terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Por uma nova forma de ensinar


Idealizador da Escola da Ponte prega revolução no aprendizado e critica formação de professor no Brasil

O Educador português José Pacheco, ex-diretor da Escola da Ponte, onde não há provas nem divisão por séries: "É preciso uma ruptura, em busca de uma nova Escola"

Inovação. Alunos do Projeto Âncora, em Cotia (SP): não há turmas definidas, e o conteúdo é assimilado e compartilhado pelos estudantes entre si, no ambiente Escolar

Não existe um modelo padrão de Ensino. Cada Escola deve se organizar para atender a seus Alunos. Quem defende a ideia é o Educador José Pacheco que, por mais de 30 anos, dirigiu a inovadora Escola da Ponte, em Portugal, onde o aprendizado é pautado pela confiança entre estudante e Professor: não há salas de aula tradicionais, grade curricular ou provas. Os bons resultados da instituição dão a Pacheco autoridade para questionar o método de Ensino atual. Na era das redes sociais, ele defende o compartilhamento do conteúdo Escolar pelos Alunos, levando a uma construção coletiva do saber. O Educador também classifica como "miserável" a formação dos Professores no Brasil.

- Nada acontece de diferente quando a teoria antecede a prática. É preciso uma ruptura com os modelos convencionais, em busca de uma nova Escola, que se organize em torno dos valores que unem as pessoas atendidas. A Escola não é um edifício, mas um espaço social - comenta o português, que participará do Conecta, evento sobre novas tecnologias e Educação, que ocorre quarta e quinta-feira, no Rio.

Pacheco é um dos idealizadores da Escola da Ponte, na pequena Vila das Aves, a 30 quilômetros do Porto. Na instituição, os Alunos se agrupam de acordo com sua área de interesse. Não há divisão por séries. Monitorados por Professores, o estudante faz seu plano de metas baseado no conteúdo sugerido pelo Ministério da Educação. A metodologia ganhou fama global. Encantado, o escritor e Educador Rubem Alves escreveu trabalhos como "A Escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir" (2003). Cerca de cem instituições no Brasil mudaram para, de certa forma, seguir o exemplo.

O próprio Pacheco está envolvido numa iniciativa que segue essas premissas, em Cotia (SP). Com 440 Alunos, cujas famílias têm rendas de até três salários mínimos, o Projeto Âncora serve ao Pré-Escolar e ao Ensino fundamental, sem turmas definidas. O aprendizado se dá conforme o interesse dos Alunos, que assimilam o conteúdo e o compartilham no ambiente Escolar.

- É um trabalho de formiguinha. Na implantação do projeto, rejeitamos tudo que não interessa. Aulas e séries são um obstáculo para o crescimento humano - diz ele.

Os resultados, segundo Pacheco, são animadores. Alunos marcados pela exclusão recebem atenção que nunca tiveram. Em seis meses, crianças analfabetas aprenderam a ler, e os Professores embarcaram na novidade.

Mas o Educador se mostra preocupado com o quadro geral do Ensino no Brasil e no mundo. Na opinião dele, os métodos em voga estão obsoletos desde o fim do século XIX.



- Basta dizer que, no Brasil, esse tipo de Educação dá origem a 24 milhões de Analfabetos funcionais. Não adianta ser a sexta economia do mundo, quando se ocupa os últimos lugares em rankings de Educação - critica Pacheco, para quem o despreparo das Escolas fica latente diante de questões atuais como o bullying. - Muitas Escolas suspendem ou expulsam Alunos, instalam câmeras de segurança. Deveriam ser adotadas novas formas de diálogo.

Para resolver esse problema, diz ele, é essencial investir na formação de Educadores:

- A formação de Professores no Brasil, não hesito em dizer, é miserável. Parte de princípios errados, como aquele de que a teoria pode anteceder a prática. Não adianta colocar jovens na faculdade e enchê-los com teorias ultrapassadas. Eles perpetuarão esse modelo.

Pacheco diz que a renovação deve englobar a forma como as recentes tecnologias são aplicadas no Ensino. Em tempo de redes sociais, não basta apenas introduzir computadores e mudar o velho quadro-negro pelo monitor digital.

- Mesmo nos EUA e na Europa, o modelo convencional de Educação continua. As novas tecnologias contribuem para a mesmice, quando deveriam proporcionar o compartilhamento de conteúdo entre os Alunos. Se as Escolas entenderem isso, podem migrar de um modelo em que os estudantes são como papagaios repetindo a lição para um ambiente onde ocorra, de fato, a construção do saber - diz o Educador. - Os jovens precisam ser incentivados a reconstruir uma sociedade doente e usar as tecnologias para fazer isso criticamente. Noto que essas ferramentas contribuem para que os Alunos se tornem solitários. Isso é uma regressão.

Evento debaterá uso de tecnologias de forma crítica

Quando o assunto é tecnologia na Educação brasileira, os desafios são inúmeros. Boa parte deles estará em pauta quarta e quinta-feira, na segunda edição do Conecta, realizado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), no Centro de Convenções SulAmérica. Haverá palestras, oficinas e uma exposição com o que há de mais moderno em equipamentos para o Ensino.

- Queremos mobilizar os Educadores para o uso desses meios de forma crítica. A sociedade está mudando, e a tecnologia está diretamente envolvida nisso, influenciando o comportamento das pessoas e vice-versa. A Escola não pode ficar de fora, para não ser atropelada - explica o assessor de tecnologias educacionais do Sistema Firjan, Bruno Souza Gomes.

Segundo ele, um dos maiores imbróglios é a baixa qualidade da conexão de internet. A discussão terá destaque na programação, com a divulgação do relatório "Horizon Report", resultado de três meses de pesquisas feitas por 30 especialistas em tecnologia e Educação do Brasil.

O documento, diz Gomes, mostra, entre outros tópicos, como o serviço disponível no país está distante do praticado no restante do mundo. Segundo ele, de nada adianta o investimento em equipamentos de última geração se o Aluno não consegue acessar o conteúdo digital.

- Essa discussão tem que ser uma pauta efetiva do governo - avalia ele.

A pesquisa, de acordo com o especialista, também aponta a urgência de uma readequação do currículo Escolar em função dos novos meios. Ou seja, o Ensino contemporâneo precisa ser pensado também em função das possibilidades oferecidas. Parte dessa constatação se justifica pela demanda de mobilidade apresentada pelas novas gerações de Alunos.

- Os jovens querem aprender em qualquer lugar e momento. A tecnologia quebra a barreira da sala como único local de Ensino. Isso envolve todas as classes sociais.

Para uma visualização precisa da utilização desses instrumentos, o evento promove também a Expo Conecta: seis espaços vão mostrar instrumentos de alta tecnologia que podem ser introduzidos em Escolas de Ensino fundamental e profissionalizante. Entre os aparelhos que merecem destaque, está a caverna digital, espécie de cubo formado por telas que projetam ambientes, como uma plataforma de petróleo, a turbina de um avião e até o sistema solar.

O Conecta começa às 10h de quarta. Entre os palestrantes, há representantes de universidades, Escolas e organizações sem fins lucrativos, além de jornalistas. A palestra do Educador português José Pacheco, idealizador da Escola da Ponte, acontece às 9h de quinta-feira.

Fonte: O Globo (RJ) 19/11/2012

Aumento de crianças com necessidades especiais na rede pública expõe carências e preconceitos


Segundo pedagoga, não basta apenas a matrícula para incluir esse grupo na escola, o sistema precisa se preparar melhor para acolher essas crianças com mais qualidade

De 2003 para 2011, o número de alunos com deficiência ou doenças crônicas, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação cresceu 164%. Segundo o Ministério da Educação, em 2003, 28% dos alunos que precisavam da educação especial estudavam em classes comuns e o restante, em classes especiais. Em 2007, o percentual desses alunos incluídos nas classes regulares passou para 54% e, no ano passado, para 74%, com 752 mil estudantes inscritos.

O número de escolas de educação básica com matrículas de estudantes que precisavam da educação especial cresceu 615%. Para pedagogos e especialistas, o aumento reflete a maior inclusão de grande parte desse grupo no ambiente escolar. Antes, esses estudantes viviam confinados em casa ou em escolas especiais. A chegada desses alunos na rede pública também revela as carências e preconceitos de quem lida com esse público.

A pedagoga Glória Fonseca Pinto trabalha com crianças e adolescentes com doenças crônicas e deficientes há mais de dez anos no Rio de Janeiro. Segundo ela, para incluir esse grupo na escola não basta apenas a matrícula. “O sistema precisa se preparar melhor para acolher essas crianças com mais qualidade. As escolas precisam entender que precisam se adaptar a essas crianças e não o contrário. Existem muitos exemplos [bem-sucedidos] de crianças com comprometimentos que conseguem se formar e ganhar muita independência”.

Ela lamentou o fato de diversas escolas ainda recusarem esse estudantes. “A criança especial pode e deve frequentar uma escola regular, mas infelizmente não é toda a escola que a aceita por não ter currículo, [não dispor de] rampa e de material humano. Mas não existe receita de bolo e as escolas precisam se predispor a aceitar essas crianças”.

No Rio de Janeiro, em um ano, esse grupo de estudantes aumentou 15% na rede estadual, de acordo com a Secretaria Estadual de Educação (Seeduc), com 3 mil alunos da educação especial no universo de 1 milhão de inscritos na rede estadual.

Para a professora Márcia Madureira, da equipe da Coordenação de Inclusão Educacional da Seeduc, o incremento na entrada dessas crianças e adolescente reflete um movimento de inclusão por parte da rede de ensino, mas traz enormes desafios. “O aumento do fluxo é um bom sinal e são muitos os desafios, mas estamos tentando ampliar os serviços para atender a essa demanda, como transformar todas as escolas acessíveis para cadeirantes”.

Segundo a Secretaria Estadual de Educação, 3.564 alunos com deficiência ou doenças crônicas foram inscritos na rede estadual de ensino no 1º semestre de 2012. São aproximadamente 200 Salas de Recursos que oferecem Atendimento Educacional Especializado (AEE) aos alunos com necessidades especiais e cerca de 150 profissionais atuam nestas salas.

Para a coordenadora do Núcleo de Apoio a Projetos Educacionais e Culturais, do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), Magdalena Oliveira, as escolas do país não estão estruturadas para receber as crianças e adolescentes com deficiência. “Com cerca de 40 alunos, é óbvio que a professora não terá estrutura para atender essa criança com deficiência. Uma escola capaz de receber uma criança com deficiências deveria ter uma fisioterapeuta motora, uma fisioterapeuta respiratória, uma fonoaudióloga, uma psicomotricista, uma terapeuta ocupacional, além de um psicólogo para poder dar apoio ao corpo docente e às crianças”.

Magdalena ressaltou que a exclusão dessas crianças e adolescentes do ambiente escolar prejudica seu desenvolvimento, pois ficam isoladas do convívio social. “A escola é o único lugar onde a gente começa a vida tendo que dar conta de ter que conviver com os amigos, aguentar a pressão dos professores e dos amigos. Isso dá para a criança uma independência e uma maturidade emocional que a gente enquanto mãe não consegue dar”. A pedagoga lembrou que a convivência das outras crianças com esse grupo também é frutífera, pois fortalece o respeito às diferenças.

Educadora diz que pais devem denunciar escolas que não aceitam alunos especiais

A diretora do Instituto Municipal Helena Antipoff, Kátia Nunes, responsável pela educação especial na cidade do Rio, disse que os pais devem denunciar nas Secretaria de Educação as escolas que não aceitarem o filho deficiente ou com doença crônica. “Se a escola não estiver preparada para esse aluno, nós vamos prepará-la. Mas a escola hoje precisa entender que ela deve se adaptar às necessidades da criança e não o contrário”.

Na prefeitura o professor, ao assumir uma turma, recebe um DVD multimídia com orientações sobre como melhor atender uma pessoa com deficiência e informando que a prefeitura oferece cursos específicos durante todo o ano. “Também temos salas de recursos multifuncionais com mais de 300 professores especialistas para dar suporte a esses alunos com deficiência”.

