Iza Aparecida Saliés
O documento ‘Síntese das reflexões e das contribuições extraídas da Conferência da UNESCO 2001, levantou problemas na educação em vários países, de âmbito socioeconômico e político que se encontram na origem dos limites da contribuição da educação para “viver juntos”, ou seja, que estão dificultando o avanço na educação mundial.
Retrata ainda que:
‘‘Ficou visível a tensão existe entre os fatores externos á educação que constituem obstáculos à aprendizagem e ao ensino do “viver juntos” e os fatores intrínsecos das instituições educativas, as dos sistemas de ensino, que permitem constatar a existência de uma “crise de paradigmas”, de um limite dos tipos de educação, herdados do passado, quando se trata de alcançar os objetivos fixados ou esperados’.
Com essas discussões da década de 90, os países membros da UNESCO teriam que programar mudanças em seus sistemas de ensino, com vistas a instituir uma educação para ensinar a “viver juntos”, quanto ao acesso e a qualidade da educação.
Detectaram ainda, via estudos, dificuldade muito grande em transformar a educação, em toda sua abrangência, numa educação proposta para essa nova concepção. Considerando que por séculos a educação foi oferecida de forma excludente quanto à oferta, à organização, à forma de ensinar e aprender. A educação brasileira convive e trabalha com conceitos e concepções que há décadas em países desenvolvidos estão em desuso.
Com o Brasil não foi diferente, aqui, a década de 90 foi de mobilização pela educação para todos, teóricos, especialistas e estudiosos centraram suas pesquisas no projeto de lei para uma educação para todos, ou seja, que atendesse as premissas da educação emanada pela UNESCO, porém, com a observação de adaptar às necessidades brasileiras e pautadas na nossa realidade.
Pensar, discutir e escrever a educação brasileira numa perspectiva pós - moderna não foi fácil, colocá-la em prática, foi bem mais difícil do que esperávamos. Estamos com praticamente 17 anos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional /LDB e ainda não conseguimos romper antigos paradigmas educacionais.
A LDB aprovada em 1996, manual obrigatório da educação brasileira traz em seus artigos e dispositivos grandes avanços, tais como: universalização da oferta e o acesso à escolarização básica; institui o sistema educacional; estabelece competências para os estados, municípios e o governo federal; diz sobre o sistema de colaboração; traça novos percursos pedagógicos; propõe superar os desafios do ensino e da aprendizagem; recomenda mudanças na prática pedagógica do professor; garante a valorização profissional do professor e a formação continuada; delineia os gastos com as escolas; descentraliza os recursos financeiros para a gestão escolar.
O artigo 3æda LDB “o ensino brasileiro será ministrado com base em princípios de igualdade de condições para o acesso e permanência que estão definidos com princípio da inclusão, da permanência e da avaliação formativa”.
Falar dos princípios de igualdade e de uma “educação para todos”, garantidas na lei, tanto divulgada e pouco realizada, gerou muita polêmica no contexto dos estudiosos, cito a perspectiva conceitual da Professora Carlinda Leite: "este discurso de igualdade de oportunidades para os efeitos que deveriam ser produzidos, isto significa que o sistema obrigar-se-ia a criar condições que positivamente interferissem no sucesso de todos os alunos e alunas utentes da instituição escolar”
O quesito permanência, este é um princípio bastante complexo, envolve todo o processo de escolarização e o de interferência externa à escolarização. Segundo Carneiro a permanência passa pelos “conteúdos e pelas metodologias de modo que haja uma contextualização com os programas escolares a fim de sejam instrumentos para a formação geral de uma cidadania moderna participativa”.
Diante disso a educação passa a ser vista com numa outra perspectiva conceitual, difícil de ser colocada em prática, pois o movimento “Educação para todos” detectou que não é possível prosseguir este tipo de educação que não trouxe para o mundo a paz e a coesão social esperada no século XXI.
