Grupos Escolares: uma lembrança prazerosa
Iza Aparecida Saliés
Como
muitas meninas da minha época, estudei no antigo Grupo Escolar, fiz parte de
uma geração que obedecia às exigências de uma escola preparada para ensinar a ordem
e o progresso do país.
Pautada
nesse pressuposto pedagógico da época, ou seja, de uma escola tradicional onde
imperava a disciplina, a rigidez impecavelmente exigidas para as alunas e alunos.
Então,
aprendi obedecer, organizar e ser responsável pelos trabalhos, estudos, tarefas
e sabatina, tudo isso, era cobrado rigorosamente pelas professoras e
respaldadas pelas mães, em casa.
Sem dúvida, que esses conceitos, acima
citados, foram fortemente sedimentados em
minha vida, são ensinamentos que permanecem latentes até hoje. Cabe ressaltar, que inegavelmente,
também, contribuíram para a constituição da minha identidade profissional, como também, deu sustentação à trajetória pessoal.
A
modernidade acha que esses pressupostos são decadentes e ultrapassados, mas, confesso que
sempre estou buscando referência nesses ensinamentos, mesmo conhecendo as atuais
concepções teóricas sobre educação e ensino, defendidas pelo movimento
pedagógico contemporâneo.
Grupo
Escolar, escola, que sustentava sua finalidade social, na formação integral dos
alunos, associando o conceito de educação e ensino, assim sendo, articular com
muita propriedade e sincronia esses conceitos também com a aprendizagem.
No
ensino dos chamados grupos escolares, o currículo de ensino era pautado na perspectiva de um currículo com formatação
enxuta, com conteúdos rigorosamente selecionados, e cobrados por parte da
coordenação da escola, com acompanhamento sistemático do Planejamento com o
Plano de Aula do professor.
Esse
currículo atendia também, uma interface com a finalidade de preparar os alunos para
a vida, preparando-os em valores sedimentados socialmente. Sua função era especialmente direcionada ás questões
pedagógicas, ou seja, a de ensinar e de aprender. O entendimento daquele momento era que, educar
era competência da família, e a escola a finalidade de e ensinar e
aprender.
Cabe
neste momento, ressaltar que os antigos grupos escolares dispunham de uma
qualidade de ensino e aprendizagem, inquestionável.
Como
era obrigação dos pais educarem seus filhos, nós chegávamos para estudar, com a
certeza de que teríamos que comportar,
exigiam bons modos, observavam o modo de andar, falar, ou seja, de portar-se,
falar era impossível, pedir para ir ao banheiro?Pior ainda. Mesmo com todo esse
rigor da escola, nós obedecíamos, rezávamos na cartilha do bom
comportamento.
Eu
morava no Proto, bairro antigo da cidade de Cuiabá e os grupos escolares
ficavam no centro, seu nome “Grupo Escolar Barão de Melgaço” funcionava onde
hoje está a Biblioteca Púbica Estevan de Mendonça, prédio histórico, lembra os
idos de 1945.
A
ida para a escola era puro prazer, momento de desfrutar do rico cardápio de
pirulitos, picolés, balas, cacau, suco de saquinho e outras atrações que
ficavam na porta do grupo escolar. O lanche hora do leite, do pão com manteiga,
do bolo vendido na porta do colégio, a queimada, a amarelinha, as brigas, os
acertos.
Lembro
também da hora do sino, da entrada, hora de cantar o hino, a entrada na sala de
aula, sapato boneca, meias três quartas brancas, saias azuis e blusa branca, o
uniforme impecável de limpo e ajeitado no corpo.
É
inenarrável a dedicação das senhoras professoras mulheres dedicadas, deixavam seus
lares para fazer o ofício de ensinar, nobres professoras como a Profª Adelaide
Fortunato, Elizabeth Sena, Eneida Salla, brilhantes profissionais que ensinaram
as primeiras letras e os conhecimentos elementares para o meu letramento
escolar.
Ora
eram professoras ora eram mães, apesar da rigidez e disciplina, componentes
obrigatórios para a formação das escolas da época, exigências do sistema de
ensino, ainda assim, agiam com muito carinho. Professoras que contribuíram fortemente para
minha formação são pessoas que até hoje relembro com muita nostalgia.