Segundo a educadora, não existem cursos específicos para crianças com doenças crônica, mas sim para pessoas com deficiência. “Damos acompanhamento, suporte pedagógico, mas [no que diz respeito às] questões mais fundamentais da saúde solicitamos que o pessoal da saúde caminhe junto com a gente”. Ela admitiu que faltam professores, mas informou que a prefeitura está investindo na formação de novos profissionais para sanar o problema.

A professora Márcia Madureira, da equipe de Coordenação de Inclusão Educacional da secretaria do estado do Rio, admite que faltam estrutura e mão de obra qualificada para receber esses alunos, mas que o preconceito é uma das principais barreiras para a inclusão efetiva das crianças e adolescentes com doenças crônicas e deficiências.

“O diferente sempre causa estranheza e tratar dessas questões no ambiente escolar é fundamental para acabar com preconceitos, por meio do conhecimento, e permitir que esse aluno possa participar do espaço da escola e não apenas estar nele”.

Para a representante da Secretaria Estadual de Educação os desafios são contínuos, mas a sociedade está evoluindo no caminho da inclusão. “E nós [governo] temos que encarar esses desafios e dar o suporte necessário e estamos trabalhando nisso”.

Para a professora municipal Karla Silva da Cunha Bastos, que trabalha com educação especial há nove anos, a sociedade e os governos passaram a enxergar essas crianças, que hoje têm alguns direitos garantidos, mas o desconhecimento e despreparo ainda são grandes.

“Em uma turma com 40 alunos, com tantas crianças, com tantos outros problemas sociais e mesmo patológicos, o crônico acaba dando medo. O aluno chega na aula com um balão de oxigênio, por exemplo, e o professor não sabe o que fazer. As pessoas ficam com medo de acontecer alguma coisa com a criança e elas serem culpabilizadas”.

A professora citou o caso de uma aluna com doença congênita na bexiga que precisava ir ao banheiro com frequência e, toda vez que chegava um professor novo ela precisava explicar sua condição. “Em outro caso, o aluno não podia fazer atividades físicas e o professor o chamava de preguiçoso e ameaçava dar nota baixa. Nossa formação seja no curso normal ou na faculdade não nos prepara para a realidade social que vivemos hoje”.

Karla acredita que é preciso um trabalho de conscientização sobre as especificidades das crianças com doenças crônicas. “Desde o professor, ao servente, à merendeira. Quando a criança com doença congênita se matricular, a escola precisa receber informação sobre essa doença e orientações”.

Algumas escolas ainda recusam crianças com deficiência ou doença crônica

Embora a lei exija que todas as escolas brasileiras aceitem e incluam crianças e adolescentes com deficiência e doenças crônicas, ainda existem instituições que se dizem inaptas para isso. Em muitos casos, por falta de estrutura e de informação da escola, quando o aluno é aceito acaba não tendo a atenção devida e o responsável pelo estudante precisa frequentar a escola para cuidar dele.

É o caso da menina Giovana de Oliveira Corrêa, 6 anos, que tem síndrome de Kabuki, uma desordem congênita rara, que causa déficit intelectual e problemas físicos. A mãe da menina, Evanilda Aprígio de Oliveira, ficava com ela na escola, mas conseguiu um emprego e agora paga a uma sobrinha para cuidar de Giovana.

“Por ela ser cadeirante, não consegui [vaga] na escola particular. Consegui na pública com facilidade, mas a dificuldade existe dentro da escola, pois eles não têm preparação, professora de apoio, espaço para cadeirante passar, rampa. Há boa vontade, mas falta estrutura”.

A pedagoga Magdalena Oliveira, do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) diz que o caso de Giovana não é exceção. Ela coordena vários projetos de educação para crianças e adolescentes com doenças crônicas e deficiência e argumenta que a educação inclusiva está longe de ser alcançada no Brasil.

“Se você entrevistar as mães que trazem seus filhos aqui, ouvirá da maioria que eles não são aceitos nas escolas. Quando são, elas têm que ficar junto com a criança ou o adolescente e o tempo [de aula] é limitado, não é o tempo regular da escola”.

Magdalena citou o caso de um rapaz de 21 anos, com encefalopatia não progressiva (com déficit cognitivo sério) que nunca foi aceito na escola, apesar das numerosas tentativas da mãe. “Ela ainda tem esperança de ver o filho na escola. A deficiência não o impede de ter um convívio com outras [pessoas], de aprender algumas coisas, dentro das limitações dele”.

A pedagoga também contou sobre um menino de 8 anos que nasceu sem a parte inferior dos braços que não foi aceito na escola perto de casa. “Ele não tem nenhum tipo de déficit cognitivo, mas disseram para a mãe que ele deveria ir para uma escola especial”.

Atendimento educacional durante a internação facilita volta da criança à escola, diz professora

No Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), a parceria com a rede de ensino municipal completou um ano em agosto e permite que crianças e adolescentes internados no instituto tenham aulas diariamente. A média é dez crianças internadas, algumas há mais de um ano.

A professora municipal Karla Silva da Cunha Bastos, que trabalha com educação especial há nove anos e está no projeto do IFF desde o início da parceria com o governo municipal, acha que o atendimento pedagógico-educacional no hospital facilita a volta das crianças à escola sem prejuízo e ainda minimiza o isolamento social.

“A internação não atrapalha as aulas, e ainda ajudam na recuperação: a criança tem menos tempo de parar e sofrer, de se deprimir com o ambiente de quietude, injeção, enfermeira, remédio. Então é um momento mais lúdico”, observa a professora.

Aluno de Karla, Matheus Henrique da Silva Machado, de 12 anos, tem fibrose cística, doença genética que afeta uma em cada 10 mil crianças brasileiras e ataca os pulmões e o pâncreas.

“Gosto da aula aqui. É só para mim, não há milhões de alunos. Ela [a professora] pega no pé às vezes, mas eu gosto”, contou o menino que, após 29 dias internado, recebeu alta durante a entrevista.

Juliana Ramos da Silva, mãe de Mateus, notou que o filho avançou muito nas matérias escolares com a classe hospitalar.

“Meu filho passa mais tempo internado do que na escola. Quando ele volta para a escola já consegue acompanhar os amigos. Antes, quando ainda não tinha classe hospitalar, ele ficou internado uma vez, por três meses e, quando voltou ficou perdido e nem queria mais ir à aula”.

Rosângela Alvares dos Santos é mãe de Samuel, de um ano e seis meses, internado no IFF desde que nasceu com um problema respiratório crônico. “Depois que Karla chegou, ele se desenvolveu. Até mostrar a língua ele aprendeu com ela e já está comendo por conta própria. Acho interessante, pois é um estímulo diferente”.

Algumas doenças crônicas, como a fibrose cística, exigem cuidado especial para evitar infecções. São necessárias aulas individuais. Além de Karla, o instituto conta com uma professora no turno da tarde. As duas se desdobram para atender uma média de 30 alunos por mês, com idades e necessidades de aprendizado diferentes. “A gente faz das tripas coração, mas amo o que faço, dá muito prazer”.

Kátia Nunes, diretora do Instituto Municipal Helena Antipoff, responsável pela educação especial na cidade do Rio, explicou que não faltam professores interessados em trabalhar nos hospitais, mas que a especialização dessa mão de obra ainda é um desafio.

“Precisamos formar mais gente. Estamos investindo nessa formação. Se a criança está impedida de ir à escola, temos que levar a escola até eles. E constatamos, por meio de pesquisas, que a escola ajuda recuperação da saúde da criança hospitalizada”.

Maioria de crianças e adolescentes internados não tem acesso a aulas nos hospitais

Desde 1995, a legislação brasileira reconhece o direito de crianças e adolescentes hospitalizados ao acompanhamento pedagógico-educacional. É obrigação dos sistemas de ensino e de saúde municipais e estaduais organizar o atendimento educacional especializado para estudantes impossibilitados de frequentar as aulas por motivos de saúde.

De acordo com profissionais da área, passados 18 anos, a classe hospitalar - nome da modalidade de ensino que possibilita esse aprendizado nos hospitais - ainda não se tornou realidade para a maioria das crianças e adolescentes com doenças crônicas.

Para a coordenadora do Núcleo de Apoio a Projetos Educacionais e Culturais, do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), Magdalena Oliveira, a classe hospitalar ainda “engatinha” no Brasil, sobretudo no preparo dos professores.

“A rede hoje precisa de uma estrutura mais ampla para atender essas crianças de forma mais integral. Falta tempo para o professor estudar. A grande maioria dos cursos é paga e a classe é absolutamente discriminada, com um dos piores salários do país. Faltam professores para dar uma atenção diferenciada a essas crianças e adolescentes,” disse.

Na capital fluminense, dez hospitais contam com o apoio de professoras municipais, resultado de parcerias da prefeitura com as instituições de saúde.

O governo do estado do Rio informou que ainda não oferece classe hospitalar, mas que o projeto está sendo discutido na secretaria de Educação.

O Ministério da Educação não soube informar o número de hospitais no país que oferecem classe escola. Por meio de nota informou apenas que o atendimento em classes hospitalares é ação intersetorial organizada entre as secretarias de Educação e Saúde de cada estado ou município, conforme demanda existente

Dados do Censo 2010 mostram que o Brasil tem hoje mais de 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência: quase um quarto do total da população. Não existem dados específicos sobre doenças crônicas, de acordo com médicos da área.

Fonte: Agência Brasil 18/112012

Mais horas-aula para português e matemática


Proposta é ter ainda uma matriz curricular unificada para que as escolas, hoje autônomas nesse assunto, possam terminar o ano letivo sem distorções de horas dedicadas às disciplinas

Uma proposta de matriz curricular de referência para a Educação básica, elaborada pela Secretaria de Estado da Educação (Seed), está sendo analisada e pode ser implantada nas Escolas em 2013. Embora as diretrizes curriculares que discorrem sobre o conteúdo que deve ser ministrado a cada ano letivo sejam bem claras, as Escolas têm autonomia para montar suas grades curriculares, o que pode gerar algumas distorções, como excesso de aulas em uma disciplina e escassez em outras. A medida prevê ainda um aumento na quantidade de aulas semanais de português e matemática.

De acordo com o órgão, o Paraná tem 2,2 mil Escolas e 2,1 mil matrizes curriculares, o que dificulta o trabalho da secretaria. Com uma matriz unificada, a intenção da Seed é priorizar as disciplinas que são a base para outras e nortear melhor o trabalho pedagógico. Além disso, português e matemática são as matérias-chave em avaliações de grande porte, como o Índice de Desenvolvimento da Educação básica (Ideb) e o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa).

Segundo a superintendente da Educação, Meroujy Cavet, uma série de questões levaram a Seed a fazer a proposta, entre elas a qualidade do aprendizado. “Ao final da Educação básica, o Aluno deve conhecer bem sua língua mãe, escrever um bom texto e estimular o espírito de investigação com a matemática”, explica.

Para aumentar o número de horas dessas disciplinas, outras foram sacrificadas: em alguns anos do Ensino fundamental, há redução no número de aulas de artes e Ensino religioso. Por outro lado, para poder acomodar uma grade mais robusta, o Ensino médio teve sua carga horária semanal aumentada de 25 para 27 horas semanais. Com isso, não haverá prejuízo nas disciplinas de sociologia e filosofia, que fazem parte da base nacional comum de disciplinas. A proposta de matriz curricular foi apresentada para a APP-Sindicato, que representa os profissionais da Educação, e o Conselho Estadual de Educação. Agora, as modificações serão discutidas com Escolas e municípios, para saber se existe a possibilidade de fazer a alteração para 2013. Segundo a Seed, a ideia é fazer um amplo debate para só então implantar o sistema.

O Professor da Universidade Tuiuti Joe Garcia, doutor em Educação, lembra que, historicamente, o Brasil já passou por uma série de alterações curriculares. A disciplina de Educação Moral e Cívica, por exemplo, já foi obrigatória. “Currículos Escolares sempre mudam por necessidades sociais, visões de mundo, razões de conhecimento”, pondera.

Mudança não é garantia de Ensino melhor

O aumento da carga horária de disciplinas como matemática e português não é garantia de melhoria na qualidade de Ensino. Para especialistas, é preciso fazer uma análise conjuntural detalhada antes de tomar qualquer decisão.

