segunda-feira, 15 de janeiro de 2018
Carreira e atratividade da profissão docente: reflexões
Embora o Brasil tenha avançado na Educação, dados como o da Prova ABC
(Avaliação Brasileira do Final do Ciclo de Alfabetizção) confirmam que ainda há
muito a ser feito: a avaliação mostrou que 57,2% dos estudantes do terceiro
ano do Ensino Fundamental não conseguem realizar operações básicas de
Matemática, como somar e subtrair.
A fim de apoiar gestores educacionais na resolução dos problemas que
enfrentam diariamente, a Fundação Itaú Social organizou no dia 05 de
setembro um seminário para discutir o Plano de Carreira do Professor, que
integra o Ciclo de Debates – Gestão Educacional, realizado ao longo do ano
em São Paulo.
Estiveram presentes o consultor da Organização das Nações Unidas (ONU)
e Diretor do Instituto de Governança e Gestão Pública da ESADE
(Barcelona), Francisco Longo; Nelson Marconi, professor e pesquisador da
Fundação Getúlio Vargas; a presidente da União dos Dirigentes Municipais
de Educação (Undime), Cleuza Repulho; e o diretor de Valorização dos
Profissionais de Educação da recém-criada Secretaria de Articulação com os
Sistemas de Ensino (Sase) do Ministério da Educação, Antonio Roberto
Lambertucci.
No discurso de abertura, o vice-presidente da Fundação Itaú Social, Antonio
Matias, foi enfático na importância do professor para uma Educação de
qualidade: “Não existe desenvolvimento sustentável se a Educação não for
prioridade de um país, e o docente é eixo central dessa discussão”.
Mas, afinal, o que é preciso para garantir bons professores?
Durante o seminário, pesquisadores e gestores apresentaram tendências e
boas práticas na área de gestão para tentar encontrar a equação que garante
um corpo docente de qualidade. Uma pesquisa da Fundação Victor Civita
em parceria com a Fundação Carlos Chagas sobre a atratividade da carreira
docente (veja íntegra) revelou que apenas 2% dos jovens do Ensino Médio
indicaram como primeira opção de ingresso a faculdade de Pedagogia ou
Licenciatura.
A atratividade na carreira começa com a valorização do professor. O cargo
precisa ser interessante economicamente para que atraia e retenha talentos,
mas, segundo Francisco Longo, este é apenas um dos elementos, incapaz de
modificar sozinho a Educação de um país. Na Finlândia, os professores não
ganham salários altíssimos, mas gozam de excelente prestígio social, pois a
carreira é muito exigente e concorrida, explicou o espanhol. Portanto, é
preciso ir além: além de um salário satisfatório, os convidados do seminário
indicaram o resgate do prestígio social do professor e a organização de um
plano de carreira para que se reverta o quadro atual.
Plano de Carreira
Todos os presentes no debate concordaram que a estruturação de um plano
de carreira está entre as soluções para o problema da qualidade na
Educação. Hoje mais da metade dos municípios brasileiros não oferecem
essa modalidade, segundo dados do Plano de Ações Articuladas.O Plano
Nacional de Educação (PNE), em tramitação no Congresso, prevê como
meta assegurar, no prazo de dois anos, desses planos para todos os
profissionais do magistério. O diretor de Valorização dos Profissionais de
Educação do Ministério da Educação (MEC), Antonio Roberto Lambertucci,
disse que os municípios estão sendo estimulados a apresentá-los.
Para Francisco Longo, o plano de carreira deve se organizar pautado pela
meritocracia e pela flexibilidade. De um lado, a meritocracia garante a
competitividade e a estabilidade, enquanto a flexibilidade assegura
responsividade, isto é, a capacidade de responder rapidamente, e a
possibilidade de, por exemplo, diferenciar recompensas segundo
desempenho demonstrado. “Profissionalizar o emprego público assegura a
transparência e limita a corrupção, além de melhorar a qualidade de serviço
aos usuários”, enumerou o professor.
O professor da FGV Nelson Marconi, que fez apresentação sobre Gestão
Estratégica de Recursos Humanos no setor público, lembrou uma boa
gestão é capaz de “garantir servidores estimulados para desenvolver seu
trabalho de maneira eficiente a alcançar os resultados ambicionados pela
organização”. Para ele, é preciso estruturar incentivos para possibilitar a
cobrança do resultado que a organização deseja: “Sou a favor do bônus para
os professores, como é feito hoje no Estado de São Paulo”.
