou "frustração para mim é ficar bravo e irritado quando alguma coisa não dá certo". "Com o tempo, identificar as emoções e sentimentos pode tornar-se uma prática cada vez mais comum para essas crianças, promovendo maior autonomia e a possibilidade para que ela encontre, junto com o seu grupo, as melhores estratégias para favorecer as relações saudáveis e um estado emocional que não dificulte a aprendizagem", finaliza Tatiana.

Acolhimento, escuta e conhecimento
Mônica Santos de Oliveira Moreira, professora do segundo e do terceiro ano na Escola Municipal Paulo Autran, em Guarulhos (SP), acredita que o primeiro passo para manejar as emoções em sala de aula é a escuta. "É imprescindível que estejamos atentos para perceber e também para acolher as demandas emocionais que possam surgir por parte dos alunos", aponta a educadora.
Um exemplo dado pela professora traz uma pequena aluna que começou a todos os dias, no início das aulas, contar para a professora sobre o processo de um tio que estava preso. "Eu sentia que para ela era importante eu falar, então eu escutava com toda a atenção. Com o tempo eu pude perceber que a maior preocupação desta aluna era com a mãe, que estava sofrendo com a situação.
"Eu sei que não vou tratar esta criança - mesmo eu tendo formação e experiência como psicóloga. Mas esta escuta e acolhimento muitas vezes são suficientes para que o aluno se tranquilize e consiga estar presente para as atividades em sala de aula", completa Mônica.
A professora aponta a formação oferecida pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa como um divisor de águas em sua própria capacitação para lidar com as emoções dos alunos. "Eu abri minha cabeça e passei a aceitar, por exemplo, que quando você abre rodas de conversas ou cria situações para os alunos se expressarem, essas situações podem ser mesmo barulhentas e até caóticas. É normal que seja assim, desde que seja também produtivo", aponta a educadora.
Mônica aponta a frustração como o sentimento negativo mais presente em seu trabalho. "Acho que nós também precisamos amadurecer emocionalmente para aceitar que, muitas vezes, mesmo que estejamos dando o nosso melhor, ele não será suficiente", enfatiza. "Também é muito frustrante você encaminhar um aluno que necessita de ajuda externa à escola e perceber que, por uma questão de dificuldade de acesso ou de descaso da família, a criança não recebe o tratamento que seria adequado", conta. "A paciência é um dos atributos mais importantes a serem desenvolvidos, eu acho. Em alguns processos, eu sei que estou plantando uma semente que irá se desenvolver apenas nos anos seguintes. Mas sinto que plantar essa semente é minha responsabilidade, de qualquer forma", finaliza Mônica.

Programa de alfabetização boliviano ensinou mais de um milhão de adultos a ler e escrever

O programa Yo Sí Puedo, importado de Cuba, conseguiu reduzir a taxa nacional de analfabetismo de 13,28% em 2011 para 3,8% em julho de 2014


Fellipe Abreu e Luiz Felipe Silva, da Bolívia 

O programa boliviano Yo Sí Puedo conseguiu reduzir a taxa de analfabetismo no país de 13,28% em 2001, para 3,8% em julho de 2014
"Ler e escrever era proibido. Eu morava no sítio em que meus pais trabalhavam e o patrão dizia que se eu fosse à escola cortaria minha língua." A história é lembrada pelo ex-policial Quintim Pulma, 83, vestido elegantemente em um paletó um tanto quanto surrado e um chapéu preto, o que concede ao simpático senhor um ar ainda mais altivo. "Hoje, sim, eu posso estudar para provar para eles que eu sou capaz", afirma após se levantar e se apresentar em nome de seus 38 colegas de estudo, todos idosos, do grupo rural de alfabetização da cidade de El Alto, vizinha à capital boliviana La Paz.

O grupo de quase 40 estudantes da terceira idade é uma síntese dos mais de um milhão de adultos alfabetizados desde a implantação do programa Yo Sí Puedo (Sim eu posso, em tradução livre) na Bolívia, em 2006. A maioria é formada por mulheres, de origem rural, pobres, e acima de 50 anos. Foi focando neste perfil que o programa conseguiu reduzir a taxa nacional de analfabetismo de 13,28% em 2001 para 3,8% em julho de 2014. Este índice, certificado pela metodologia de fiscalização da Unesco, é suficiente para que o Estado Plurinacional da Bolívia seja reconhecido como um país livre de analfabetismo - o limite, para a Organização das Nações Unidas, é de 4% -, o que aconteceu em julho de 2014, quando a Unesco declarou oficialmente a entrada da Bolívia na ilustre lista de países que erradicaram o analfabetismo. Atualmente a taxa de analfabetismo no país é de 3,2%, segundo dados de março de 2015 do governo boliviano.