A Professora doutora da Universidade Federal do Paraná Monica Ribeiro da Silva, pesquisadora na área de Educação básica e Ensino médio, diz que a redução da carga horária de outras disciplinas para priorizar matemática e português é equivocada e está na contramão das novas Diretrizes Curriculares Nacionais aprovadas recentemente. “Essas novas diretrizes propõem que se atribua novos sentidos à Escola, por meio do reconhecimento da diversidade de interesses dos adolescentes, da Escola como espaço de formação privilegiado que ultrapassa o treino na provas, pela integração entre campos disciplinares como forma de atribuir significados mais profundos ao que é ensinado”, explica.

A relação entre carga horária e o desempenho dos estudantes em testes como o Ideb também é questionada. O doutor em Educação Joe Garcia, Professor da Universidade Tuiuti, lembra que, no começo da década, os brasileiros tinham um desempenho muito fraco em matemática no Pisa, mas que foram recuperando terreno e terminaram a década com resultados melhores. “Não foi o aumento da carga horária que mudou esse quadro, foram as novas metodologias de Ensino que foram introduzidas, como era feito no exterior”, afirma.

Mão de obra

Novo formato exige a contratação de mais Professores

As possíveis mudanças na matriz curricular do Paraná também remetem a um problema antigo: a falta de Professores. De acordo com a superintendente da Educação, Meroujy Cavet, a decisão de propor a mudança no currículo só foi tomada depois da confirmação de realização de um novo concurso público. Nesta semana, deve ser lançado o edital para contratação de 13 mil profissionais em todo o estado, com vagas para todas as disciplinas, não apenas português ou matemática.

A secretaria deve diminuir o número de profissionais contratados pelo Processo Seletivo Simplificado (PSS), que ainda será mantido, por conta da necessidade de afastamento de Professores por causa de licenças ou aposentadorias. Para essa prova, a Secretaria de Estado da Educação (Seed) está propondo a realização de um teste objetivo, de uma redação e de uma prova prática, para selecionar profissionais bem qualificados.

Fonte: Gazeta do Povo (PR) 19/11/2012

Mercantilização do ensino universitário, onde chegaremos?


Reginaldo Gonçalves



As mudanças contínuas no ensino estão, cada vez mais, evidenciando o canibalismo que o sistema de mercantilização no mercado educacional está trazendo para o Brasil. Isso está provocando reflexos que, no futuro, deverão demonstrar que as alternativas poderão reduzir, de modo consistente, o conhecimento e a busca por melhoria da informação.

A situação do ensino fundamental e médio nas escolas públicas demonstra que os alunos estão cada vez mais despreparados para cursar uma faculdade. Porém, por pressão deste mercado canibal, que transforma a educação em mercadoria, esses alunos acabam entrando em um curso superior, mas, por despreparados que estão, infelizmente não são capazes de acompanhar o ritmo, sendo obrigados, muitas vezes, a trancar a matrícula e desistir de seus sonhos.

Um dos aspectos deste cenário está nas ações do governo federal, com a concessão de bolsas de ensino parciais ou integrais. Deste modo, permite-se que um número cada vez maior de pessoas tenha acesso ao ensino universitário. Isso apenas engrossa as estatísticas oficiais, mostrando um Brasil onde os níveis de analfabetismo vêm diminuindo. Por outro lado, as instituições educacionais privadas, que oferecem bolsas de estudo, seguem um caminho de massificação do ensino para garantir o retorno desejado a seus acionistas. Hoje, a busca do aluno não é mais pelo ensino ministrado, mas, por uma mercadoria que se compra como se fosse um produto exposto no supermercado.

Transformar a educação em produto e o aluno em cliente prejudica a todos os envolvidos no sistema de ensino, sejam alunos, professores ou funcionários administrativos. O desrespeito é significativo. As contradições provocadas por esse sistema, por um lado aumentam o número de alunos por sala de aula e, por outro, reduzem os salários dos docentes, além de provocar a falta de investimentos em todo complexo educacional, em virtude da redução maciça dos gastos, principalmente os fixos. A baixa remuneração dos docentes e a falta de investimentos acabam fazendo do curso universitário – que é uma extensão do ensino fundamental e médio – seu desmantelado. O resultado é que o aluno não conseguirá atingir seus objetivos pessoais e de carreira em um patamar de qualidade que faça com as empresas o contratem.

No início de cada novo período letivo chegam notícias sobre a venda de alguma instituição de ensino que, em virtude das pressões de mercado, acaba cedendo e encerrando suas atividades. Recentemente a Fundação Escola Armando Álvares Penteado (Fecap), instituição paulistana com 110 anos de existência, teve os holofotes direcionados para seus negócios. Uma das instituições mais respeitadas do País foi notícia quando os alunos da graduação manifestaram a insatisfação com a provável venda da faculdade para o Grupo Ânima, conglomerado mineiro que já administra outras instituições de ensino, como o Centro Universitário UNA e a UniBH, ambas em Minas Gerais, e a Unimonte, em Santos (SP).

É fato que se a aquisição for concluída, mudanças ocorrerão em toda a estrutura da Fecap, pois são filosofias diferentes. Porém, esta é a primeira vez que alunos demonstram a insatisfação com a possibilidade da queda no nível educacional, algo que fez da Fecap uma instituição respeitada. Nas aquisições que ocorreram no passado, jamais houve qualquer manifestação desse tipo, mas, em geral, pela possível falta de docentes, em virtude do aumento no número de alunos matriculados. Talvez essas críticas contribuam para mudar o tom da conversa e fazer com que outras instituições de mesmo perfilpossam abarcar novos alunos, buscando o melhor nível de excelência. Se a manifestação dos alunos persistir, a instituição que assumir a Fecap poderá ter que rever seu planejamento, ou na pior das hipóteses eliminar dos livros 110 anos de respeito e tradição.

A mercantilização, sem um controle mais efetivo, pode se agravar, trazendo danos irreversíveis ao ensino. É preciso ter em perspectiva que a redução de custos em excesso destrói o alicerce de qualquer instituição. E que o ensino não é mercadoria enlatada, assim como o aluno não é cliente. Ao contrário, os jovens universitários buscam melhorar sua capacitação principalmente para atender a demanda das empresas. Estas, por sua vez, necessitam colocar em seus postos de trabalho profissionais que saibam tomar decisões de modo sensato e responsável, a fim de preservar a sustentabilidade e seus negócios.


Reginaldo Gonçalves
relmarsp@uol.com.br
 Coordenador de Ciências Contábeis da FASM (Faculdade Santa Marcelina).

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Historiador de MT desvenda mistérios e teses sobre a Guerra do Paraguai


Da Redação - Priscilla Vilela

Uma das principais teses a respeito do conflito alega que o imperialismo inglês foi o responsável pela guerra. Teríamos sido bonecos manipulados pela grande potência britânica. Repetida cansativamente a ideia dos maquiavélicos ingleses e dos inocentes latino-americanos parecia uma verdade indiscutível. Mas não é.

Teté Bezerra defende transformar setor de turismo em carro chefe da economia de Mato Grosso

O livro A Guerra é Nossa mostra, por outro ângulo, quais, afinal, foram os motivos que desencadearam os combates. Para isso, se buscou dados e informações documentais que revelam, de modo incontestável, que os desentendimentos internos dos quatro países envolvidos, explicam as motivações locais do conflito. Confira.

Pesquisas foram feitas na enorme quantidade de despachos diplomáticos dos representantes ingleses em Buenos Aires e Montevidéu para Londres e de lá para eles.

Dois capítulos tratam dessas importantes informações. Se tem também pesquisas no Arquivo Histórico do Itamaraty, nos Anais do Senado e da Câmara dos Deputados e da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul e ainda em jornais e documentos publicados do Uruguia e do Paraguai.

O livro aventa uma hipótese, em capítulo específico, sobre os motivos que teriam levado a região a acreditar que os ingleses provocaram a Guerra do Paraguai.

O livro já está nas livrarias em Cuiabá ou pode ser adquirido diretamente na Editora Contexto através do seu sistema de compra online (www.editoracontexto.com.br). Alfredo da Mota Menezes é mato-grossense de Poxóreo, historiador e doutor em História da América Latina.


As informações são da assessoria

“Gigantes de aço”, agressividade entre pai e filho


Erika de Souza Bueno


Quais os malefícios que os jogos violentos de videogame deixam na vida de uma criança? Por que não se pode tolerar que uma criança se envolva em um ambiente de luta, combates e ódio? O que pode acontecer a um menino que se empolga com a adrenalina ao se deliciar em cenas de violência explícita trazidas pelos jogos?

No filme “Gigantes de Aço”, Dakota Goyo dá vida a Max, um menino completamente envolvido pelos jogos de videogame. Max é o filho rejeitado de Charlie, personagem vivido por Hugh Jackman, responsável pela revolta que pode acometer qualquer família que almeja o melhor para seus filhos.

O menino protagoniza cenas que fazem o coração saltar ainda mais forte ao falar abertamente com seu pai, como se este estivesse em uma condição igual à dele. Não está. Charlie já viveu muito mais tempo que Max, já está cheio de marcas de uma vida de insucessos, que o deixam amargo e com pouquíssimos meios para contribuir de algum modo com o único filho.

Ao descer do carro de seus tios rumo ao encontro de seu pai, o menino Max já nos dá mostras de sua personalidade, pois interroga Charlie sobre o valor pelo qual fora vendido. O pai do garoto não viu nenhum problema em precificar a guarda do menino, deixando-a aos tios de Max. Não identificou nenhum “porém” em utilizar o dinheiro para adquirir mais um robô lutador.

De modo semelhante, também não levou em consideração o fato de que Max tinha acabado de perder sua mãe. Tampouco, Charlie não fez muita questão em dar a resposta que o filho queria, ou seja, o valor com que fora vendido. No decorrer do filme, incontáveis vezes somos surpreendidos pelo lado inconsequente de Charlie em relação ao menino.

Isso revolta. Porém, mais uma vez, o cinema nos dá recursos de abordagens em sala de aula, principalmente quando estamos em algum trabalho com a família de nossos alunos. No filme, o final é feliz, se é que podemos chamar assim um final que tem uma criança envolvida em cenas de tamanha agressividade. Contudo, na vida real, o final pode ser tenebroso, brutal, trágico e cruel.

O fato de os combates se darem entre robôs não colabora, de modo algum, para a diminuição da carga de violência. Enquanto as “latas” se amassam durante os numerosos combates que aparecem no filme, o caráter cruel e impiedoso das pessoas que os controlam aparece claramente.

Max, um menino de apenas 11 anos, não apenas presencia tudo isso, mas ele é participante ativo e responsável por levar o filme a um desfecho “feliz”. A comemoração, o olhar de carinho e cumplicidade entre um dos robôs e o menino, o abraço entre pai e filho...

Bom, nada disso parece compensar a angústia de termos visto uma criança desamparada pelo pai, acompanhando-o a tantos lugares inadequados à idade e aos direitos que deveriam ser assegurados a ela. Claro que esse desamparo foi aparentemente vencido, mas é só isso, tudo parece muito vago, sem bases sólidas e prematuro.

Como todo bom filme, “Gigantes de Aço” é capaz de nos deixar revoltados, ansiosos e com o desejo intenso de fazer mais pelas crianças com as quais hoje temos contato. Com nossos alunos, o filme é uma grande oportunidade de trabalho com a família de cada um deles.


Erika de Souza Bueno
bueno.erikasouza@gmail.com
Professora de Língua Portuguesa e Espanhol pela Universidade Metodista de São Paulo. Articulista sobre assuntos de língua portuguesa, sociedade e família.

