Da Redação - Stéfanie Medeiros
A viagem para a Índia veio de forma inesperada, quase que por acaso. Já em contato com técnicas terapêuticas corporais importadas do oriente para o Brasil, Enildes Côrrea, 55 anos, não hesitou quando surgiu a oportunidade de estudar esta prática no oriente. Com um “sim” como resposta, Enildes realizou o sonho de visitar o país de nascimento de Guatama Buddha.
“Fiquei encantada com tudo o que tive oportunidade de vivenciar na Índia. Um modo de viver totalmente diferente, voltado para a interiorização e a espiritualidade, e que plantou em mim a semente do retorno. O Oriente tornou-se uma atração irresistível em minha vida”, disse Enildes em entrevista ao Olhar Conceito.
É difícil dizer, ao longo dos anos, quais os momentos mais marcantes de suas viagens à Índia. Mas Enildes lembra do “Ser Desperto”, o místico sufi indiano Kiran Kanakia, que conheceu em 1994 e com quem viveu ao longo de 12 anos consecutivos. “Encontrá-lo e tornar-me parte da sua família foi uma bênção. Um mestre iluminado é fonte de luz, silêncio, amor e sabedoria. Sua simples presença silenciosa e amorosa é um bálsamo alquímico para as nossas mais profundas e doídas feridas internas”.
Segundo Enildes, o mestre é o “Grande Terapeuta”. Sentar-se com ele é como sentar-se consigo mesma e a compreensão da vida, tanto externa quanto interna, foi onde Kiran a ajudou encontrar o caminho da paz interior e o retorno a si. Foi ele que disse a Enildes: “Entenda como viver, como estar em harmonia, como estar em equilíbrio, como estar em sintonia com a vida. Uma vez que você compreende como estar em sintonia, a vida se torna uma dança”, palavras que a terapeuta e escritora nunca esqueceu.
Enildes também ressalta que a convivência com mestre Kusum Modak, que foi quem criou o famoso método terapêutico da Yoga Massagem Avuvérdica Tradicional, e também com o doutor Mukund Bhole, criador da abordagem Anubhava Yoga, “expert” em Pranayamas (práticas respiratórias de Yoga).
Estas e muitas outras experiências foram relatadas em vários artigos e textos que Enildes aos poucos publicou nos jornais de Cuiabá. A recepção acolhedora e positiva dos leitores fez com que estes escritos fossem reunidos no livro “Vida em palavras”, lançado em Brasília em 2010.
“Enildes associa a velha Cuiabá com a velha Índia e tece uma poderosa rede de alquimia humana, cultural e de sabedoria. Mesmo à distância, as duas pátrias se parecem tanto na exata simplicidade de suas origens. Não é uma obra de filosofia nem religiosa. É de provocações que atingem esse novo viver diário do mundo moderno, tão atropelado pela urgência de ir e vir aos mesmos lugares de sempre, em busca de respostas que nunca estiveram fora de nós mesmos”, diz um trecho do prefácio, escrito pelo jornalista Onofre Ribeiro, ex-Secretário Adjunto de Comunicação do Estado de Mato Grosso.
Este ano, Enildes participou do Seminário "Índia e Brasil: uma parceria para o Século XXI", organizado pela Fundação Alexandre de Gusmão em parceria com a Embaixada da Índia no Brasil. O evento foi realizado 3 de outubro, no auditório Paulo Nogueira Batista, do Palácio Itamaraty, em Brasília (DF). No evento, a escritora e terapeuta chegou a entregar um exemplar de seu livro aos embaixadores Ashok Tomar, da Índia, Hardeep Puri, ex-representante permanente da Índia nas Nações Unidas, José Vicente de Sá Pimentel, presidente da Fundação Alexandre de Gusmão, e à subsecretária-Geral Política II, Maria Edileuza Fontenele Reis.