Baixo custo

A meta foi estabelecida como prioridade assim que o líder indígena Evo Morales foi eleito presidente pela primeira vez, em 2006. Atualmente ele cumpre seu terceiro mandato consecutivo, que dura até 2020. Ao tomar posse pela primeira vez, Morales estreitou relações diplomáticas e ideológicas com os chefes de Estado de Cuba, então Fidel Castro, e da Venezuela, o falecido Hugo Chávez. Da coalizão entre os "líderes bolivarianos" nasceu o projeto. A Venezuela colaborou com aporte financeiro e Cuba cedeu material e profissionais para implementá-lo na Bolívia. Além da própria metodologia Yo Sí Puedo, desenvolvida pela histórica pedagoga cubana Leonela Relys, falecida em janeiro de 2015. De acordo com os dados oficiais cubanos, o método já alfabetizou mais de oito milhões de pessoas em 30 países diferentes (leia mais sobre o método no box).

Na Bolívia, a primeira fase do programa durou apenas dois anos, mas foi a mais intensa e bem-sucedida. Entre 2006 e 2008, a Brigada Cubana-Venezuelana chegou em peso com recursos materiais como TVs, videocassetes, livros, apostilas etc., e técnicos, sobretudo professores, para treinar os mestres bolivianos e na adaptação das cartilhas ao contexto sociocultural do país - como, por exemplo, a tradução para cinco idiomas indígenas, caso do quéchua e do aimará. Nestes dois anos, o milagre aconteceu: a taxa de analfabetos caiu a 3,7% sob um custo operacional muito baixo, de 18 milhões de pesos bolivianos por ano, equivalente a pouco mais de R$ 7 milhões anuais - valor este mantido até hoje.

O programa então foi incrementado com sua segunda etapa, o Yo Sí Puedo Seguir. Neste segundo passo, os alunos já então alfabetizados - processo este que dura, em média, de três a seis meses - iniciam um ciclo de dois anos para se aprofundar em leitura, escrita e matemática, passando por bases das ciências naturais, e se formam no primário. Na Bolívia, o equivalente aos ensinos fundamental e médio (três anos) é proposto em dois ciclos de seis anos, o primário e o secundário.


Foco no professor

Em 2012 veio o revés: o Censo daquele ano confirmou um aumento de 5,02% no número de analfabetos, índice que tirou a Bolívia do seleto grupo das nações sem analfabetismo. "Demos muita atenção ao programa de pós-alfabetização e negligenciamos esforços na alfabetização. Essa pesquisa nos mostrou que não se pode descuidar nunca", explica o ministro da Educação, Roberto Aguilar Gómez. Lição aprendida, o Ministério precisou investir mais no programa. Com o orçamento já estabelecido, a decisão foi aumentar o engajamento do professor, que no Yo Sí Puedo é chamado de "facilitador".

Como em qualquer programa de educação sério, a figura principal é a do professor. Neste caso, é ainda mais: os cerca de 18 mil facilitadores não recebem um centavo  pelo trabalho de alfabetização. A recompensa é dada em benefícios como um plano de carreira bem estruturado, que prevê um salário mensal inicial de US$ 300 e um teto, a partir de 20 anos de profissão, de US$ 1.200. Há, principalmente, duas formas para os professores recuperarem o tempo investido no programa: aqueles que já dão aulas regulares sobem de nível (e de salário) a cada cinco anos, mas quem trabalha também como facilitador tem o tempo reduzido pela metade; outro caso é dos professores em começo de carreira, momento em que são exigidos dois anos de experiência na província (em regiões rurais do país) e para não precisarem sair de suas cidades, podem realizar esses dois anos no programa de alfabetização.

A partir de 2012, o governo passou a ser mais maleável quanto à concessão dos direitos e a permitir formatos de aulas ainda menos ortodoxas. Entre os professores aceitos no programa está Keyla Guzmán Vélez, que mora com o marido e o filho de três anos ao lado do Mercado Rodriguez, em um bairro de classe média de La Paz. Ela propôs e insistiu em um modelo de aula individual para cada uma de suas alunas (e seu único aluno homem) durante o horário de funcionamento do Mercado (termo em espanhol para feira de rua), entre suas barracas, frutas e legumes que as senhoras vendem.


O programa nas ruas

Há duas maneiras de se formarem grupos do Yo Sí Puedo. Uma associação de cidadãos, como moradores de um bairro ou trabalhadores de alguma categoria, se reúnem e congregam pelo menos dez pessoas dispostas a estudarem. Levam, então, a proposta de grupo, com horário e local de aulas incluídos, para o comitê de alfabetização local - há pelo menos um em cada cidade do país - e o comitê procura um facilitador. Este é o modelo que gerou o grupo de idosos que abre esta reportagem.

Outra forma de um grupo de alfabetização nascer é a partir da vontade de um professor de formar uma classe. É o caso da citada professora Keyla, pioneira no modelo de aulas individuais. Recém-formada na graduação de "professora normalista titulada", como é chamado na Bolívia, Keyla optou pela carreira de professora quando o filho Josué ainda era bebê. Para ter direito à licença profissional, ela teria de prestar os dois anos de "província", quando o professor é obrigado a sair da cidade e dar aula no interior, e, consequentemente, se afastar do marido e, talvez, do filho. Decidiu, então, cumprir esses anos como facilitadora do programa contra o analfabetismo, mas teria, ela mesma, de encontrar seu grupo. E encontrou comprando maçãs.