Um pouco mais de paz


Eder Roberto Dias


Estamos diante de um caos que impregna a calma de nosso melhor sentir! Deixamos de acreditar, de participar e de nos fazer felizes, pois aceitamos com muita facilidade os incômodos que absorvem a fonte natural de nossa calma. Ouvimos buzinas, gritos, dor, agitação, afobação e, no meio de tudo isso, aplicamos um esquecimento lacônico de nossa percepção de felicidade. Respiramos tão somente o pó de nossas conquistas que se entrelaçam com todas as dificuldades que nos adoecem e tomam nosso tempo e jovialidade. Estamos envelhecidos, ultrapassados e compulsori-amente desfocados da beleza que há em viver nossas etapas. Tememos a sombra que nos alcança e sequestra de nós as virtudes de conhecer aos estranhos que e comportam indiferentes com o que acontece ao seu lado. Podemos dizer que somos sofisticados, práticos, atuantes e muito informados, mas até onde estamos realmente evidenciando a busca por nossa paz? As semanas correm e escorem por entre nossos dedos (...), dormimos e se quer temos tempo para sonhar com objetivos que não sejam o dinheiro de cada mês. E, com ele, as vultosas contas de nosso cartão de crédito que consomem o suor de nosso ir e vir de um trabalho que mais nos parece ser a nossa casa. Enquanto que a nossa casa serve apenas e deposito de nosso cansaço. Buscamos culpados para tudo que não conseguimos sentir! Inviabilizamos sorrisos, pois tudo que conseguimos ver nos trás medo e muito temor. Tenho que fazer um seguro para meu carro; tenho de ter cuidado ao sair à rua; não posso passar tranquilamente por essa rua que escura pode me surpreender com um assalto. E, assim, se vão os meses, os anos e todos os desejos que são apagados de nossa mente que nos mente. Devemos ter mais direitos que deveres, podemos nos sentir felizes sem nos sentir culpados de fugir da mecânica que absorve a nossa engren agem em ferrugem e empenamento. Somos seres humanos que precisamos de entendimento, luz e realização. Não o consumo de coisas materiais, mas as espirituais que nos aproximem uns dos outros. Onde a igualdade de respeito não nos faça surpreender a nós mesmos! A gentileza é uma atitude de amparo diante do desamparo que estamos vivendo. A educação é uma virtude que não pode ser abandonada por uma associação de modismos que empregam a falta de educação como algo natural do crescimento populacional. Falamos de paz, porém caminhamos em uma contra mão de valores e conhecimento. Estamos diante de um caos que invade nossas janelas, nossas portas e camas. Deixamos de amar com intensidade e verdade, pois o normal agora é a falta de comprometimento com os sentimentos. Não sei ao certo por onde andam os sentimentos, nem sei se estes novos habitantes terrenos sabem o valor do princípio de respeitar. Consomem a vida como um cigarro que queima por sobre um cinzeiro. Para depois, um dia, se transformarem em velhos que desconhecem o conhecimento de todo bem que não viveram.

Um pouco mais de paz... aonde ela possa existir e, caso ela já tenha morrido, que renasça de nossos sentimentos, desejos e sonhos, pois em nosso amanhã a cobrança por um momento de paz será grande. E, antes que ela seja dizimada por nossa pressa, devemos ensinar aos que não a conhecem a encontrarem a si mesmos em sua mais exclusiva paz.

Eder Roberto Dias
ederoamorsemprevence@bol.com.br
Escritor, poeta, palestrante e autor do livro: O amor sempre vence... Editora Gente.

Educação: uma questão de prioridade


Leticia Bechara


O novo secretário da educação de São Paulo divulgou nesta terça-feira (4) que planeja priorizar a alfabetização de alunos de até oito anos de idade. Os dados da prefeitura de São Paulo indicam que 20% desses alunos ainda não atingiram o nível ideal. Como parte do esforço para alcançar esse objetivo, ele ampliará um programa de capacitação que já vem sendo oferecido para educadores da rede, aos sábados. Nesse curso, os professores alfabetizadores têm acesso a materiais didáticos especiais. Uma boa saída, visto que hoje se tem um conhecimento muito melhor sobre o funcionamento da mente das crianças e formas mais criativas e incisivas de desenvolver suas habilidades cognitivas.
Alfabetização realmente é a maior prioridade. Se analisarmos os dados das avaliações, veremos alunos que não dominam os códigos de linguagem e acabam carregando essas dificuldades ao longo de toda a formação escolar e da carreira profissional.

Mais interessante ainda: melhorar a educação passa prioritariamente pela formação dos professores. Como estão os cursos de pedagogia? Que tipo de profissionais estão sendo colocados no mercado? Será que esse curso não deveria ter uma prova de suficiência ao final do curso para comprovar o nível de conhecimento adquirido pelos alunos, assim como os advogados têm a prova da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB e contabilistas agora têm a prova do Conselho Regional de Contabilidade - CRC? Sem a aprovação são impedidos de exercer suas profissões.

Mais importante que defender os números dos balanços, é oferecer oportunidade para a vida de quem está estudando. O caminho da educação pode fazer isso.

A prioridade da educação vai além do domínio da linguagem. Hoje a tecnologia permite a potencialização do aprendizado e acesso ao conhecimento em todos níveis. As melhores universidades do mundo já oferecem cursos gratuitos e abertos pela web.

Muito se discute pela formação de Ensino à distância. Ainda há certos temores em relação a essa formação, com dúvidas a respeito do aproveitamento dos alunos.
Duas características são apontadas por Luciano Sathler, diretor da Associação Brasileira de Ensino à Distância - ABED, como fundamentais: os alunos dos cursos à distância apresentam bom conhecimento de informática, pois o curso exige que adquira habilidades com as ferramentas tecnológicas. Outra característica é a disciplina, muito exigida para quem tem que mostrar mais autonomia e controle.

Professores precisam ser prioridade na formação e utilização dessa tecnologia. Atualmente, as crianças, ou melhor, os alunos, têm acesso e muita curiosidade com o mundo digital e todas as suas possibilidades. Basta observar a facilidade e encanto que sentem diante de uma tela de computador, smartphone ou ipad. Portanto, entender desse universo passa a ser conteúdo obrigatório na formação de educadores.

As metas do governo paulista incluem ampliar o atendimento infantil e melhorar a qualidade do ensino fundamental. Essa é a base da formação. Não dá para pensar em colocar os recursos do governo apenas em prédios e novas salas. Quem irá ocupar esses espaços? Como esse profissional irá utilizar esses espaços? Vamos pensar nisso. A sociedade, nossas famílias, dependem e esperam que esse processo se torne cada dia melhor. Nós, educadores, também.




Leticia Bechara
leticia.bechara@trevisan.edu.br

Mestre em educação e coordenadora do vestibular da Trevisan Escola de Negócios.

domingo, 16 de dezembro de 2012

A mosca de Aristóteles


José Pacheco
06-08-2012

A escola herdeira do Iluminismo, a escola da afirmação da Modernidade, já não existe - ela vegeta, agoniza. E arrasta na sua agonia milhões de jovens condenados à ignorância e à exclusão.

Entre o aparecimento da lousa de ardósia e o da lousa digital distam séculos. Nesse longo hiato, a escola pouco, ou mesmo nada, mudou. Apenas terá mudado o tipo de material utilizado na fabricação da lousa.

Oitenta por cento dos jovens internautas comunicam com outros, pedem ajuda e prestam ajuda, em chats, emails, em múltiplas plataformas online. Num tempo em que importa mais que seja o aluno a esforçar-se, para descobrir realidades, do que uma "realidade" ser comunicada por um professor, quantos desses jovens comunicarão com os professores através da Internet?

Num tempo em que a prática da escrita da letra cursiva vai sendo abandonada, muitos docentes obrigam os seus alunos a um gasto significativo do tempo escolar no exercitar da letra cursiva, para que - segundo afirmam - os seus alunos tenham "uma caligrafia perfeita". Talvez se inspirem em Steve Jobs, que, quando passou pela universidade, apenas quis aprender... caligrafia.

Jardins de infância precocemente escolarizam a infância, instituindo rotinas, nas quais todas as crianças devem começar a dormir ao mesmo tempo, ainda que não tenham sono (e, frequentemente, "embaladas por crews, sertanejos e bandas sonoras de novelas...).

À revelia das descobertas da cronobiologia, as escolas mantêm rituais de horário fixo, como a hora de entrar e de sair, ou os cinquenta minutos de uma aula, que quase ninguém sabe explicar por que são cinquenta... E, entre dois toques de sirene, se anuncia que todos poderão ir ao recreio, ao mesmo tempo. Venho suspeitando de que existe alguma analogia entre o banho de sol dos presidiários e o recreio dos alunos... Ao mesmo tempo, todos deverão estar olhando a nuca do colega da frente. Ao mesmo tempo, todos devem merendar, todos devem fazer xixi no mesmo período de tempo.

Já alguém se prerguntou se terá sido sempre assim? Desde o século XVIII, não existe sequer uma teoria que sustente o modelo de escola, que, no nosso tempo, ainda é hegemónico.

A escola herdeira do Iluminismo, a escola da afirmação da Modernidade, já não existe - ela vegeta, agoniza. E arrasta na sua agonia milhões de jovens condenados à ignorância e à exclusão. A par da família, a escola não se adaptou aos novos tempos. Hoje, é matriz oculta do insucesso escolar e social.

Permiti que cite dois mestres. João Guimarães Rosa, que disse que mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende. E Claude Lévi-Strauss, que acertou quando escreveu que sábio não é aquele que fornece as verdadeiras respostas, é aquele que faz as verdadeiras perguntas. Aqueles que, interrogando-se, se libertam de preconceitos e soluções convencionais conseguem compreender que a escola dita tradicional deverá ser demolida, e que, com o material da demolição, se poderá construirá uma nova educação. Sem esquecer que quando se alcança um determinado objetivo de projeto, o mundo já mudou de novo, e que todos os projetos humanos estão em permanente fase instituinte.

O sistema mais antigo de classificação de seres vivos que se conhece deve-se ao filósofo grego Aristóteles, que classificou e descreveu todos os organismos vivos então conhecidos.

Conta-se que Aristóteles deixou registado ter a mosca doméstica oito patas. Ao longo de muitos séculos, os copistas reproduziram a aristotélica asserção até que alguém se atreveu a desafiar a autoridade científica de Aristóteles e verificou que a mosca tem seis patas.

Quando chegará o tempo em que os protagonistas do absurdo modelo de escola, que ainda temos, se decidirão a contar as patas de uma mosca?

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JOSÉ PACHECO Mestre em Ciências da Educação pela Universidade do Porto, foi professor da Escola da Ponte. Foi também docente na Escola Superior de Educação do IPP e membro do Conselho Nacional de Educação.



sábado, 15 de dezembro de 2012

Cai a quantidade de escolas


Camila Ploennes

Brasil tem menos unidades de ensino do que no início da década passada; municipais e estaduais foram as que mais fecharam
O total de escolas brasileiras diminuiu nos últimos dez anos. Levantamento feito pela revista Educação na base de dados do Censo Escolar mostra que o número de instituições em 2011 é 11% menor do que em 2001. Ou seja, o Brasil tinha 218.383 escolas em 2001 e, dez anos depois, contava com 193.047, o que significa uma redução de 25.336 unidades de ensino no período. Ao observar as informações pelo tipo de escola, nota-se que a queda aconteceu na quantidade de municipais e estaduais, enquanto o número de federais e privadas aumentou.

A única região do país onde o número total de escolas cresceu no período foi a Sudeste. Em 2001, eram 56.063 instituições de ensino. Em 2011, elas somavam 58.717, representando um aumento de 2.654 unidades, ou 4,7% em relação a 2001. No entanto, houve crescimento apenas em dois estados: Rio de Janeiro e São Paulo. Em Minas Gerais e Espírito Santo, a quantidade caiu. Além disso, foi registrada queda no número de escolas estaduais, de 13.465 para 11.384, enquanto houve aumento nas federais, municipais e privadas.

A região que mais teve queda foi a Nordeste. De 95.953 escolas, em 2001, a região passou a contar com 75.234 no ano passado, redução de 21,6% em relação a 2001. Os estados que registraram maior redução foram Bahia (que ficou com 7.374 escolas a menos no período) e Ceará (5.177 unidades a menos). Em nenhum estado do Nordeste houve crescimento no número total de escolas, ao contrário do Norte, onde três estados apresentaram aumentos: Amapá (87 a mais), Amazonas (637) e Roraima (17).

Para Luiz Araújo, mestre em políticas públicas em Educação pela Universidade de Brasília (UnB) e ex-secretário de Educação de Belém (Pará), alguns motivos podem ajudar a explicar esses números, além de razões específicas a cada localidade: a queda contínua de matrículas no ensino fundamental e o fechamento de escolas rurais em vários municípios. "Afora esses fatores, houve um processo de agrupamento de escolas pequenas nas áreas rurais e substituição delas por transporte escolar das crianças", acrescenta.

