Cátia Lima
No próximo mês de outubro é comemorado o dia das crianças. Que elas devem ser amadas para crescerem de modo saudável é do conhecimento de todos (ou deveria ser). Mas será que o modo com os pais amam os filhos influencia no modo como essas crianças vivenciarão seus relacionamentos amorosos na vida adulta? “É certo dizer que a criança amará na vida adulta a partir dos valores e da educação recebida na infância”, afirma o psicólogo, psicanalista, consultor familiar e escritor Teuler Reis. Ajudando famílias há anos a lidarem com seus problemas, Reis fala nesta entrevista sobre amor na infância, família e educação amorosa, e alerta aos pais: “Não nascemos com virtude alguma, é preciso ensinar as virtudes aos filhos”.
A educação e o modo como os pais amam a criança pode influenciar no modo como ela amará na vida adulta?
T: A educação é a matriz da vida futura. A criança aprende desde cedo a ver a vida com os olhos dos pais. Grande parte das dificuldades encontradas pelos pais na educação dos filhos é reflexo de atitudes tomadas, ou omitidas, na primeira infância. Gosto de lembrar aos pais que não nascemos humanos, nos tornamos seres humanos. O papel de formar seres humanos é da família e da escola. Somos um feixe de experiências acumuladas ao longo da vida. Então é certo dizer que a criança amará na vida adulta a partir dos valores e da educação recebida na infância.
Há quem diga que adultos buscam parceiros parecidos com os pais, na tentativa de substituir a figura paternal por um relacionamento. O senhor concorda?
T: Como psicanalista acredito que projetamos nossos desejos inconscientes nas nossas relações. Assim, acredito que é preciso o sujeito buscar o autoconhecimento para não se ver presa de situações complexas. Mas também é importante notar que de qualquer maneira estamos sempre buscando essa figura “paternal” nas nossas relações, afinal de contas, carregamos o desejo de ser amado pelo outro. Isso é inevitável.
Geralmente, sem alguém por perto a criança se desespera e chora. É importante ensinar a criança a lidar com a solidão?
T: Não somente em relação à solidão como também em relação à morte. Todos os grandes filósofos nos mostram a importância de aprender a lidar com a morte. E a experiência da vida é uma experiência solitária. Embora nossa sociedade crie vários meios de fugir dessa verdade ela está aí, nos ronda.
Muitos dizem que filhos únicos crescem e se tornam egoístas e mimados. Não ter um irmão com o qual os pais dividem a atenção pode mesmo moldar o comportamento da pessoa? Quais cuidados esses pais devem ter?
T: São mitos da sociedade. A criança precisa mesmo é de pais que as orientem na vida, que lhes ensinem a serem seres virtuosos. Não nascemos com virtude alguma, é preciso ensinar as virtudes aos filhos. Filhos egoístas e mimados são crianças privadas da educação das virtudes. Solidariedade, paciência, prudência, tudo isso se aprende, assim como todas as outras virtudes.
Todos nós sabemos que o amor não é um conto de fadas e nem sempre tem um final feliz, no entanto, quando crianças aprendemos sobre o amor por meio dos contos de fadas. Crescer ouvindo sobre essas ilusões pode causar sofrimento quando se cresce e descobre que o “príncipe encantado” não existe?
T: Absolutamente! Estudos mostram a importância dos contos de fadas na vida das crianças. Os contos estão cheios de representações simbólicas que ajudam a criança a superar momentos difíceis em sua vida.
Geralmente os pais passam pelo momento de conversar com a criança sobre sexo. Como isso deve ocorrer e quando?
T: Quando os pais acharem que é o momento. Quando a criança mostrar curiosidade os pais devem “acalmar” suas expectativas. Isso não significa dar uma aula de sexualidade para a criança. Lembro-me de um comercial interessante, a mãe de costas para filha pequena ouve a seguinte pergunta: ” mãe o que é virgem?” A mãe apavorada com a pergunta começa a tecer um longo discurso sobre virgindade para a filha. Quando termina sua explicação longa, ouve a próxima pergunta da filha, que nesse momento está com uma garrafa de azeite de oliva na mão, ” e extra-virgem mãe, o que é?”.
Recentemente, o vídeo de uma criança de quatro anos chorando apaixonada pelo professor recebeu muitos comentários na Internet. Uma criança pode se apaixonar? Os namoros na infância devem ser incentivados?
T: Penso ser de outro registro essa paixão que a criança demonstra. Quem sabe uma carência afetiva? É preciso conhecer cada caso e investigar o que sustenta esse sentimento. Não gosto de generalizar esses comportamentos. Quanto aos namoros, não incentivaria de maneira alguma meu filho, mas também é preciso lembrar que essas brincadeiras, essas fantasias sempre fizeram parte da vida fantasiosa das crianças, mas quando a criança diz que namora o amiguinho ela, muitas vezes, quer dizer que gosta dele, que se sente bem ao lado dele, é outro registro. A infância já está tão esquecida, foi tão reduzida nos últimos tempos. É preciso ensinar as crianças a viverem a infância como antigamente, brincar, sonhar, fantasiar. O tempo passa muito rápido, é um crime perder a infância.
Para encerrar, muitas celebridades já causaram polêmica quando grávidas declararam “não quero um filho gay”. Como os pais devem agir com a criança caso percebam que ela pode ser homossexual?
T: Primeiro é preciso lembrar que moramos num país democrático e isso significa respeitar as diferenças. Está na nossa constituição o repúdio a qualquer forma de discriminação. Portanto devemos respeitar as pessoas. Vale lembrar que ninguém escolhe ser gay, isso não é escolha que alguém realiza, é uma orientação. Se fosse uma questão de escolha, penso eu, ninguém iria querer escolher ser gay tendo em vista a sociedade preconceituosa como a nossa. Tem melhorado, mas ainda estamos longe de nos intitularmos uma sociedade sem preconceitos. Mas o que costumo dizer aos pais que me procuram com essa questão, é para colocar seu filho ou filha numa terapia para que ela fique forte o suficiente para enfrentar essa sociedade preconceituosa.
Fonte: http://www.eusoqueriaumcafe.com/2010/09/entrevista-educacao-infantil-e-o-modo.html
domingo, 19 de fevereiro de 2012
Entrevista - Educação Infantil e o modo de amar
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