A rua em que mora faz esquina com uma das maiores feiras de rua de La Paz. Notou que aquelas senhoras que passavam dois terços de seus dias trabalhando não sabiam ler, escrever e faziam contas abstratamente. Pronto: teria seu grupo de alfabetização à porta de casa. Não era, todavia, tão simples. As senhoras iniciavam suas atividades no Mercado Rodriguez às 5h da manhã e deixavam o local apenas às 19h, ou seja, dedicavam quase todo o seu dia ao trabalho. Resultado: não toparam formar classes após a jornada de trabalho ou abrir mão do horário de vendas - que mesmo tão longo, rende somente cerca de 200 pesos bolivianos (aproximadamente R$ 90 reais) por dia a cada uma.

"É preciso entender a rotina, a realidade da vida dessas mulheres. Elas acordam de madrugada, deixam os filhos sozinhos, trabalham realmente o dia todo e ainda precisam voltar para fazer as atividades de casa", explica Keyla. "Compreendi que sou eu que tenho de me adaptar a elas, e não o contrário", conclui. Então começou sua peregrinação, subindo e descendo a feira para encontrar quem topasse as aulas em um modelo flexível. Final feliz: um senhor e 25 senhoras aceitaram. Então, Keyla combinou com cada um a melhor hora para o atendimento e todos os dias percorria o mesmo percurso com uma lousa na mão e apostilas em uma bolsa. Parava 20 minutos em uma barraca, uma hora em outra, ensinava subtração aqui, vogais acolá, tudo entre cebolas, cenouras, maçãs e as onipresentes batatas. "Eu trabalho desde os oito anos. Meus pais morreram quando eu era criança e tive de trabalhar, e trabalho muito até hoje. Só pude começar a estudar por causa da nossa maestra, ela que veio até nós", conta Paulina Flores, alfabetizada aos 49 anos e que, agora, vislumbra realizar o sonho antigo de entrar em uma universidade e se formar fisioterapeuta.

Seja nos grupos grandes, como de El Alto, seja nas aulas individuais, como do Mercado Rodriguez, há algo de fundamental para o programa funcionar: dedicação dos alunos. As aulas não ocorrem todos os dias, então é preciso que os alunos sigam em casa todo o programa determinado pelos facilitadores e pela cartilha. O curso de alfabetização exige leitura diária, assim como a prática de operações numéricas de soma e subtração e exercícios de caligrafia. Na pós-alfabetização, curso que hoje contempla a maior parte dos alunos do programa, já se caminha em direção à interpretação de textos mais longos, à elaboração de frases complexas e à execução de multiplicação e divisão, além de noções básicas de geografia, história e biologia.


Sistema de educação alternativa

O próximo passo, agora, é propor uma alternativa para que esses adultos possam seguir estudando. "É frustrante para eles chegarem até aqui, terem esperança de prosseguir e depois dependerem de colégios comuns para estudar", desabafa Keyla. "A alfabetização e a pós-alfabetização não são áreas de trabalho isoladas do sistema educativo, são parte da estrutura da educação alternativa, que é um subsistema dentro do sistema educacional boliviano. Muitos alunos que terminaram a alfabetização e a pós-alfabetização se incorporaram a programas de educação secundária de adultos. No ano passado, muitos desses estudantes conseguiram seus diplomas do ensino secundário, o que lhes dá a possibilidade de seguir os estudos em nível universitário", contrapõe Noel Aguirre, vice-ministro de Educação Alternativa da Bolívia. Segundo Noel, quando se trata de educação de adultos devem existir programas específicos para cada tipo de necessidade. No ano passado, a Associação de Trabalhadoras do Lar os procurou com um pedido: queriam se formar no ensino secundário, mas só tinham disponibilidade nas manhãs de domingo, quando não trabalham. "Nós adequamos o sistema e agora existem grupos de trabalhadoras do lar que estão estudando aos domingos", diz Noel.

Além disso, com o objetivo de adaptar ainda mais o programa à população boliviana, o governo concebeu projetos alternativos para incentivar os alunos a continuar em contato com os estudos, como é o caso das bibliotecas comunitárias, que são criadas próximas aos pontos de alfabetização espalhados pelo país, para que mesmo depois de formado o estudante não perca contato com a leitura. "Há dois anos realizamos o Festival Nacional de Canção Popular, que tem como objetivo que os participantes escrevam suas próprias músicas. Os melhores do país são trazidos a La Paz no Dia Internacional da Alfabetização (8 de setembro),  quando eles têm a possibilidade de gravar suas músicas em estúdio. Além do resultado cultural, de valorizar as músicas típicas de cada região do país, esse projeto também se transforma em material educativo de apoio aos novos grupos de alfabetização e pós-alfabetização", conta Ramiro Tolaba, diretor-geral do programa de pós-alfabetização.