Olhares (di)versos



Deborah Ouchana


Vencedores da última edição da Olimpíada de Língua Portuguesa falam sobre suas inspirações e ressaltam a importância da competição

Pipa era um menino que dizia gostar da solidão. Mestre em soltar papagaio, passava o tempo apenas com sua pipa e a imaginação. No assentamento onde morava, as pessoas não conseguiam compreendê-lo: era considerado louco. Mas para um garoto da vila, que observava tudo de longe, o espírito livre de Pipa era algo fascinante.

A história acima foi retirada dos versos escritos por Éricles da Silva Santos, estudante do 2° ano do ensino médio e vencedor da última edição da Olimpíada de Língua Portuguesa, em 2010, na categoria crônica. Com caráter bienal, a Olimpíada desenvolve ações de formação de professores com o objetivo de melhorar a escrita e a leitura nas escolas públicas brasileiras.

Nos anos pares é realizado um concurso de produção de textos que envolve alunos do 5° ano do ensino fundamental ao 3° ano do ensino médio de escolas de todo o país. O tema "O lugar onde eu vivo" é desenvolvido em quatro gêneros textuais: poema, no 5° e 6° anos; memórias, no 7° e 8° anos; crônica, no 9° ano do ensino fundamental e 1° ano do ensino médio; e artigo de opinião, no 2° e 3° anos do ensino médio.

Antes de vencer em 2010, Éricles já havia participado da Olimpíada, mas não obteve sucesso. "No primeiro ano que eu participei apenas uma menina da escola conseguiu passar para a fase seguinte. Isso deixou todo mundo com o desejo de tentar. As pessoas se sentem influenciadas. No meu ano fui eu e outra aluna; esse ano já foram três. As pessoas ficam admiradas e também querem participar", conta o estudante, que disputa mais uma vez, nesse ano, a fase final da Olimpíada de Língua Portuguesa, na categoria artigo de opinião.

A cultura popular de sua cidade, Japaratuba, localizada no norte de Sergipe, foi a inspiração para escrever o texto "A Pipa, o Bispo e o Azul". "Minha cidade é conhecida pela diversidade cultural. Eu quis focar meu texto no descaso com a cultura popular", explica. Para isso, o estudante criou o personagem Pipa com a intenção de fazer um paralelo com o artista Arthur Bispo do Rosário, nascido na mesma cidade que Éricles. "As pessoas consideravam Arthur Bispo do Rosário louco, assim como o personagem que eu criei. É um trocadilho", diz.

Inspiração nos professores

Já para Eduarda Moura, estudante do 9° ano do ensino fundamental em Cruzeiro do Sul, no Acre, a inspiração para o texto "Chão Varrido", vencedor na categoria memórias, foi sua professora. "A gente tinha que escrever sobre uma pessoa próxima. Minha professora é uma pessoa muito legal, a gente se dava bem. E eu achei interessante escrever sobre a vida dela quando criança porque era bem diferente da minha. Ela morava no interior, num lugar bem afastado", relembra Eduarda.

A importância da figura do professor na Olimpíada de Língua Portuguesa é ressaltada também pela estudante Pâmela de Oliveira, vencedora na categoria poema com o texto "Meu pedaço de terra vermelha". "A motivação para eu participar da Olimpíada foi minha professora. Durante as aulas, nós começamos a trabalhar com oficinas, íamos conhecendo diversos autores, escrevendo coisas como quadrilhas, tudo bem descontraído e fora do ritmo escolar", conta Pâmela.

A jovem, que considera Castro Alves seu escritor preferido, quis mostrar em seu poema aspectos relevantes de Minas Gerais, estado onde vive. Para ela, trabalhar no poema, em cada linha e palavra dele foi a parte mais prazerosa da competição. Pâmela ressalta também a importância da Olimpíada na sua formação. "Eu me tornei uma pessoa muito mais confiante. Passei a me sentir capaz e ganhei novos objetivos. Quero terminar meus estudos e cursar promotoria.", planeja.

Os vencedores da Olimpíada de Língua Portuguesa recebem medalha, computador e impressora, além de ganhar para a escola 10 computadores, uma impressora, um projetor, um telão para a projeção e livros. Admirador da Olimpíada, Éricles considera que os prêmios são uma motivação, mas além de bens materiais a competição fez com que ele despertasse outros olhares sobre o mundo e ganhasse novos horizontes. "Eu fiz novos amigos, conheci outros lugares e andei pela primeira vez de avião!".

Os textos vencedores da edição 2012 serão divulgados no dia 10 de dezembro. No site da Olimpíada de Língua Portuguesa , professores que ainda não participaram de nenhuma edição podem ter acesso a materiais com propostas de atividades para serem desenvolvidas em sala de aula, artigos e cursos online.

Assista aos vídeos com os textos de Eduarda, Éricles e Pâmela, vencedores da última edição:

"Chão varrido" http://centraldemidia.mec.gov.br/play.php?vid=1170

"A pipa, o bispo e o azul" http://centraldemidia.mec.gov.br/play.php?vid=1171

"Meu pedaço de terra vermelha" http://centraldemidia.mec.gov.br/play.php?vid=1146

Adeus ao assistencialismo


Cristiane Marangon, com Redação


Hoje a legislação garante que a alimentação servida nas escolas brasileiras deve priorizar a agricultura familiar e o estímulo à economia local. Mas ainda há desafios a serem enfrentados, como a falta de nutricionistas e os maus hábitos alimentares
Programa Alimentação Escolar: a aquisição de gêneros alimentícios deve ser realizada, sempre que possível, no mesmo município das escolas

Está na lei: 30% dos alimentos adquiridos por estados e municípios com os repasses do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) devem ser comprados diretamente da agricultura familiar. A intenção é induzir bons hábitos alimentares e, de quebra, estimular o desenvolvimento, a educação e a saúde pública local. Além disso, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) também orienta a realização de avaliação antropométrica dos alunos, que inclui pesagem e medição de altura. Mas, entre as dificuldades enfrentadas no dia a dia dos municípios, estão a baixa presença de nutricionistas por escola - normalmente um profissional se reveza entre todas as instituições locais, a logística do horário escolar e da conservação de alimentos perecíveis, além, é claro, de hábitos alimentares nem sempre saudáveis, tanto da família quanto da comunidade e das próprias merendeiras.

Avanços

Apesar disso, o país tem conquistado avanços. Segundo a diretora da Ação Fome Zero, Fatima Menezes, há décadas trabalhando em escolas, primeiramente como professora, depois em cargos de direção, e agora acompanhando de perto a realidade de diversos municípios brasileiros por meio das ações da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), a alimentação escolar brasileira está bem melhor. "Nos últimos anos, o perfil da alimentação escolar mudou sobremaneira. Até então, o programa era para atendimento de pobre, para quem não tinha alimentação em casa. Infelizmente, nesse caso, era usado o conceito de assistencialismo. A origem do Programa Nacional de Alimentação Escolar era ofertar alimentação para a população carente. O mundo mudou e esse modelo já não cabe mais", diz, lembrando que, após a Segunda Guerra Mundial, o Brasil recebia doação de alimentos enlatados dos Estados Unidos para compor o cardápio escolar. Na opinião de Fatima, hoje o Brasil tem um programa estruturante, não mais assistencialista. "Isso faz toda a diferença. A mãe não fica mais em casa, saiu para trabalhar. A escola hoje tem de ter um papel diferente do que tinha nos anos 70. Hoje, ela deve dar a refeição, não o sanduíche", reflete. Sobre a qualidade do alimento ofertado às crianças, entretanto, Fatima relata que "há de tudo". "Em alguns lugares a qualidade é excelente, experimentamos refeições maravilhosas. Mas, por outro lado, em algumas regiões existem situações inadequadas."

O desafio para enfrentar o problema da qualidade ainda passa por questões simples, como superar a monotonia dos cardápios escolares, baseados, em grande parte, em alimentos de fácil preparo e armazenamento, como arroz, feijão e repolho. E por questões mais complexas, como a falta de cozinhas adequadas e um plano de saúde e de carreira para as merendeiras. Fatima cita um estudo da Fiocruz que revela que a vida útil do profissional de merenda é de apenas três anos. "É um caso de saúde pública. Por que essas condições? Porque as prefeituras não têm a visão, às vezes não têm os recursos. Ou, às vezes, têm os recursos e não sabem onde ob¬tê-los", diz Fatima.

Suco natural

No quesito produtos perecíveis, o município de Nova Andradina (MS) enfrentou o problema com a aquisição de oito extratores de sucos para as escolas da rede no primeiro semestre deste ano. Também foram adquiridos fogões, forno industrial, liquidificadores, batedeiras, lixeiras industriais e balanças. No total, foram gastos R$ 44 mil. Para a utilização desses equipamentos e o melhor aproveitamento das propriedades dos alimentos, o nutricionista Paulo Sergio D'Alkmin Filho faz o acompanhamento nas escolas. "Além do arroz, do feijão, da farinha e da carne, servimos diariamente saladas, frutas e legumes", conta. "Nosso objetivo é transformar os hábitos alimentares dos alunos da rede", explica.

Paralelamente, também acontece o projeto Escola Saudável, cujo objetivo é a prevenção e o controle da obesidade infantil, que está a pleno vapor desde o início deste ano. O trabalho é desenvolvido por professores de educação física, integrando todos os demais profissionais da escola e envolvendo a família.

Paulo sempre faz reuniões com os pais nas escolas. "Converso com todos sobre a importância da merenda escolar. Digo que ela é balanceada e supre todas as necessidades nutricionais das crianças e dos adolescentes. Por isso, peço que os pais não enviem guloseima para seus filhos comerem na hora do lanche", relata.

Em Nova Andradina, os recursos repassados pela União somam pouco mais de R$ 447 mil. Ainda há o repasse do município, que é de quase o mesmo valor, R$ 442 mil. O total gasto na aquisição de alimentos gira em torno de R$ 889 mil. "Diariamente são oferecidas cerca de seis mil refeições em 21 unidades, compostas por escolas, creches e entidades filantrópicas", contabiliza Nair Aparecida Lorencini Russo, secretária de Educação, Cultura e Esportes. O município atende educação infantil, ensino fundamental e educação de jovens e adultos.

Pela Lei 11.947, que rege o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), os valores repassados a estados e a municípios por dia letivo para cada estudante são definidos de acordo com a etapa de ensino: para creches, R$ 1, para pré-escola, R$ 0,50, ensinos fundamental e médio recebem R$ 0,30 e ensino integral, R$ 0,90. O orçamento para 2012 foi de R$ 3,3 bilhões, para 45 milhões de estudantes.

Dezembro/2012 Capa/Merenda escolar Edição 188









“As escolas não querem autonomia com controlo remoto”


Sara R. Oliveira
2012-11-28

Filinto Lima, vice-presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, afirma que não é possível exigir mais sacrifícios aos professores num sistema que não se concentra em objetivos comuns.

O também vice-presidente do Conselho Municipal de Educação de Vila Nova de Gaia e coordenador dos diretores da Região Norte no Conselho das Escolas não entende como se corta no orçamento previsto para a Educação e, ao mesmo tempo, se quer alargar a escolaridade obrigatória para 12 anos. Na sua opinião, as mudanças têm de ser bem explicadas.

"Hoje, o que se passa nas escolas é inquietante: aumentou a responsabilidade (do diretor) e diminuiu a autonomia", comenta. O responsável sustenta que os diretores das escolas e dos mega-agrupamentos não podem trabalhar sem rede e que, portanto, o Ministério da Educação não se pode esquecer do apoio jurídico, financeiro e económico.

EDUCARE.PT: De que forma a autonomia que o Ministério da Educação pretende dar às escolas será visível no terreno?

Filinto Lima: A autonomia nas escolas públicas portuguesas teve o seu boom há quase quatro anos, quando 22 escolas celebraram com o Ministério da Educação (ME) igual número de contratos de autonomia. Neles, estava definido o conteúdo dos contratos de autonomia das escolas, coartando a liberdade negocial de que os contraentes devem dispor em casos similares.

Ora, um contrato é um acordo entre duas partes, em que uma delas se submete a determinadas obrigações, usufruindo em troca de certos direitos. Segundo o Código Civil, os outorgantes têm a liberdade de estabelecer as condições do contrato, desde que estejam conformes com a lei. As escolas não tiveram muito poder negocial e, talvez por isso, só cerca de 2% é que celebraram o dito acordo.