E mais, a educação para este século, precisa saber tirar o melhor proveito das tradições humanísticas de todas as culturas, que para os analistas, é considerada como “os paradoxos da mundialização e da educação tradicional”. O relatório síntese chegou à conclusão que a mudança na educação só aconteceria de fato se todos aprofundassem nas causas que impedem ou que facilitam a instituição da “educação para todos” para a UNESCO:
"Quanto aos paradoxos mundiais podemos destacar; a) a intensificação do comércio internacional, surgimento de graves problemas em todo o mundo como, destruição do meio ambiente; deterioração da qualidade de vida de milhos de pessoas em todos os continentes, além do imenso fosso que separa os ricos dos pobres; b) o desenvolvimento exponencial dos conhecimentos científicos e tecnológicos, desequilíbrio de conhecimentos que induzem diversas áreas de conhecimento, como a modernização do norte para o sul, o crescimento demográfico em numerosas regiões do mundo, deterioração dos grandes centros urbanos, praticamente deixados ao abandono em numerosos países, engendraram graves prejuízos para o meio ambiente; c) apesar da crescente disponibilidade dos conhecimentos e instrumentos que permitam melhorar consideravelmente a qualidade de vida de toda a humanidade, tais instrumentos não têm sido aplicados, nem esses conhecimentos são ensinados com a preocupação de equidade. A exclusão digital é cumulativa, ela resulta da falta de acesso à eletricidade, a mecanização agrícola, ao telefone e a um grande número de tecnologias que não inventadas a cada momento: d) A forma atual da mundialização nunca antes na história da humanidade foi produzida tanta riqueza e nunca também ele engendrou tanta desigualdade, e) a mundialização ameaça impor, em escala planetária, a uniformidade cultural que, por sua vez, ameaça a diversidade das culturas podendo causar intolerância e a rejeição das outras culturas".
A descolonização de muitos países, que ocorreram nesse período, fez com que as instituições organizassem seus sistemas de educação e implantasse políticaspúblicas próprias para atender uma demanda emergente, fruto da democracia conquistada por muitos países.
Assim houve necessidade de organizar as legislações de muitos países, tendo em vista, a necessidade de instaurar a escolaridade obrigatória, para todos. A maior parte dos países possuia uma legislação que previa o caráter obrigatório do ensino fundamental ou educação básica.Segundo documento da UNESCO “essas leis obrigam os Estados e a comunidade internacional a redobrar esforços de modo que, a todos e a cada um, seja garantida a possibilidade de receber uma educação”.
Houve um grande avanço no decorrer das ultimas décadas do século XX, quanto à implantação de políticas educativas de compensação em países tão diferentes quanto, por exemplo, o Brasil, Uganda ou a França.
Sabemos que escolarização em si não resolve, precisávamos discutir também sobre o tempo dessa escolarização, pois há uma discussão bastante avançada sobre a escolarização com início desde a primeira infância, e garantir período de escolaridade mínima garantida para todos.
Do período das discussões sobre a “educação para todos” e a educação para “viver juntos” aos dias atuais podemos dizer que o Brasil ainda apresenta elevado índice de repetência e baixos índices de conclusão da educação básica, O relatório "Monitoramento de Educação para Todos 2010". Comparando com a região da América Latina e Caribe, a taxa de repetência média para todas as séries do ensino fundamental é de 4,4%, sendo que no o índice é de 18,7% --o maior de todos os países da região[1].
O Brasil, mesmo com esses indices, o pias, está no grupo de países intermediários em relação ao cumprimento de metas sobre acesso e qualidade de ensino, estabelecidos pela organização. O país ocupa a 88ª posição em um ranking de 128 países.
Apesar dos progressos e dos investimentos efetuados na qualidade da educação, na permanência e na aprendizagem, ainda assim, precisamos detectar o foco do problema da educação brasileira, a situação é grave, persistente e continua sendo preocupante em todas as regiões do mundo.
Será o currículo, os livros e a vida dos escolares, assim como à rigidez e ao reduzido impacto dos métodos tradicionais de ensino no novo contexto internacional, as causas da dificuldade de avançar na melhoria da educação oferecida aos brasileiros?