Avançar é a palavra de ordem na Bolívia. O avanço educacional é evidente, mas é preciso mais modelos de educação alternativa para permitir que o sonho de ler e escrever realizado por Dom Quintim e Doña Paulina sejam apenas o primeiro de tantos.


 Combatendo a evasão escolar
A educação infantil foi também prioridade no programa para erradicar o analfabetismo na Bolívia. O alto investimento em educação (8,7% do PIB, o maior da América Latina) é para que até 2025 o número de analfabetos no país esteja controlado entre 1% e 2%, índice atrelado a outro objetivo: atingir 100% de presença de crianças na escola. O caminho para isto tem nome: Juan Manuel Pinto.

O Bônus Juancito Pinto homenageia um herói boliviano que foi à Guerra do Pacífico com apenas 12 anos. Sua função é semelhante ao do Bolsa Família no Brasil: gratifica monetariamente as famílias que mantêm seus filhos na escola. O valor de US$ 30 é pago anualmente (no mês de outubro) para cada criança que comprovar cumprimento integral do ano letivo.

O resultado já veio: a taxa de abandono escolar caiu de 6,5% em 2005 para 1,7%, segundo dados de 2013. Na educação primária, a meta está em vias de ser atingida, com 99% de cobertura, mas no infantil e secundário, ainda falta: ambos estão com cerca de 70% de alunos com idade adequada.

 Relato de reportagem: uma nova chance para escrever a história da Bolívia
Apesar de ser uma vizinha próxima, a Bolívia é, na verdade, completamente diferente do Brasil em termos de cultura. Isso apenas começa a explicar o quão difícil é fazer uma reportagem como essa neste país tão pobre e tão amável.
Desde o começo, a lógica é diferente: para ter acesso aos grupos de alfabetização e às autoridades, é preciso mandar uma carta (sim, por correios) e aguardar a resposta oficial - que nunca veio. Chegamos lá, com a vontade de dar voz a essa gente que está pela primeira vez recebendo a atenção do Estado que faltou em suas vidas inteiras e, na raça e na vontade - e depois de muito chá de cadeira - conseguimos os acessos.
Iniciou-se, então, uma das mais impactantes experiências que vivemos como jornalistas até então. Não bastasse a história de dedicação da professora Keyla, que lutou até conseguir que seu método de aulas individuais fosse aceito e que pinçou uma a uma suas alunas - história essa que por si só já valeria a matéria e a ida à Bolívia -, conhecemos ainda um grupo de 39 idosos em processo de alfabetização.
Depois de quase duas horas de viagem até El Alto, o carro estacionou e vimos aquelas quase quatro dezenas de senhores e senhoras vestidos impecavelmente para mais uma de suas aulas. Arriscamos um cordial "buenas tardes, amigos" e, em contrapartida, fomos surpreendidos: todos, um a um, e mesmo aqueles com dificuldades de locomoção, se levantaram e nos deram um beijo e um abraço. Ouvimos de cada um deles um "gracias" por simplesmente estarmos lá.
Don Quintim Pulma veio até nós, como uma espécie de representante daquele grupo, para entender nossas motivações. Convencido de que estávamos lá para dar voz a eles, desabafou sobre sua infância pobre, sobre as ameaças que o proibiram de estudar e, emocionado, após dizer que havia estudado apenas para provar "a eles do que é capaz", concluiu: "já posso morrer em paz."
A aula nos permitiu ver que o método é eficiente, mas não milagroso. Funciona melhor com aqueles que já tiveram empregos que exigiram mais do lado intelectual ou que frequentaram esporadicamente a escola. E, sobretudo, funciona para os mais disciplinados: a lição de casa regular é fundamental para o bom andamento do curso. Todos se formam, mas alguns com muito mais condição de seguir que os demais. É, antes de mais nada, um programa para dar auto estima a esses adultos e idosos. Sentem-se mais valorizados, sentem-se, pela primeira vez na vida, parte de uma sociedade que os olha com atenção.
Voltamos a entender a Bolívia: é um país predominantemente indígena que foi governado por uma elite financeira e/ou militar até a ascensão de Evo Morales à presidência. Com erros e acertos, foi uma virada histórica para os povos vulneráveis do país. Os índios pobres que não podiam estudar quando crianças, agora podem aprender depois de velhos e até sonhar com um diploma universitário.
A partir deste momento em que a comunidade se abriu tanto para nós, ouvimos, lá do fundo da classe, uma senhora dizer: "No se percam", algo como "não nos esqueçam" - os olhos molharam e a voz tremeu. "No vamos perder", respondemos. E aqui está a reportagem, para que nem nós, nem vocês, esqueçamos deles.