O novo diploma foi publicado em setembro. Estes contratos foram elaborados com base numa matriz igual para todas as escolas que pouco podem acrescentar, tendo em conta a sua realidade. Temendo perder a centralização que atrofia qualquer atividade ou iniciativa, o ME publicou o referido normativo legal salvaguardando-se de qualquer surpresa. Isto é uma das principais conclusões de três seminários que o Conselho das Escolas levou a efeito no ano passado, onde diversos diretores cujas escolas celebraram contratos de autonomia deram o seu testemunho e especialistas na matéria confirmaram a prática. As escolas não querem autonomia com controlo remoto.
E: Pela perceção que tem, neste momento, os diretores das escolas estão satisfeitos com as mudanças previstas, nomeadamente ao nível dessa autonomia?

FL: Talvez nem fosse necessário celebrar contratos de autonomia se o discurso político fosse traduzido numa legislação cada vez menos numerosa, menos específica, menos perturbadora e menos inquietante da vida das escolas já que, na prática, centraliza-se cada vez mais atribuindo-se mais responsabilidades aos diretores, em troca da retirada da praticamente inexistente autonomia.

Julgo que falta coragem e iniciativa políticas para dar passos firmes no sentido de inverter algo que, a manter-se, conduzirá as escolas para o excesso de regulamentação originando uma atrofia incapacitante de mobilizar energias que emergem nas escolas, muitas vezes desprezadas. E o estado da nação não admite desperdícios! Uma verdadeira e operacionalizável autonomia pedagógico-organizacional será vista com bons olhos pelas escolas.

E: A tutela está a exigir muito aos diretores? O que se está a passar nas escolas?

FL: Hoje, o que se passa nas escolas é inquietante: aumentou a responsabilidade (do diretor) e diminuiu a autonomia. Significa que a administração e gestão das escolas é uma tarefa hercúlea a exigir super diretores em que a formação, a experiência e o apoio serão fatores fundamentais para o exercício de uma função muito mais burocrática. Se o nosso país tem um naipe excelente de diretores de escola devido aos primeiros fatores apontados, certo é que o terceiro - o apoio - está muito aquém desta enorme mudança, e será tanto mais importante quanto se sabe que as direções regionais de educação estão a delegar competências, extinguindo-se a 31 de dezembro. Alguns falam em presente envenenado, outros, como nós, apontam o dedo à falta de meios para desenvolver com segurança e em conformidade a função de diretor de escola, se não for acautelada a retaguarda destes professores em comissão de serviço, os primeiros responsáveis dos agrupamentos.

As escolas e os agrupamentos movimentam anualmente muitos milhões de euros, sobretudo em relação aos vencimentos dos seus profissionais. A juntar à vertente financeira temos os atos administrativos e de grande responsabilidade que os diretores praticam diariamente, os contratos que celebram e as inúmeras e diversas decisões que tomam...

Pergunto: se as empresas públicas e privadas, que movimentam até valores inferiores aos das escolas, têm todo o tipo de apoio, não fará sentido facultá-lo aos diretores de escola? O ME deverá dotar os agrupamentos de apoio jurídico (o mais importante), financeiro, económico, etc., não deixando os diretores das escolas e dos mega-agrupamentos sem rede.

E: A constituição dos mega-agrupamentos, tão criticada no início, foi ou não uma boa medida?

FL: Este ano o dossiê "agregações" ficará concluído. As direções regionais de educação já começaram as reuniões concelhias para fechar o processo, por forma a que os futuros mega-agrupamentos iniciem um trabalho atempado. É um exemplo de uma medida reativa pois sabemos o que esteve na sua génese. Contudo, se há situações em que as comunidades até quiseram este desfecho (concretamente nos pequenos centros em que o número de alunos é diminuto e em algumas cidades onde certas escolas estavam a perder elevado número de alunos), na maioria das situações esta solução foi indesejada.

As comunidades educativas e as autarquias, um pouco por todo o país, opuseram-se a uma união forçada que, no final, imperou. Estudos elaborados desaconselham esta medida de política educativa, sobretudo pelo número de alunos da nova unidade organizacional, em alguns dos casos a ultrapassar os 2500, atingindo mesmo 3000 alunos e mais.

E: Neste momento, quais são as principais preocupações da ANDAEP?

FL: As nossas preocupações estão relacionadas com alguns dos objetivos.

A formação contínua e especializada é um dos objetivos da nossa Associação, que irá celebrar protocolos com entidades formadoras em áreas-chave para o bom desempenho dos diretores. De igual modo, e pelo facto de aumentar dia a dia a responsabilidade dos diretores, celebramos com uma seguradora um protocolo que transfere alguns riscos decorrentes da atividade daqueles.

E: São problemas de difícil resolução?

FL: Estes problemas são parte dos nossos objetivos, como referi, e tudo faremos para apoiar os diretores. Ao mesmo tempo, temos reunido com o ME, por vezes com o senhor ministro, que se mostra disponível para ouvir as nossas opiniões, embora na maior parte das vezes não as transporte para os diplomas legais, o que muito gostaríamos que acontecesse, pois nós estamos no centro das escolas, temos um conhecimento excelente das mesmas. Somos parceiros do ME.

E: Os chumbos dos alunos continuam a ser preocupantes. O sistema deveria abordar as retenções de uma outra forma?

FL: É notório que um número considerável de alunos chega ao 5.º ano de escolaridade sem saber ler nem escrever ou a fazê-lo de modo muito deficitário e com imensas dificuldades a Matemática. Aqui, na minha opinião, reside o grosso dos problemas das retenções, que se sente muito mais a partir do 2.º ciclo. Julgo que a atual equipa ministerial, aproveitando a oportunidade que a crise lhe dá, deverá reformar um nível de ensino estruturante, condição de sucesso dos nossos alunos nos patamares seguintes, tanto mais quanto se sabe que dois dos objetivos do Governo são "continuar a alargar a rede pré-escolar" e "apostar na articulação entre o ensino pré-escolar e o ensino básico". Uma aposta neste nível de ensino contribuiria para baixar drasticamente o insucesso escolar e, em grande parte, o abandono.

Também é necessário que não se espere tudo da escola. A articulação da escola com outras instituições e técnicos (psicólogo e assistente social...) será muito importante no combate não só ao insucesso como também ao abandono escolares. De igual modo, aquilo que se ensina e como se ensina deverá merecer a atenção do ME e, seguramente, ajudará no combate àqueles problemas.

É evidente que tudo isto é importante mas não podemos desprezar o interesse dos alunos e dos pais pela atividade escolar. Por muitas estratégias que tenham os professores e muito boa vontade que exista no ME, tudo ficará comprometido se aqueles não cumprirem a sua função.

E: Satisfeito com a exigência dos últimos exames nacionais?

FL: Não sei se os exames foram mais exigentes. De maior exigência foram os critérios de correção, alguns deles, na opinião dos professores, desfasados e muito apertados. Mas é importante a articulação daquilo que se ensina durante o ano letivo e o que se apresenta nos exames, sob pena de confundirmos exigência com falta de sincronia.

E: A perda de autoridade dos professores é, de facto, um problema que afeta o dia a dia da classe docente?

FL: O Estatuto do Aluno e Ética Escolar foi um avanço, mas a próxima revisão terá necessariamente de eliminar as burocracias e formalismos que o enxameiam. Num país em que algumas sentenças são proferidas de imediato e oralmente no final dos julgamentos, o regime disciplinar deve ser expedito, célere e simplificado.

Contudo, ainda falha no capítulo da disciplina. Querendo dar todas as hipóteses de defesa ao aluno prevaricador - sistema excessivamente garantístico - envolve a escola numa teia complexa, mais parecendo um tribunal, atendendo aos procedimentos legais a que deve obedecer a instrução de um procedimento disciplinar. Uma carga de trabalhos que seria evitada se se partisse do princípio da boa fé do professor.

E: As multas previstas para responsabilizar os pais dos alunos faltosos poderá ser um passo importante para mudar mentalidades?

FL: Esse é mais um encargo atirado ao diretor que nem tem formação jurídica e agora vai exercer funções judiciais. Por outro lado, as multas poderão funcionar como intimidação e essa será a grande virtude desta inovação, mas o futuro o dirá. Ao mesmo tempo, punir os pais num momento em que muitos nem dinheiro têm para pagar as despesas normais de um filho estudante... A lei tem de ser, e será, aplicada pelos diretores mas, neste particular, o timing escolhido para a aplicação do Estatuto do Aluno e Ética Escolar não foi o melhor.

E: A contenção financeira na área educativa será um retrocesso sem retorno possível?

FL: Parece que estamos a assistir a um desinvestimento na Educação, área em que todos dizem ser essencial um investimento. A não ser assim, a médio prazo iremos verificar com pesar as consequências desastrosas... Sou apologista de uma racionalização dos meios, mas neste momento não se pode cortar mais na Educação. Por outro lado, não se entende como se pensa em alargar a escolaridade para 12 anos e, ao mesmo tempo, continuar a cortar no orçamento deste setor.

E: Afirmou, no início do ano letivo, que a pobreza envergonhada terminou, que as necessidades já não se escondem. Há carências preocupantes?

FL: Nas escolas não há fome, note-se. O problema é que um número significativo de alunos chega às escolas sem tomar o pequeno-almoço e até sem dinheiro para comer. As escolas estão atentas e, embora alguns destes casos (em número reduzido) se devam a desatenção dos encarregados de educação, a maioria tem a ver com carências económicas. A ação social escolar é um serviço que funciona muito bem e deve ser apoiado cada vez mais pelas entidades estatais, atendendo ao momento difícil que estamos a atravessar. O Estado social, não contando só com as escolas, deve mostrar modos de apoiar os mais necessitados. Há alunos cuja única refeição quente e completa do dia é o almoço da escola.

E: Qual a medida que o atual ministro tomou até hoje que mais lhe custou a entender?

FL: Todas as medidas que não são proativas custam muito a perceber. Muitas das alterações que os inúmeros diplomas legais trazem às escolas não são alvo de avaliação. Julgo que seria necessário explicar os motivos de mudança, mas isto acontece invariavelmente com todos os partidos dos sucessivos governos sem nunca prever as consequências. Percebe-se pelo menos dois motivos para explicar tamanha avalancha legislativa: por um lado, medidas reativas por força de imposições financeiras da troika, embora pense, em alguns casos, que são excessivamente pesadas não dando origem ao efeito previsto; por outro, este Ministério também quer deixar a sua marca, o que é legítimo, mas nesta área os políticos deveriam ser cautelosos e atuarem com um pensamento mais centrado no interesse comum, o que nem sempre sucede.

E: Na sua opinião, o que é fundamental, neste momento, ter em atenção para que a escola pública, que muitos dizem estar em risco, se mantenha de pé?

FL: Devemos refletir em comum e obrigar os partidos com assento na Assembleia da República a assinar um pacto na educação, pois percebe-se que é uma arena política demasiado perigosa para fazer experimentações sem avaliar o que está para trás, nem antever os respetivos resultados. O país só tem a ganhar se forem traçadas e aceite por todos linhas condutoras de atuação na área da educação, de modo a pacificar e a deixar trabalhar os professores, os menos culpados das alterações que proliferam na política educativa. Não é possível exigir aos professores mais sacrifícios em prol de um ensino que não estabiliza nem se concentra em objetivos essenciais e comuns.



Nuno Crato diz que o país precisa de mais formação profissional


Lusa / EDUCARE
2012-12-14

O ministro da Educação e Ciência afirmou hoje que o país precisa de mais jovens com formação profissional para dar resposta ao mercado de trabalho, no encontro do projeto-piloto do ensino vocacional, na Marinha Grande.

Nuno Crato salientou que o "país não precisa só de licenciados" e que é "importante que haja pessoas que tenham formações profissionais de outro tipo, como técnicos de informática, marceneiros ou auxiliares de enfermagem".

O governante acrescentou que existem "tantas profissões que são necessárias neste mundo e para as quais não se encontra mão de obra". Por outro lado, existem jovens "que querem emprego e não têm", realçando estar preocupado com o desemprego jovem.