Sobre o futuro, Enildes tem projetos de escrever um segundo livro com temas voltados ao aprofundamento da espiritualidade. Também está focada no detalhamento de conteúdos apresentados em “Vida em Palavras”.
Curiosidade: Sonho de um jardim
Enildes Côrrea, através de uma carta, sugeriu ao governador de Mato Grosso da época, Dante de Oliveira, que no Parque Mãe Bonifácia, ao invés de se contruírem quadras na entrada principal, fosse feito um jardim. A carta, publicada nos três principais jornais da cidade, foi acatada e é uma das responsáveis pelo “Jardim do Cerrado” do Parque.
Confira a carta:
“ Cuiabá, 28 de dezembro de 2001.
Senhor governador Dante de Oliveira,
Através desta, quero registrar minha sugestão referente às obras a serem implementadas no Parque Mãe Bonifácia.
Tomei conhecimento, por meio dos jornais, de que lá serão construídas quadras de esportes. Por que não fazer um jardim, ao invés de quadras? A construção dessas quadras pode ser transferida para outras áreas da cidade, onde, certamente, há mais necessidade delas. Um belo jardim não existe em Cuiabá, a não ser nas residências das elites que aqui vivem.
O jardim vai estar mais em sintonia e harmonia com o parque, que predispõe ao silêncio, à contemplação e à meditação. Fui caminhar lá. Imaginei as pessoas, do alto do mirante, contemplando a beleza desse jardim, que visualizei nos moldes de um que visitei na cidade de Nova Délhi, no qual existe um lindo templo dedicado à paz – o Templo de Lótus. A sensação que tive foi tão boa! Por alguns instantes, foi como se um pedacinho da Índia, esse país que tanto amo, tivesse sido transportado para o Parque Mãe Bonifácia.
Aliás, sempre que ando pelas suas trilhas e atravesso aquelas pequenas pontes e, principalmente, quando desfruto e comungo com o silêncio, a beleza e uma certa magia que sinto suspensa no ar daquele local, lembro-me da semelhança existente com o famoso parque de um dos ashrams onde estudei naquele país. Tão bonito é o parque, que se tornou, tal qual o nosso Mãe Bonifácia, uma das atrações turísticas de Poona.
Entretanto há uma diferença entre eles, o de lá foi idealizado e concretizado como um presente dos discípulos ao Mestre e à sua gente. O daqui, uma iniciativa do atual governo deste Estado, que ofertou esta obra ao povo cuiabano.
Tenho certeza de que, assim como eu, muita gente irá preferir o jardim às quadras. Deixemo-las para os clubes, praças, escolas e onde mais se fizerem prioritárias. Ainda está em tempo de mudar o projeto! Espero que V. Exª, na qualidade de amigo número um do parque, como todos nós sabemos, reflita seriamente sobre esta ideia. Seria como um oásis em Cuiabá, um imenso gramado bem verde e bem cuidado, cheio de flores amarelas, vermelhas, brancas... Um presente ao parque, aos seus amigos e a todos os seus visitantes. Um culto à paz e à contemplação, bem de acordo com o que lá buscam as pessoas que o frequentam.
A energia do local vai ficar ainda melhor se, no lugar de concreto e barras de ferro, forem semeadas naquela terra sementes de lírios, orquídeas, margaridas, amores-perfeitos, cravos, rosas...
Então, num futuro próximo, os avós passearão com seus netos por esse jardim e poderão mostrar-lhes que cada flor, assim como nós, tem sua beleza única, seja ela uma rosa vermelha ou um amor-perfeito. Que cada expressão que floresce tem a sua radiância e a sua própria fragrância.
E eu, também já avó, levaria o meu pequeno tesouro para que ele visse, com seus lindos olhos verdes, que o cravo e a rosa deixaram de brigar e entraram em comunhão.
Desejo a todos que neste momento estão lendo esta carta que, no Ano Novo, as pedras que machucam e ferem os nossos pés sejam substituídas pela maciez da grama coberta pelo colorido, suavidade e beleza das flores.”
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