 Leonela Relys: a madrinha da alfabetização
O nome de Leonela Relys Díaz está escrito nas cartilhas de pelo menos 30 diferentes nações, entre eles diversos países latinos (incluindo aí o Brasil) e africanos e até mesmo a Espanha e a Nova Zelândia. A pedagoga cubana é a principal responsável pelo desenvolvimento do método Yo Sí Puedo, que alfabetizou mais de 8 milhões de pessoas, de acordo com os dados oficiais de Cuba.
Leonela nasceu na cidade de Camagüey em 1947 e, ainda prestes a completar 15 anos, participou da primeira campanha de alfabetização da ilha sob regime comunista. Sete anos depois se graduou "maestra", carreira que seguiu nas salas de aula e na academia, até se formar doutora em ciências pedagógicas pela Universidade de Havana. Passou, então, 20 anos na direção nacional de estudos para adultos de Cuba - período em que desenvolveu uma série de projetos que serviriam de base para sua obra prima.
Após dois anos trabalhando com alfabetização no Haiti, retornou à terra natal com a missão de criar a cartilha de um programa massivo ensinar a ler e escrever em Cuba e que pudesse ser exportado. No mesmo ano, 2001, o Yo Sí Puedo foi colocado em prática da forma como o conhecemos. Seu trabalho foi reconhecido como Heroína da República em Cuba e também pela Unesco com a honraria com o Prêmio Alfabetização Rey Sejong, em 2006. Vítima de câncer, a pedagoga faleceu em janeiro de 2015.

Yo Sí Puedo: o método
O programa de alfabetização regido da maneira original como proposto por Leonela Relys se completa após 65 aulas, divididas em três etapas primordiais: treinamento (10 aulas), ensino de leitura e escrita (42 aulas) e consolidação (13 aulas). As classes são ministradas por professores-facilitadores com o apoio de cartilhas e material audiovisual - cada país produz seu próprio modelo de conteúdo de acordo com a cultura local, mas atendo-se ao programa original cubano. Não há tempo mínimo e máximo para a graduação, embora o período considerado ideal seja de três meses.
Na primeira etapa (treinamento), os alunos são preparados a partir de suas capacidades orais e psicomotoras para iniciar o trabalho de leitura e escrita e, também nessa fase, são apresentadas as vogais e é feita a relação das letras com os números, símbolos geralmente já conhecidos dos alunos (A equivale a 1, B equivale a 2 e assim por diante).
No ensino de leitura e escritura avança-se na relação entre letras e números, formando sílabas e palavras. Neste momento do projeto, cuida-se com atenção do estudo das letras em si e dos fonemas. Encerra-se o ciclo com a consolidação, que é autoexplicativa: são propostos exercícios de fixação do que foi aprendido, como relacionar imagens e palavras, construção e compreensão de frases mais complexas e redação.
Estudantes aptos, então, seguem para o programa de pós-alfabetização Yo Sí Puedo Seguir. 

Telerrobôs substituem professores nos EUA

Rede formada por sete escolas públicas adotou o projeto; alunos e professores aprovam


Marina Kuzuyabu

Aulas com telerrobôs já são realidade em uma rede de escolas públicas dos EUA
Uma rede formada por sete escolas públicas nos Estados Unidos, a Nexus Academy, adotou o uso de telerrobôs em sala de aula. O equipamento, composto por uma torre e uma tela do tamanho de um tablet, é operado a distância por professores que conseguem se ''movimentar'' pela sala de aula e dar atenção individual aos alunos. Segundo Andrew Pasquinelli, diretor da rede, a novidade foi aprovada por professores e alunos, que declararam sentir-se mais próximos desde que o robô passou a circular pelos corredores da escola. O motivo é que a Nexus trabalha com o modelo do ensino híbrido, modalidade que mescla aulas presenciais e virtuais personalizadas às necessidades de cada um. Nas sessões a distância, estudantes e professores se comunicavam por telefone, e-mail e, principalmente, web chats. Mas desde a aquisição dos robôs, a interação aumentou

O que professores têm feito para formar bons escritores

Um dos maiores desafios dos educadores, o ensino da escrita deve estar associado a diferentes habilidades de comunicação e socialização, como a prática dos debates em sala

Márcio Venciguerra




Desafio: ensinar o domínio do código e, ao mesmo tempo, a escrita como expressão
"As professoras mandam eu fazer redação. E eu faço, só que na maioria das vezes eles não consideram porque acham que não foi de minha autoria, acham que não fui eu que fiz. Não dão nota boa, porque acham que eu peguei de algum lugar, por algum autor, por alguma coisa parecida. Mas eles nunca acreditaram que fui eu que fiz." O relato trazido por Valéria Fagundes no filme Pro dia nascer feliz, de João Jardim, lançado em 2005, quando tinha 16 anos, ainda pode descortinar uma das dificuldades da educação brasileira? Aluna da Escola Estadual Cel. Souza Neto, do município de Manari (PE), então considerado o mais pobre do Brasil, Valéria relatava no filme ser leitora assídua da poesia de Vinicius de Moraes, Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade. Admitia que os colegas a achavam "diferente" por gostar de ler, e não encontrava seu lugar na escola. Valéria tocava em um ponto que permanece atual: estamos conseguindo ensinar bem redação nas escolas brasileiras?