"É uma calamidade completamente absurda, quando encontramos empresas que dizem que precisam de trabalhadores especializados e que não os encontram e, ao mesmo tempo, temos jovens que não conseguem encontrar emprego. É nossa responsabilidade conjunta, de professores, Ministério e empresas, fornecer vias que permitam aos jovens terem saídas profissionais", acrescentou Nuno Crato.

O ministro lamentou que exista um "preconceito intelectual, entre algumas pessoas," que, garante, "tem de acabar" dado que "todas as profissões são dignas".

Para isso, o Ministério da Educação e Ciência (MEC) tem "ofertas diversificadas": "Não queremos que os jovens, logo muito cedo, escolham a via que querem seguir. Queremos que possam mudar de via ao longo da escolaridade. Mas queremos que haja uma via profissionalizante que também seja oferecida."

Sobre o ensino vocacional, "uma experiência-piloto" que o MEC adotou este ano letivo, Nuno Crato fez um balanço positivo.
"Esta experiência está a correr muito bem. São 13 escolas, que têm tido o apoio de mais de 100 empresas. Esta colaboração empresas-escolas permite fazer que os jovens que escolham esta via saiam desta escolaridade com maior capacidade de emprego e de trabalho e tenham maior sucesso."

O governante explicou que a via vocacional não obriga a seguir o ensino profissional. Apesar de alguns jovens "terem necessidade de um ensino mais prático em determinada altura", podem "mais tarde decidir se querem seguir a via científico-humanístico".

Vários intervenientes ligados ao projeto do ensino vocacional estiveram hoje reunidos na Escola Secundária Eng. Calazans Duarte, na Marinha Grande, para partilharem experiências e levantarem algumas questões sobre o projeto.

Era uma vez um “autista”


José Pacheco
03-09-2012

Naquele tempo, ninguém usava o termo "inclusão", nem expressões como "aluno com necessidades especiais". Muito menos tinha sido inventado o TDA, o DDA, o TDA-H, a Ritalina não estava na moda, nem se reconhecia haver o que, hoje, se designa por hipercinético... Naquele tempo, o moço era deficiente. E pronto!

Ainda era um jovem professor e já a dúvida o atormentava... Talvez por ser o mais jovem - e considerado inexperiente - confiaram-lhe a turma mais pequena da escola. Porém, certo dia, recebeu a visita da senhora diretora. Vinha acompanhada por um moço, que andaria aí pelos treze anos. E logo foi dizendo:

O senhor professor é um privilegiado! A sua turma só tem quarenta e oito alunos, mas trago-lhe mais um, que lhe vai dar mais trabalho do que a turma toda junta. E já o aviso: o moço é autista e é perigoso.

Naquele tempo, ninguém usava o termo "inclusão", nem expressões como "aluno com necessidades especiais". Muito menos tinha sido inventado o TDA, o DDA, o TDA-H, a Ritalina não estava na moda, nem se reconhecia haver o que, hoje, se designa por hipercinético... Naquele tempo, o moço era deficiente. E pronto!

Naquele tempo, em plena ditadura, ninguém ouvira falar de um russo chamado Vigotsky, que discordava de um tal de Piaget, porque esse tal de Piaget dizia que o desenvolvimento do pensamento na criança "parte do pensamento autístico não verbal à fala socializada e ao pensamento lógico, através do pensamento e da fala egocêntricos". Naquele tempo, vivíamos na mais escura treva teórica.

O jovem professor recorreu ao dicionário: "autismo é uma disfunção global do desenvolvimento". Ficou a perceber o mesmo... Agarrou-se à tábua salvadora do processo que acompanhava o aluno. Nele dizia que o autista havia arrancado os brincos da professora e que, nesse violento gesto, tinha rasgado as orelhas da mestra, que fora receber tratamento hospitalar. O processo só não dizia por que razão o "autista" arriscara o tresloucado gesto. Somente acrescentava que, consumado o delito, o aluno fora expulso.

Aquele jovem professor não era daqueles que cedo desistem de aprender. Com a informação de que dispunha (nenhuma), meteu mãos à obra. No dia seguinte, dividiu o quadro negro em quatro partes e em cada uma delas escreveu tarefas para cada série. Coisa de demorar uma meia hora a fazer. Posta a classe em ação, dirigiu-se para o fundo da sala, onde o autista se instalara.

Quando já estava a menos de alguns passos do "autista", prudentemente, deteve-se. O "autista" balançava a cabeça e isso talvez não augurasse algo bom... Recordou o aviso da senhora diretora: "este aluno é autista e é perigoso". O jovem professor recuou. A situação repetiu-se, vezes sem conta, ao longo desse dia: a cada aproximação, novo movimento pendular da cabeça do "autista"; a cada arremetida, novo estratégico recuo. E o professor regressou a casa, preocupado. Não conseguira chegar sequer à fala com o "aluno especial", ou de "inclusão", como, hoje, seria designado . Muito menos conseguiu ensinar-lhe algo, enquanto durou o que restava daquele ano letivo.

Muitos anos decorridos sobre este incidente, o professor, já menos jovem e com algumas noções de prática teorizada, compreendeu que aquele aluno nunca tinha sido autista. Apenas lhe tinham colocado um rótulo. Aliás, compreendeu algo bem mais importante e decisivo para a tomada de decisões que, alguns anos depois, o conduziram a uma profunda mudança na sua prática. Há quarenta anos atrás, o professor compreendeu que, na sua sala, não havia um "autista" - havia tido quarenta e nove. Ou melhor: seriam cinquenta os "autistas". Porque, dentro das quatro paredes da "sua sala de aula", todos estavam... sozinhos.



José Pacheco Mestre em Ciências da Educação pela Universidade do Porto, foi professor da Escola da Ponte. Foi também docente na Escola Superior de Educação do IPP e membro do Conselho Nacional de Educação.

“A régua, uma palmatória com cinco furos, parecia estar já a olhar para mim (…)”

Vitor Burity da Silva
05-08-2011

Dividindo as suas recordações pelas diferentes épocas e locais onde passou a sua vida, o escritor Vitor Burity da Silva partilha os vários cenários, sensações e situações caricatas que povoaram o seu percurso escolar.

Eis as "Memórias de Passagem" de Vitor Burity da Silva

Craque? O que é isso?

(1967 - Nova Lisboa)

Mal abrira os olhos lá fora nem frio.

(nesta cidade a temperatura nunca desce dos vinte graus).

A minha mãe ia repetindo e eu ouvia-a.

(sempre foram rebeldes as crianças).

Passava um pouco de água pelo rosto a ver se os olhos se abriam de vez, como era mesmo preciso. Devagar, com uma mão e a seguir com a outra, a água escorria no lavatório, a torneira aberta, a minha mãe a ralhar comigo, lá de onde estava, se na cozinha, se na sala, não sei, continuava, para depois arrepiar caminho, a escola ficava a uns quatro quilómetros de casa, e quase sempre fazia-os a pé, e antes, o pequeno-almoço, um copo de leite e uma sandes, bastavam, na sacola mais uma sandes para o lanche, o Manuel lá fora esperava por mim, autocarros nem havia, qual quê, nem carro o meu pai tinha, coisas desse tempo, e foram tantas as vezes que percorri essa distância caminhando, o Manuel esperava por mim:

Menino Sandro, vamos embora?

E lá íamos, eu sentado no quadro de metal da bicicleta do Manuel, amigo e contínuo na repartição de agricultura e florestas, no bairro São João, onde o meu pai trabalhava, sentia-me bem, empoleirado naquele quadro de metal da bicicleta preta do amigo Manuel, e que paciência tinha ele comigo.

Antes de sairmos de casa, que era tambem no bairro São João, o quintal imenso, mais parecia uma vila com uma casa só, uma plantação imensa de café, árvores bastantes, o curral e a capoeira onde galinhas num barulho infernal, o porco andava por ali, solto pelo quintal, de um lado para o outro, comia sabão e tudo o que lhe aparecesse, e a estrada que começava em terra batida mais à frente, a principal, ainda o eco da sua voz, quantas vezes me chamou e tanto esperava:

Vamos menino, está a ficar tarde.

E lá fomos.

(1971 - Carmona)

Um dia chorei tanto. Ah, como não gostava nada de fazer os trabalhos de casa, sabia que iria enfrentar dificuldades, e, mal entrava na sala de aula, tentava fugir aos lugares da frente, quase sempre sem resultado:

Menino Sandro, venha ao quadro.

Hoje com setenta e tal anos ainda se recorda, e eu não esqueço. O meu lugar era sempre nas carteiras da frente, não por ser traquina, nem por estar menos atento às aulas, coitada da Isabel, vítima das minhas fisgadas de papel.
Trabalhos de casa!

Dizia a professora, Dona Teresa. Eu nunca fazia os trabalhos de casa. A régua, uma palmatória com cinco furos, parecia estar já a olhar para mim, esfregava as mãos, tremia, os colegas iam-se levantando em ordem, um a um, entregavam os trabalhos, a professora verificava, ralhava com uns, com outros não, até chegar a minha vez, como iria ser? Algumas vezes conseguia ainda fazê-los, mesmo à porta da sala de aulas, já com o sino de entrada a incomodar-me os ouvidos, a maior parte das vezes não, já contava com umas boas reguadas, olhava para as mãos ainda não vermelhas, ao intervalo de castigo para os fazer, sozinho na sala, pensava que já não iria jogar ao berlinde, tínhamos um campeonato e eu seria desclassificado por falta de comparência.

(1975 - Sintra)

Para trás os campeonatos de berlindes. O amor pela Anabela pequena como eu, as reguadas da professora Teresa, a régua Dona Maria dos cinco furos, nova cidade na minha vida, tudo diferente desde então, na mesma, os trabalhos de casa por fazer, saudades de tanta coisa, o meu sotaque diferente dos meus novos colegas, o frio que antes nunca senti, a chuva fria, tanto vento e já não havia o Manuel nem a bicicleta preta onde me sentava feliz no quadro de metal, o autocarro à hora certa, a professora de Francês que eu detestava. Sempre fui um aluno medíocre.

Nem o cocó de galinha nas mãos como fazíamos para que as reguadas não doessem, a voz rude da professora:

Patapuf et contant.
Não sei stôra, quero é ser craque da bola!

E ela:

Craque? O que é isso?

Para quê fazer a cama, se a vou desfazer logo à noite?


Armanda Zenhas
12-12-2012

Numa família em que todos colaboram no trabalho familiar, desenvolve-se um sentimento de colaboração, de partilha e de responsabilidade individual e coletiva.

Alguma vez experimentaram debater numa turma de um qualquer ano de escolaridade quem colabora nas tarefas domésticas e que tarefas lhe estão incumbidas? Provavelmente encontrarão uma maioria de crianças ou jovens que não participam nessas lides, alguns que arrumam o quarto a contragosto, se forem mesmo obrigados, e um número significativamente inferior que tem responsabilidades definidas, variáveis de acordo com a idade, que podem ir de pôr a mesa até fazer compras e tomar conta de irmãos mais novos, passando por manter o quarto arrumado.

O contributo dos filhos nas tarefas familiares é favorável ao seu desenvolvimento ou, pelo contrário, um obstáculo ao exercício do seu direito de terem tempos livres geridos por si? Na minha opinião, aplica-se aqui a regra da "conta, peso e medida". No quotidiano das crianças e dos jovens, é necessário haver tempo para ir à escola, para estudar em casa, para lazer gerido autonomamente, para colaborar com a família nas tarefas domésticas, para praticar desporto ou outras atividades. Claro que nem sempre tudo isto cabe num único dia. É óbvio também que "a conta, o peso e a medida" de cada um destes (e, eventualmente, de outros) tipos de atividades depende de muitos fatores, entre os quais a idade.

Numa família em que todos colaboram no trabalho familiar, desenvolve-se um sentimento de colaboração, de partilha e de responsabilidade individual e coletiva. Todos podem contribuir de forma proporcional às suas possibilidades, com tarefas regulares e com disponibilidade para a realização de outras extraordinárias. Por exemplo, as crianças podem aprender, desde pequenas, a ter os seus brinquedos arrumados, a levar a sua roupa suja para o cesto, a ajudar a pôr a mesa. Crianças um pouco mais velhas podem contribuir com a responsabilidade de manter o seu quarto arrumado, com a cama feita e os materiais escolares sempre organizados, para além de outras tarefas. Cozinhar ou lavar roupa são exemplos de trabalhos cuja aprendizagem e prática também deve estar contemplada no processo de crescimento.