Um plano de carreira precisa ter base em critérios de avaliação de
desempenho. Segundo Longo, isso funciona não só como meio de premiar
ou punir os resultados e, portanto, estimular a dedicação dos professores,
mas também como instrumento de análise sobre o que e onde é possível
melhorar. Além disso, o professor também acredita que a mensuração de
trabalho dos professores implicaria o reconhecimento da sua importância:
“As profissões se legitimam sendo avaliadas”, completa.
A presidente da Undime (União Nacional de Dirigentes Municipais de
Educação), Cleuza Repulho, relacionou a falta de perspectiva na carreira de
professor à falta de profissionais qualificados: um a cada cinco professores
da rede pública tem formação insuficiente para exercer a profissão e está,
portanto, em situação irregular.
“As crianças não podem dar sorte ou azar de caírem em uma escola em que
os professores são preparados ou despreparados”, lamentou Cleuza, que
falou sobre os marcos legais da questão salarial no Brasil. Entre eles, a Lei
do Piso (2008), cujo recente julgamento no STF instituiu sua validade para
todo país, rejeitando a alegação de cinco Estados quanto a sua
inconstitucionalidade. O valor atual do piso é de R$ 1.178,14. “Mais
importante do que garantir o piso é garantir carreira aos professores”,
conclui Cleuza.
Por fim, o espanhol Francisco Longo advertiu que a Educação só será
prioridade para os governos quando assim o for para a sociedade.
“Realidade não se muda por decreto. Sem uma cidadania ativa e vigilante
sobre o processo, não conseguiremos avanços”, alertou.
O próximo seminário acontece no dia 28 de novembro, também no Itaú
Cultural. O tema será Diretrizes Curriculares. Para se inscrever ou obter
mais informações, acesse o site da Fundação Itaú Social.
Paulo Renato, o pai da modernidade do ensino brasileiro
por: Equipe do Educar para Crescer
Na história da Educação brasileira, o ex-ministro, criador do Enem e do
Saeb, merece um capítulo à parte, tamanhas as mudanças que soube
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Texto: Marion Frank
Poucos se dedicaram mais à evolução do ensino brasileiro – e, o que é
melhor, com êxito – do que Paulo Renato Souza. Ministro da Educação
durante os dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-
2002), conseguiu dirimir interesses contrários e desavenças políticas de
modo a colocar em marcha as principais mudanças já ocorridas na história
da Educação brasileira. É por isso que se avalia, sem exagero, o nosso
ensino em “antes de Paulo Renato” e “depois de Paulo Renato”.
No lançamento do movimento Educar para Crescer, Roberto Civita e Paulo
Renato Souza.
Vítima de um infarto, ele faleceu, aos 65 anos, na noite de sábado, dia 25,
em São Roque (SP). “Sentiremos muito a sua falta, como amigo, como
companheiro de lutas na frente educacional e como cidadão exemplar”,
declarou Roberto Civita, presidente do Conselho de Administração e diretor
editorial do Grupo Abril.
Nascido em Porto Alegre, Paulo Renato, que era conselheiro do movimento
Educar para Crescer, formou-se em economia na Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. Fez mestrado na Universidade do Chile e doutorado na
Unicamp. Foi na universidade de Campinas que começou a tomar gosto,
por assim dizer, pela Educação, primeiro como professor, depois, como
reitor (1986). Suas qualidades de gestor, no entanto, já haviam sido
colocadas em prática à frente da Secretaria de Educação de São Paulo, no
governo Franco Montoro, em 1984.
“Ele tinha enorme capacidade para aprender questões novas e organizar
propostas ou decisões.” Quem relembra é José Serra, ex-governador e ex-
prefeito de São Paulo, e com quem Paulo Renato trabalhou também como
secretário da Educação (2009-2010). “Sempre conseguia sintetizar o assunto
e fazer uma proposta engenhosa. Sabia negociar com os adversários em
razão de sua atitude de respeito aos outros, paciência infinita e
personalidade cordial, sem falar do espírito prático.” Talentos que
permitiram ao ministro Paulo Renato aprovar, em 1996, a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação que deu partida à criação do Enem (Exame Nacional
do Ensino Médio), prova que procura “incentivar o estudante a aprender a
pensar, a refletir e a ‘saber como fazer’”, como realça o seu estatuto; e o
Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), a primeira
iniciativa de conhecer em profundidade a qualidade dos sistemas
educacionais tanto no Brasil como um todo quanto em suas regiões
geográficas.
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