+ LEIA MAIS - Troca de cartas: uma forma de estimular a escrita em sala de aula

No começo do ano, o Ministério da Educação divulgou o resultado do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Um dos dados que mais repercutiram na imprensa foi o de que, dos mais de seis milhões de alunos que fizeram a prova, 529 mil obtiveram nota zero na redação (8,5% dos candidatos). Deste número, 248 mil redações foram anuladas. Fazem parte desse caso não atender à proposta solicitada ou possuir outra estrutura textual que não seja a do tipo dissertativo-argumentativo; apresentar texto de até sete linhas, copiar linhas dos textos motivadores, que servem apenas como referência, ou escrever "impropérios", desenhos e outras formas propositais de anulação.

À época do filme de João Jardim, as avaliações do MEC apontavam que a metade dos estudantes do ensino fundamental não conseguiam ler ou escrever corretamente. Hoje, apenas um em cada quatro brasileiros atinge um nível pleno de habilidades no uso da leitura, escrita e matemática, segundo os últimos dados do Inaf Brasil 2011 (Indicador de Analfabetismo Funcional), realizado pelo Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa. Numa avaliação sobre a capacidade de leitura e escrita de alunos do 4.º e 7.º anos do ensino fundamental, divulgada em 2014 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), o Brasil aparece na sexta posição, entre 15 países da América Latina e do Caribe.

Os dados são conhecidos. Mas, em meio a tantos índices desanimadores, o que está acontecendo com a redação dos alunos? Um dos motivos apontados por educadores para as dificuldades está no duplo desafio de ensinar o domínio do código e, ao mesmo tempo, fomentar o uso da escrita como forma de expressão. Outra preocupação compartilhada por professores é a familiaridade dessa geração com textos curtos, como os digitais, e a dificuldade de entrar em contato com textos mais longos e reflexivos.


Falta repertório

Ao invés de paralisarem o trabalho do professor, essas constatações podem servir de aliadas no desenvolvimento de processos de aprendizagem que partam do universo dos alunos.

Nesse sentido, a professora Tamine Cauchioli Rodrigues, da Escola Classe no Paranoá, no Distrito Federal, relata um caso para justificar sua crença de que esses desafios podem ser vencidos. No ano passado, ela se deparou com um adolescente numa turma de 5.º ano do ensino fundamental. Ele era cinco anos mais velho do que os demais. "Era o estereótipo da frustração escolar", diz Tamine. "Retrato de tudo o que leva à desistência, como baixa autoestima e notas de reprovação ano após ano."

Ao trocar mensagens de celular para marcar uma conversa com a mãe do garoto, Tamine teve uma surpresa: "opa, esse menino sabe escrever!" Mas por que então não demonstrava isso na sala de aula? "Se você não está motivado, escrever é muito mais difícil", constata Tamine. "Isso vale para todo mundo."

Para a professora, na fase do domínio do código escrito, há dezenas de ferramentas à mão do professor, já tornar a escrita um espaço de expressão exige estratégias escolhidas caso a caso. No geral, entretanto, Tamine escolhe uma: antes, é preciso trabalhar a leitura do mundo, para que o aluno tenha repertório e seja motivado a escrever sobre suas experiências.

Soleima Cardoso, diretora da Escola Classe 415 Norte, de Brasília, diz que gostaria de ouvir a expressão dos alunos, seja na fala ou na escrita, porém, ela avalia que as crianças estão cada vez mais rápidas, tanto ao escrever como em diálogo. Ela conta ouvir frequentemente os alunos dizerem "já entendi", apenas porque estão com alguma pressa.

Para Soleima, a sala de aula está sendo pressionada a suprir a crescente falta de conversa, no esforço de formar jovens capazes de se comunicar, tanto oralmente como por escrito. "Quando comecei a trabalhar, há 18 anos, a situação era diferente", conta. "De uns cinco anos para cá, noto claramente que os alunos estão mais impacientes, não se apropriam dos conceitos e informações e têm menos vocabulário."

A professora atende a um público variado, que vai dos filhos da classe média aos de famílias de baixa renda. Ela acredita que os pais de todas as origens poderiam ajudar se conversassem mais. Gestos aparentemente simples, mas muito importantes, como incentivar que os filhos contem como foi a visita à casa de um amigo. "Nós vivemos num mundo que exige "ir direto ao ponto", no qual as pessoas não têm mais tempo para respostas longas, e isso acaba limitando as crianças", acredita.


Notas baixas

Dois vetores puxam para baixo a média das provas de escrita de crianças e jovens brasileiros, na opinião da pedagoga Daniele Nunes Henrique Silva, do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB). O principal é a estrutura precária da rede pública de ensino, com baixos salários e salas lotadas. "O professor faz o possível", diz ela, que ensinou na Educação Básica por dez anos e hoje forma profissionais e pesquisa formas de fomentar a criatividade nas escolas. "O Brasil precisa de uma grande revolução na rede pública, como aconteceu no Canadá, Cuba e Coreia", defende.