O sociólogo francês Bernard Lahire diz que o mundo doméstico se caracteriza por uma ordem material, afetiva e moral que pode ter um papel importante na atitude das crianças face à escola. A distribuição de tarefas adequadas a cada um, num ambiente afetivo, favorece o desenvolvimento do gosto pela organização e pelas coisas bem feitas, do esforço e da perseverança para alcançar objetivos, fundamentais para atingir sucesso na escola e noutras esferas da vida. Como explica Lahire, a regularidade das atividades, os horários, a arrumação das coisas produzem estruturas cognitivas ordenadas e capazes de ordenar, gerir e organizar os pensamentos. Daniel Sampaio chama "ensino incidental" ao aproveitamento pelos pais e educadores desses "pequenos momentos do quotidiano", que considera serem "ocasiões em que os seres em desenvolvimento crescem em competência e confiança, e aprendem a equilibrar as suas necessidades com as dos outros".

Acrescento ainda uma vantagem de relevo: o desenvolvimento da autonomia. Num tempo em que as fronteiras se tornaram mais ténues e que as crianças e os jovens têm o mundo por horizonte, a facilidade de terem hoje tudo feito pelos pais pode ser a dificuldade de amanhã se tornarem autónomos e irem trabalhar e viver para longe da família ou até para fora do país.

Quem é a mãe que ainda não ouviu como resposta de um filho, quando lhe diz que faça a cama: "Para quê, se a vou desfazer logo à noite?"? E quantas mães não acabam por se resignar a fazer elas próprias a cama dos filhos para evitar discussões?

Bibliografia:

Lahire, B. (2004). Sucesso escolar nos meios populares: As razões do improvável. S. Paulo: Ática.

Sampaio, D. (2012). O ensino incidental. Revista do jornal Público, de 25 de novembro de 2012.

MT - SEC assina convênio para criação de festival de Cururu e Siriri


Da Redação - Priscilla Vilela

Acontece no próximo dia 20 de dezembro, às 19h30, no Centro Cultural Casa Cuiabana, o lançamento do 11º Festival de Cururu e Siriri. Na ocasião, será apresentado o calendário e o local do Festival, que será realizado no final de janeiro de 2013.

O Festival é uma idealização da Federação Mato-grossense das Associações e Grupos de Cururu e Siriri e esse ano conta com o suporte da Associação Folclórica de Tangará da Serra, que assinou convênio junto a Secretaria de Estado de Cultura para a realização do evento. O valor repassado pela SEC-MT totaliza R$ 495 mil.

De acordo com a secretária de Estado de Cultura em exercício, Vannêssa Jacarandá o Governo do Estado tem se empenhado para que o Festival continue sendo realizado. "Buscamos dar continuidade a este tradicional Festival, a intenção é fazer com que ele cresça ainda mais. Exemplo disso é que o evento está incluso no Plano Plurianual (PPA) de gestão estadual", explica a secretaria.

Homenagens “Mestre Luiz Marques”
Durante a cerimônia, do dia 20/12, a diretoria da Federação Mato-grossense das Associações e Grupos de Cururu e Siriri fará a entrega de homenagens intituladas “Mestre Luiz Marques”, aos parceiros e entidades que apóiam de forma fundamental a realização da 11ª edição do evento. “É uma forma de agradecermos a todos aqueles que estão compromissados com esta grande festa e que, consequentemente, atuam de maneira significativa para a manutenção da nossa cultura”, ressalta a presidente da Federação Terezinha Quilombola.

A homenagem leva o nome de um grande mestre do cururu e siriri, Sr. Luiz Marques, que na década de 80 foi incentivador e pioneiro na fundação da maioria dos grupos de cururu e siriri.

O Festival e as homenagens contam ainda com o apoio do Ministério da Cultura, através da Fundação Nacional das Artes – Funarte (Prêmio Pró-Cultura de Apoio a Festivais); o Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Cultura e de Turismo e a Prefeitura de Cuiabá

As informações são da Secom/MT




sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

escola.com


José Pacheco
10-12-2012


Os jornais anunciam que os alunos podem aprender em casa, acessar sites contendo os conteúdos que o professor daria numa aula. Se os alunos dispõem de livros e de Internet, por que terá de ir ouvir aula na escola? Para socialização! - bradam os teóricos de serviço.

O jovem "teve mau comportamento" e a professora pô-lo "fora da sala de aula". Tão discreto quanto me era possível ser, observei o deambular do jovem pelo pátio da escola. Não tardou a interpelar-me, fones nos ouvidos, celular de última geração premido entre polegares:

Aqui tem aifai?

Queres dizer Wi fi? - perguntei.

Então você não sabe o que é aifai...? - retorquiu com um esgar de desdém. E encaminhou-se para a biblioteca vazia, de onde seguiria para o gabinete da diretora.

Os jornais anunciam que os alunos podem aprender em casa, acessar sites contendo os conteúdos que o professor daria numa aula. Se os alunos dispõem de livros e de Internet, por que terá de ir ouvir aula na escola? Para socialização! - bradam os teóricos de serviço. Mas de que socialização estarão a falar? De alunos postos fora da sala de aula, castigos, expulsões? De bullying? Entre a "socialização" das escolas que ainda temos e a "socialização" de monstrinhos de tela de computador, que venha o diabo e escolha.

Salman Khan recebeu um pedido dos seus jovens primos, que nada entendiam da Matemática escutada nas aulas dadas por professores. Os primos de Khan moravam longe e não restava outra solução senão a de recorrer ao YouTube. As aulas de Khan, "dadas" através da Internet, foram um sucesso. Em aulas com cerca de vinte minutos de duração, os primos compreendiam os temas de Matemática, que, em cinquenta minutos, um professor não conseguia fazer compreender.

A fama das aulas do Khan correu mundo e o site das aulinhas foi sendo utilizado por milhares de estudantes. Com um milhão e meio de dólares, que Bill Gates lhe ofereceu, Khan fundou uma academia digital. Eu estive lá e, ao vivo, pude compreender o drama educativo: as novas tecnologias têm servido para congelar aulas num computador, aulas que os alunos skinerianamente consomem, sem resquícios de cooperação com o aluno vizinho, dependentes de vínculos afetivos precários estabelecidos com identidades virtuais.

Algumas escolas se vangloriam de oferecer tablets aos alunos, instrumentos que contêm tudo aquilo que precisam pôr nas provas. E, no mundo virtual, muitos jovens consomem informação, escapando de acordar de madrugada e obrigar os progenitores a sofrer no caos do trânsito, para os levar à escola, onde assistiriam a aulas com hora marcada. Longe do edifício-escola e a qualquer hora, perambulam por sites, numa aprendizagem solitária idêntica à das monótonas aulas de cinquenta minutos.

Na verdade, Khan não está sozinho: a Internet é generosa na oferta de informação sob a forma de vídeos ou de outros recursos. Basta carregar no enter, que o mister Google atende. Basta clicar para repetir, até que a matéria seja compreendida. Tudo aquilo que um professor pode "ensinar" numa aula está plasmado, de modo mais atraente, na tela de um computador.

Reencontrei o moço do "aifai", sentado no "laboratório de informática", no cumprimento de (nas palavras da diretora) uma "suave punição": terá de refletir sobre os seus atos! Suave? Ou pura crueldade? Durante quase uma manhã inteira, o solitário moço do "aifai" sofreu a tortura de ter dezenas de computadores à sua volta e não lhes poder tocar.

E agora, José? - perguntarão os professores que dispõem de lousa digital e de acesso à Internet. Iremos instalar-nos em novas fórmulas de mesmice? Dispondo de novas tecnologias de informação e comunicação, iremos replicar aulas congeladas no YouTube e em tablets? Quem as escutará? Será possível usar o digital ao serviço da pessoa? Terá chegado o tempo em que as escolas, usando inteligentemente as novas tecnologias, se humanizarão?

Entre a escola de dar aula e a Internet de dar aula, haverá uma terceira via?

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

As pequenas coisas da vida


Outro dia estava pensando como a vida não teria graça alguma sem pequenas coisas que costumam recheá-la de alegria. Reparei também que tais coisas ou situações costumam ser simples e, às vezes, até mesmo corriqueiras, mas nos afetam de forma imediata e tão espontaneamente que nos deixamos envolver por elas. É o caso de um aniversário em família, por exemplo.

Mobiliza várias pessoas, sugerindo a compra de presentes e preparativos para uma data que tem tudo para ser especial. Motivo de se estar juntos, contar piadas, rever parentes, encontrar pessoas queridas, fazer novas amizades... Tudo regado com alguns aperitivos, pratos gostosos e bolo de festa. Fiquei pensando também quantos aniversários existem ao longo do ano e, consequentemente, quantos motivos para se comemorar. É um namoro que se inicia; uma festa de casamento; um batizado; um feriado esperado há tanto tempo; a inauguração de um local público; a estreia de um filme; uma peça de teatro; a apresentação de uma orquestra; uma exposição de pinturas e tantas outras coisas que vão dando colorido ao nosso dia a dia.
Temos que saber aproveitar esses momentos. Vivenciá-los, “curti-los”, apreciá-los enquanto estão ocorrendo, batendo à nossa porta, sorrindo para nós. Momentos não voltam mais. Eles vão e vêm num suceder incessante, mas cada qual guarda sua beleza. Não há como aprisionar momentos bonitos. Por mais que os queiramos eternizar, escorrem por entre nossos dedos e dão lugar a outros momentos. Nada como usufruir deles enquanto ocorrem, enquanto se apresentam para nós. E, como fazer isso? Estando sempre presente no momento. Naquela hora, naquele instante, naquele acontecimento. Estando ali inteiramente, completamente. Deixando-se invadir pelas impressões daquele dia especial, daquele evento, daquela comemoração. Como se o tempo tivesse parado ali, naquele instante, junto daquelas pessoas, próximo daquele sorriso e daqueles olhos brilhantes e vivos. Tudo tão especial, comovente e, ao mesmo tempo, tão terrivelmente simples.

O vestido florido, a luz, o doce perfume, a música ambiente, o toque aveludado, a textura, a cor, as sensações e os sentimentos, tudo abrigado num pequeno momento, perpetuado pelas lembranças de quem esteve inteiramente absorto no cotidiano da vida. Expressivamente ligado aos acontecimentos presentes. Tranquilidade, paz, serenidade... Tudo com sabor especial, saboreado sem pressa, envolvido de forma acolhedora e gentil.

Aquele sobrinho doido com seu visual radical, as comadres que não se viam há anos pondo a conversa em dia, o cunhado contando as proezas da última pescaria, a filha mostrando seu novo corte de cabelo e a criançada fazendo a maior bagunça, como já era de se esperar. Tudo tão certo, tão previsível, tão maravilhosamente esperado, amado e encantador. Cenas da minha casa, da sua casa, da casa dele. Cenas de uma vida feliz, plena e completa. Possível e real. Existente em cada esquina, em cada lar, em todo lugar. Basta saber enxergar e acolher a vida.

Pare de se preocupar inutilmente. Desfaça essa carranca e deixe-se levar pela onda de afeição que o invade agora. Compartilhe você com os outros.

Deixe que as pessoas o conheçam e se enamorem de você. A vida é muito mais bonita porque conta com a sua presença, o seu sorriso, a sua escuta, a sua participação. Deixe-se envolver pela vida e distribua vida você também. A cada vez que amamos estamos sendo plenos de vida, porque a vida é a expressão do amor. Entre de cabeça nessa sensação maravilhosa que é acolher a tudo e a todos indistintamente. Seja no churrasco ou na porta do shopping, no supermercado ou no trabalho, em casa ou na quadra de futebol, no ponto de ônibus ou na lanchonete. Todo e qualquer lugar tem espaço para se amar e ser amado. Momentos vão momentos vêm. Acolha este momento precioso e aceite que ele mude sua forma de encarar a vida. Tenho certeza de que você se sentirá muito mais feliz!

Maria Regina Canhos Vicentin
contato@mariaregina.com.br

Psicóloga, bacharel em direito, pós-graduada em educação, especialista em psicologia clínica e jurídica, e escritora de livros, além de ser colaboradora de diversos jornais e revistas do país.