Chegávamos
à escola, educados e comportados jamais poderíamos contestar a professora. Como a formação familiar era rígida, então
não havia estranhamento quanto ao comportamento que deveria ter na escola,
assim, ficava fácil para a professora dominar os alunos, e mesmo assim aparecia
de vez em quando, um aluno querendo fazer gracinha, sem muito progresso.
Nos
bons tempos em que a escola era o espaço de respeito, considerado como o templo
do saber, as professoras eram pessoas dotadas de boa vontade, dedicavam parte
do seu tempo em ensinar o melhor, não importava a decoreba, não importava se a disciplina
era rígida, importava sim, com a formação integral da criança.
Assim
foi o primário, mas o ginásio, esse sim, foi menos rígido, não só pelo fato de
estar em outra etapa de ensino, como na década de 70 para 80 já estavam
discutindo a escola nova, e em Cuiabá não foi diferente, pois a universidade
federal esta sendo instalada na capital.
Decorei
muitos pontos, estudei muitas vezes na madrugada, tinha que memorizar rápido
porque as sabatinas eram orais e escritas, tinha ainda as famosas dissertações
dos pontos estudos e dos conteúdos que a professora dava do livro.
Certo
dia a professora Irmã Teresinha Arruda fez uma prova onde tínhamos que falar
tudo que sabíamos sobre a Roma Antiga, na prova tinha que escrever o ponto
inteirinho sem esquecer um detalhe, descrever tudo que eu sabia sobre o tema
sem esquecer se quer um item, não era fácil, mas sabíamos fazer com perfeição.
Outra
exigência da época era a caneta tinteiro, como sou canhota tinha muita
dificuldade para escrever, pois enquanto escrevia de um lado o outro já estava
borrado, e as professoras também tinham dificuldade para lidar comigo, ter
aluno canhoto na sala de aula era um problema para a professora, é como se
fosse trabalhar com aluno deficiente.
As
professoras exigiam perfeição, o combate à rasura, o caderno perfeito, sem
borrão, sem orelha, sem sujeira, sem rasgado, tudo tinha que ser impecável,
eram cobranças que faziam parte da formação do aluno.
A
escola da saudade, a do passado, a escola rígida, arbitrária às vezes, ia, contuidista,
com curricular de ensino elaborado para atender uma minoria, parece não ter
pecado nos seus atos, porque de fato respondia às necessidades da sociedade do
seu tempo.
Essa
escola do passado que hoje criticamos, pela rigidez, pela forma de ensinar, que
os estudiosos da pedagogia denominaram de tradicional, por lidar com o ensino e
a aprendizagem numa perspectiva dura, de cobrança, de disciplina de autoridade,
ainda assim, com todos esses defeitos propiciou aos seus alunos uma formação
escolar de qualidade pelas vias da escola pública.
Agora
convivemos com a chamada escola publica para toda a escola que não pode chamar
atenção do aluno, que não da conta dos conteúdos, que não da conta da formação
de valores, não da conta da educação dos alunos, que não da conta da
diversidade, que não da conta da pluralidade cultural, está ai, precisa mudar,
mas, ainda não achou o seu rumo.
O
modelo de escola que está posto nos dias atuais, precisa romper com essa
fábrica de desigualdade, ocasionando em série a exclusão escolar, por meio dos
subentendidos índices de evasão, repetência e defasagens idade/série e abandono,
que são elevados, conhecidos pelo Sistema Educacional, porém com poucas
perspectivas de solução imediata.
A
dedicação das professoras e a credibilidade que elas inspiravam faziam delas,
pessoas queridas, acolhedoras, de vez em quando passava mão nas nossas cabeças
e dizia cuidado. Pouco a pouco elas iam desenvolvendo a difícil arte de ensinar
com competência, seriedade e compromisso, isso se dava pelo fato de que elas
eram autoridade máxima da sala de aula, sabiam ensinar, estavam sempre
preparadas estudavam os conteúdos da aula, tinha respostas certas para os
alunos.
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