A outra força que conspira para não se formarem bons escritores na sala de aula é o ritmo da vida

atual: além da pressa, surgiram muitas tentações. À margem da grande quantidade de estímulos oferecidos para entreter, o professor precisa levar seus alunos a praticar uma atividade que demanda perseverança, trabalho duro e determinação. "Leitura e escrita não dão prazer sempre, apenas eventualmente", constata Daniele.

A professora de literatura Eva Pereira concorda que há novos elementos de sedução que afastam os alunos do ensino médio e fundamental do universo letrado. "O objetivo de saber escrever é de longo prazo e concorre com os estímulos de resultado no curto prazo", avalia a doutora em Letras pela Universidade de São Paulo (USP).

Ela vê pouco incentivo à escrita na rotina dos jovens. "O acesso à internet é fácil, mas o livro continua com uma aura que afasta", diz. E, apesar de as redes sociais e outros sítios virtuais ampliarem a troca de mensagens de texto, Eva observa que se trata de uma expansão da oralidade, e não propriamente uma experiência de escrita.

Eva formou essa opinião não apenas por causa dos frequentes erros de grafia ou concordância que vê nos textos de seus alunos, mas devido à falta de pontuação. "Pontuar é estabelecer relações lógicas entre as orações e sintagmas, mas também é uma forma de marcar a entonação, que nas mensagens é dada pelos rostinhos (emoticons)." Os comentários de notícias na internet, outra forma bastante usual de escrita, na opinião de Eva costumam revelar a falta de desenvolvimento de uma argumentação, o que caracterizaria linguagem escrita. "Acaba se tornando uma troca de preconceitos e provocações", avalia.


Laboratórios

Para Daniele Nunes, da UnB, só ensina bem quem vivencia as dificuldades de escrever. Por isso, ela defende que laboratórios de escrita façam parte da formação

continuada dos profissionais de educação. "Não temos professores formados para a construção laboratorial escrita", lamenta. "Não temos pauta no currículo para formar um escritor desde o fundamental, a meta é praticar apenas alguns gêneros literários", reflete.

A proposta de Daniele vai ao encontro de um dos eixos do trabalho do professor titular de teoria e história da educação na Universidade de Barcelona, Jorge Larrosa Bondía. Para ele, o professor deveria ser um "ensaísta", ou seja, ter entre suas atribuições praticar a escrita de ensaios. Em entrevista à revista Educação de maio de 2013 (Ed. 193), Larrosa disse que mesmo na Espanha, "em um país onde a maioria dos jovens tem sido altamente escolarizada", eles, no entanto, "não sabem escrever". Para Larrosa, ao escrever ensaios, o professor treina a capacidade de escrever, "algo que não é nada fácil", ao mesmo tempo que pode exercer uma forma de autoavaliação, "porque a escrita de qualquer tipo produz certa exteriorização do próprio pensamento".

Daniele prefere chamar as atividades de produção de texto de "laboratório" porque o termo reforça o caráter "laboral" da escrita. O enfoque na transpiração e não na inspiração é também um modo de combater um mito que dificulta a formação dos escritores. "Há a figura do criador genial, que tem um dom especial", diz Daniele. "Enquanto persistir essa noção de talento nato, a prática formativa não tem como existir", acredita.

A pedagoga usa uma imagem semelhante à do poeta para explicar a arte de alinhar palavras. "Comparo com a escavação arqueológica: poucas atividades são tão metódicas e vão do trabalho pesado com a pá, à delicada limpeza da poeira com um pincel." A metáfora também permite imaginar que a tarefa não se limita à colheita da peça no campo. Há também uma outra fase na bancada, depois de o texto inicial ficar guardado um tempo longe dos olhos do autor.

Esse é também um problema para ensinar, já que demorar mais em uma tarefa contradiz o ritmo da vida moderna, que todos querem acelerar. Daniele relata que atualmente é difícil convencer alguém a deixar o texto na gaveta por alguns dias para revisar e reescrever - uma dica sempre presente quando grandes escritores contam seu método de trabalho. Para ela, a fase da correção, autocrítica e melhoria dos trabalhos é negligenciada nas escolas. "Nós deveríamos começar essa prática já na fase anterior à alfabetização", defende, "costumamos achar lindos todos os desenhos das crianças, quando poderia ser um momento de aperfeiçoamento das habilidades."

Ao orientar teses e dissertações, Daniele se bate contra a urgência dos alunos que prometem redigir e entregar em dois ou três dias. "Essa é uma contradição porque temos sempre a pressão para publicar cada vez mais, porém, a fase da gaveta é importante", diz.

Por outro lado, lembra a pesquisadora, as escolas usam pouco ou quase nada as vantagens da informatização na produção escrita - que podem aliviar e muito a carga de trabalho. Os programas de edição de texto proporcionam o aspecto limpo do trabalho final, mesmo depois de mudar parágrafos de lugar e rearranjar as palavras. E a facilidade de acesso a dicionários não se compara ao trabalho com papel e caneta.