Pode ser que sim, porém não somente o currículo em si , mas o próprio conceito de educação, enquanto direito inalienável da pessoa, ocupa, de novo, uma posição central. As concepções utilitaristas de educação foram sendo substituí progressivamente por visões mais humanistas. Tomou-se consciência do fato de que a educação orientada unicamente para a participação na economia, ignorando os valores da solidariedade e da necessidade de integração, constitui, realmente, uma ameaça contra a própria economia.
E o currículo, este precisava rever os seus conteúdos científicos e optar pela renovação de suas antigas listas e grades curriculares defasadas e densas, que não estavam mais atendendo as necessidades desse mundo moderno exigindo novas formas de ensino que permitam o prosseguimento da aprendizagem ao longo da vida.
A preocupação com o futuro da humanidade é a educação, pois a esperança é de que ela pode e deve “fazer a diferença”. Dessa forma o foco do currículo deve estar centrado no desenvolvimento de habilidades e competências dos educadores e a melhoria das suas condições de trabalho.
Considerando o entendimento do relatório:
(...) nada conseguiremos se não procedermos, antes de tudo, a uma profunda reforma dos conteúdos, programas, métodos, estruturas e meios de ensino. Se houver progresso no plano do diálogo político, a fim de ser estabelecido um vínculo mais estreito entre o sistema educacional e as políticas de desenvolvimento, além de ser adotada uma pedagogia mais apropriada, será possível avançar também, aos poucos, em matéria de mobilização.
Para os pesquisadores da UNESCO superar o déficit da educação na área da aprendizagem do “viver juntos” é de fundamental importância para os povos e indivíduos assim, poderemos constituir uma sociedade sustentável, capaz de superar crises econômicas, sócias com solidez respaldada em perspectivas futuras de desenvolvimento.
É possível visualizar a complexidade das relações entre o sistema educacional e a sociedade, que pela lógica causando desconforto entre a reflexão e a ação educativa. Para tal, os pesquisadores consideram de fundamental significância considerar vários fatores tais como: [2]a criança quando vai para a escola, traz consigo saberes do senso comum que devem compor com os conhecimentos científicos produzidos pela escolarização; [3]incluir no currículo das escolas a perspectiva histórica na aprendizagem das ciências para compreender seu impacto; integrar á aprendizagem dos conhecimentos, valores, e normas[4]; adotar formas ativas de aprendizagem[5].
São muitos os desafios de uma “educação para todos” e de uma educação para “viver juntos”, manter esse paradigma numa perspectiva ampla de acesso, permanência, qualidade e igualdade parece ser utopia, mas os países membros da UNESCO estão envidando esforços para atingir de forma bem abrangente esses objetivos mundiais.
É sabido que romper ranços das antigas concepções de educação com foco na propositura de uma escolarização democrática não é uma ação para breve, precisamos de décadas para avançar nas políticas educacionais postas pelos sistemas de ensino estejam dialogando com a inclusão de todos independente de sua origem social, cultural e econômica, isso é uma recomendação para todos os países membros.
Referencias
Aprender a viver Juntos: será que fracassamos? Síntese das reflexões e das contribuições extraídas da 46ª Conferência Internacional da Educação da UNESCO, Genebra, Suíça, 5-8 de setembro de 2001.
Estamos construindo a Escola Democrática e de Qualidade que a sociedade precisa e deseja. Documento da Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso. Dante de Oliveira. Educação
Relatório da UNESCO diz que Brasil tem baixos índices na educação básica, Agência Brasil 19/01/2010 – Folha de São Paulo
[1] Professora Doutora em Educação, da Universidade do Proto, Portugal.
[2] Ex-professor de Organização da Educação Brasileira na UFPB e na UnB.
[3] Veiga Neto, 2003:110
[4] Documentos da Política Educacional
[5] Proposta do Governo
[1] Folha de São Paulo 19.1.2010
[2] (Trier, 2001)
[3] (Mittelstrass,2001)
[4] (Benavot,2002; Tiana,2002; e Mohus,2002)
[5] (Wiltshire, 2001)
Leia mais em: http://www.webartigos.com/artigos/a-educacao-e-direito-de-todos-como-aprender-a-viver-juntos/110593/#ixzz2aC3M2LLG
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