terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O tesouro da cultura


Por Willy Cesar*

A educação e a cultura da cidade do Rio Grande têm endereço certo na Bibliotheca Rio-Grandense, há 164 anos, completados no último dia 15. Não! Errei, desculpem-me. Do Rio Grande do Sul! Ops, errei de novo! Perdoem-me mais uma vez: do Brasil! Por Deus! Novo erro: do mundo inteiro!! Sim, o saber de todo o planeta pode ser pesquisado na grande e antiga biblioteca do sul brasileiro.

O que parece um exagero pode ser conferido facilmente, porque ali está uma das maiores coleções do Brasil em livros, jornais, revistas, mapas, fotografias, gravuras, documentos históricos, arquivos virtuais e outras fontes de consulta. Em se tratando de livros, todos os principais idiomas mundiais estão representados.

Lembro-me de que, quando o gaúcho Paulo Brossard era ministro da Justiça, no governo Sarney (1985-1989), enviou um pesquisador para fazer consultas, realizadas com sucesso nas coleções da Rio-Grandense. Em agradecimento, Brossard doou uma coleção de livros à biblioteca, escritos em chinês. Esse assunto vazou para a revista Veja, que até brincou com o ministro, porque poucos conheciam o idioma chinês na cidade: os proprietários do restaurante China-Brasil, da rua Luiz Loréa, e um professor da Furg. Os livros presenteados teriam pouca consulta, mas, enfim, pertencem ao acervo internacional da casa.

A direção da biblioteca confirma que o número de volumes em suas prateleiras anda beirando meio milhão. Os livros catalogados vêm aumentando com o trabalho de uma equipe de bibliotecárias e técnicos auxiliares, que, diariamente, alimentam os computadores. Esse número anda por volta de 72 mil, mas isso é uma pequena parte do que ainda há para entrar no sistema de arquivamento digital. Os jornais ainda não estão lançados e há muito a fazer. Esse trabalho pode andar mais rápido se houver mais recursos.

E por falar em arquivo virtual, a biblioteca guarda um CD com a coleção de O Noticiador, o primeiro jornal da cidade publicado entre 1832 e 1836. Francisco Xavier Ferreira, o Chico da Botica, foi seu criador e editor. O dia-a-dia da cidade, da província do Rio Grande do Sul e do período regencial no Brasil aparecem em detalhes. É luz sobre trevas daqueles recuados anos da história. A coleção pertenceu ao povonovense Alfredo Ferreira Rodrigues, que a doou ao Instituto Histórico e Geográfico do RS. Hoje, está no Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa, de Porto Alegre. Essas duas instituições digitalizaram o periódico, agora à disposição dos pesquisadores e dos leitores.

Nessa coleção, há muitas informações inéditas ainda. Uma delas tem a ver com a nossa biblioteca. No número 78, de 8 de outubro de 1832, diz:

...nessa vila (...) tem uma livraria escolhida de três mil e tantos volumes, também particular, mas que seu proprietário a tem tornado pública...

Como sabemos que a biblioteca só surgiria em 1846, com o nome de Gabinete de Leitura, essa "livraria particular de uso público", que já existia há, pelo menos, 14 anos antes, é a prova de que a vila do Rio Grande tomava a iniciativa de sair do atraso cultural, e de forma pioneira na província. Havia caldo de cultura suficiente para que o povo, de quatro mil habitantes, pudesse se adiantar através da literatura e das aulas das titubeantes escolinhas de primeiras letras, que a coleção d’O Noticiador também anuncia.

Até o presente momento, não sabemos se os três mil e tantos volumes da livraria de 1832 foram para o Gabinete de Leitura de 1846, ou qual destinação tiveram após aquele período. Pode ser que alguém, antes de mim, já saiba disso, mas eu continuo pesquisando.

Quando ouço alguém dizer que Rio Grande é uma cidade sem cultura, rebato perguntando: quantas são as cidades do Brasil que têm uma biblioteca, particular e de uso público, com meio milhão de volumes? Quantas têm um teatro e 15 museus? E uma Universidade Federal?

O que sabemos bem é que Rio Grande, em 2010, é uma cidade que oferece ensino e cultura à sua população, através de suas escolas, do ensino fundamental aos cursos superiores; das diversas instituições de cultura, públicas e privadas, nas quais se incluem o Teatro Municipal, o Centro de Cultura e a Escola de Belas Artes, além dos 15 museus. E através da maior e mais antiga biblioteca gaúcha, uma das maiores e melhores do Brasil. ‘O tesouro da cultura rio-grandina’, como costumo chamá-la.

Obrigado a todos (as) que trabalham na Bibliotheca Rio-Grandense e aos que a ajudam. Um agradecimento especial ao também povonovense Leon Coutelle Filho, presidente da casa, e à sua diretoria.

Rio Grande tem um tesouro ao seu dispor. Saber usá-lo e apoiá-lo financeiramente é preciso!
Jornalista e escritor*

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