Formas de expressão

O ensino de escrita deve estar atrelado às outras habilidades de comunicação e socialização, no ponto de vista de Eva Pereira - que, além de ter ensinado na Educação Básica e superior, atua como ativista cultural e coordena oficinas literárias.

Associar ler a escrever é o mais comum, mas a redação também não pode ser dissociada de falar e ouvir. A prática dos debates em sala de aula é um passo para a organização das informações, elaborar a narrativa e se expressar. "A voz da criança tem de ser respeitada, mesmo se for problemática", lembra a professora.

Ela cita como exemplo uma roda que coordenou, na qual um aluno mentiu e um colega expôs a mentira. Ao invés de reprimir o mentiroso, como os meninos esperavam, ela disse que também gostava de mentir e criou uma atividade em torno da invenção de histórias. "A brincadeira de mentir revelou os desejos das crianças", conta ela. "Como o menino, todos mentiam para se valorizar", diz Eva, ao lembrar ter explicado à turma que não defendia a mentira fora de seu papel na fabulação.

A quinta dimensão que deve estar associada ao ensino da escrita é o brincar. Além dos jogos de palavras, a brincadeira no ambiente da oficina literária é mais uma forma de favorecer a expressão dos alunos. "Brincar implica o corpo completo envolvido na comunicação, o que inclui também outros modos de expressão, como dançar", diz.

Eva conta o exemplo de uma menina do Uruguai que tinha atitudes violentas na classe, mas que trazia um histórico dramático: o pai matara a mãe e agora ela era criada pela avó, que traficava drogas. Por meio de brincadeiras de rua tradicionais, a menina foi levada a aprender a respeitar regras e assim passou a se integrar na oficina de produção de textos. "Mais tarde, quando já tinha deixado aquela escola, fiquei sabendo que ela voltou a ser agressiva com os colegas", conta. "Na época, junto com os outros professores envolvidos no projeto, fiz parte da rede de apoio à menina, mas a escola tem seus limites."


Ler em voz alta

Como diretora, Soleima Cardoso tem incentivado as colegas a voltar com a prática da leitura em voz alta nas salas de aula. "Há um modismo de acabar com tudo que era característico da escola tradicional", diz. No entanto, para ela, a dinâmica tradicional de cada aluno ler um parágrafo de um texto não deveria ter sido eliminada, pois resultou na falta de fluência verbal dos alunos.

Embora não tenha relação direta com escrever bem, Eva concorda com a necessidade do exercício da leitura em voz alta e defende que deva ser acompanhada de conversa sobre os textos lidos e acontecimentos do cotidiano. "De novo, a participação do corpo é importante. Ler em voz alta exige a atenção à altura da voz, ao domínio das possibilidades da acústica do ambiente, a uma postura corporal específica. Também tem a ver com a fala e a escuta das narrativas, das histórias que o professor e os outros colegas trazem para contar."

Eva defende que a escrita não seja necessariamente o foco central do ensino, mas parte de um trabalho com essas cinco dimensões (brincar, falar, ouvir, ler e escrever), embora o escrever é o que será cobrado em prova. "Isso tudo envolvendo o contexto, como ensinou Paulo Freire", diz.

O foco na necessidade humana de se expressar falando, interagindo em grupo e escrevendo é visto por Eva como a melhor forma de fomentar o gosto pela tal atividade "triste", como definiu Carlos Drummond de Andrade (em O poder ultrajovem): "O que você perde em viver, escrevinhando sobre a vida. Não apenas o sol, mas tudo que ele ilumina", ensina o poeta. E olha que no tempo dele não havia a dose de adrenalina programada nos jogos eletrônicos e nem mesmo uma rede social para fofocar.

 Narrar e poetar para bem dissertar
A precocidade com que as crianças estão sendo preparadas para o vestibular é um problema de difícil solução para o ensino da escrita, na opinião da professora de literatura Eva Pereira. O enfoque, que antes ficava restrito ao ensino médio, acaba por tomar o espaço da narrativa, que é o gênero mais empolgante para iniciar o trabalho com literatura, por ser próximo da oralidade. "Esse excesso de exercícios de dissertação acaba por contribuir para a dificuldade da escrita e da leitura", avalia. "As crianças - e os adultos também  - gostam de contar histórias, gostam de ouvir histórias, e gostam de brincar com as palavras. O gênero literário que mais brinca com as palavras é a poesia."

Para ela, é preciso lembrar que os tipos de redação não são estanques. Numa dissertação, o domínio da narração ou da descrição é necessário. "Mesmo que a estrutura geral seja dissertativa, a redação joga com os outros tipos de redação", diz. "O contato com a narração e com a descrição pode contribuir para o aproveitamento dos recursos próprios desses gêneros, inclusive na dissertação."

A professora de ensino fundamental Tamine Cauchioli Rodrigues avalia que essa é mais uma das características da visão da escola conteudista, voltada para o vestibular. "Não posso privar as crianças da dissertação, pois isso será cobrado delas mais tarde, mas posso usar poemas para ensinar a dissertar."