Artigo de Alexandre Le Voci Sayad, publicado originalmente no Portal Aprendiz
Pensar em modelos de educação que inovem ironicamente não é uma novidade. A morte do currículo foi decretada cinicamente algumas vezes – o paradigma de não seccionar o conhecimento em áreas de conhecimento chega a ser um discurso cansativo, proferido por quem acredita em uma “educação contemporânea”.
O fato é que o mundo da educação padece por ser formado em sua maioria por pensadores, e não executores. Mudar um sistema de ensino é muito complexo; realizar experiências pontuais – construir escolas ideais - que sirvam de exemplo e instiguem mudanças maiores, não tanto. Mesmo assim educadores preferem elaborar teorias a realizar experiências e correr riscos.
Há alguns dias fui provocado por dois jovens e inteligentes documentaristas, Antonio Lovato e Raul Perez, a dar um depoimento sobre “a escola que considero ideal”. Nunca havia pensado de forma totalmente onírica e livre sobre esse tema, então coloquei minha mente para rodar antes da câmera ser ligada.
Viajei muito no Brasil e no mundo para conhecer escolas; ouvi outras tantas de amigos. Nesse meu fluxo de pensamento interno me lembrei dos laboratórios do MIT (Massachusetts Institute of Technology), do Schumacher College, da Escola da Ponte, da Cidade Escola Aprendiz, de uma escola dinamarquesa relatada pelo Rubem Alves, em que estudantes aprendiam a construir uma casa e também da Oregon Episcopal School, a OPS, que me encantou.
Todos os exemplos têm elementos em comum: ignoram o currículo, pois trabalham por projetos – teoria que data dos anos 40. E todas são idealizadas e coordenadas por educadores fora dessa cátedra.
Antes de dar a reposta cara a cara com os dois cineastas, pensei, muito centralmente, nas minhas experiências com jovens produzindo comunicação – como o Idade Mídia, do Colégio Bandeirantes. Vivências em que os estudantes se apropriam do espaço escolar e aprendem muito mais assim: quando sua expressão surge no universo do aprendizado; e quando são estimulados a acreditar na sua capacidade de realização de um projeto – no caso uma revista ou um documentário.
Mas quando comecei a falar, quis dar um passo atrás do meu sonho de escola educomunicativa para ser mais desamarrado de conceitos, e procurei achar pontos em comum a todas elas. E percebi: são experiências de e para “garagens”.
Me lembrei daquelas garagens de casas antigas, onde se acumulam bugigangas, mas há sempre uma mesa para se sentar e organizar as ideias. Portanto, cheguei a conclusão que minha escola ideal assemelha-se a uma garagem. Dessas mesmo onde as crianças têm a tentação de montar robôs com peças velhas.
Lá, o foco está na criação e inovação do estudante. O professor é um tutor que circula entre os objetos, orienta as criações e aprende muito também. Um tablet conectado à internet seria o material básico. Os produtos lá desenvolvidos trariam um pouco de cada disciplina.
Quando terminei a entrevista, tive a estranha sensação de ter vivido essa atmosfera de garagem, na maioria das vezes, em ambientes educomunicativos. Fui induzido a pensar na comunicação novamente. Muito porque ela está no DNA do estudante antes mesmo da escolarização chegar. Este é seu ponto mais forte – joga a favor do estudante.
A garagem tem um apelo tão forte para a educação que, se nenhum projeto for capaz de brotar daquele ambiente, ainda é possível vender limonada (como fazem os norte-americanos) ou montar uma banda de rock (como faz qualquer jovem). O que, em ultima instância, são também projetos.
Fonte: http://portal.aprendiz.uol.com.br/2012/03/08/escola-deveria-ser-garagem/
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