Jorge Antonio de Queiroz e Silva
“O sábio nada mais é do que o homem que sabe ser lógico consigo mesmo e que outra coisa não faz senão extrair todas as consequências da decisão de viver”. (Michel de Montaigne. Ensaios).
Sou uma pessoa que me contento com pouco: Alimentos saudáveis, caminhadas, boas amizades e a leitura diária.
Porém, quando estou em sala de aula, vivo uma experiência ímpar. A troca de conhecimentos com os adolescentes (turno diurno) e com os adultos (turno noturno) me faz crescer interiormente, por ser algo que supera as limitações humanas.
Fico pensativo quando escuto de um colega que não aguenta mais o trabalho em sala de aula. Por exemplo, na cidade do Recife-PE, numa palestra entre universitários, uma estudante me falou: as crianças não aceitam a minha opinião, não sei o que fazer.
Disse a ela: Talvez esteja aí o problema. Acredito que não devemos impor nossas ideias ou valores como verdades absolutas; a realidade do outro ou o parecer do outro deve sempre ser levado em conta. Indiquei a leitura do livro Grandes nomes da história intelectual, organizado por Marcos Antônio Lopes, editado pela Contexto, 2003. O livro, que possui 544 páginas, conduz o leitor a um passeio pelo pensamento intelectual ao longo do tempo. É uma leitura imperdível!
Entre as páginas 223 e 254, Plínio Junqueira Smith aborda Sobre o ceticismo de Montaigne. Já Newton Bignotto aborda Montaigne e o Renascimento. Estas duas leituras, com certeza, possibilitarão reflexões sobre conceitos do imaginário docente.
Para Montaigne, segundo Smith, o objetivo da educação é fazer com que a criança desenvolva sua capacidade de reflexão crítica e de julgamento. Os indivíduos não devem impor suas próprias opiniões. Quando a criança aceita as outras opiniões, depois de elas mesmas julgá-las, fará delas suas próprias ideias.
Montaigne, por várias vezes, mostra as inconveniências de se deixar levar pela voz comum e recomenda a autonomia do pensamento, a via da razão, conforme está explicitado na página 230: “Julgar de acordo com a voz comum é tudo o que a educação preconizada por Montaigne quer evitar. A criança deveria submeter toda matéria ao entendimento e ao exercício de suas capacidades racionais. Simplesmente admitir uma opinião, apenas porque seus pais ou preceptores lhe disseram, ou porque estão escritas em um livro, não é aprender, mas somente memorizar”.
Em Montaigne, o estímulo à liberdade de pensamento é mais intenso, se comparado com Nicolau de Cusa e Maquiavel, pois ele viveu plenamente o espírito do Renascimento. Conforme explica Bignotto, “Montaigne vê no mundo um campo infinito para seu desejo de saber. Longe de querer aprisioná-lo numa rede conceitual coerente e fixa, ele se deixa levar pela multiplicidade de cores e sabores das coisas, na esperança de que essa atenção produza subitamente uma nova compreensão dos objetos enfocados. Pouco importa que às vezes esse movimento fracasse, pois, nos limites de uma vida, sempre haverá algo de novo a interessar uma mente livre e destituída de preconceitos”.
Considerações - Estudar o pensamento de Montaigne é provocante. Ele impulsiona a realizar uma viagem pela essência do ser, estimula a procura da sabedoria. Montaigne, no livro Ensaios (iniciado em 1572 e concluído em 1588), diz:
“Nós podemos chegar a ser cultos com conhecimento de outros homens, mas nós não podemos ser sábios com sabedoria de outros homens”.
Ao contrário de seguir os padrões da sociedade, que impõe valores e conceitos, muitos deles contrários à consciência, Montaigne fala de uma filosofia da libertação do pensamento. Nesta, cada ser humano, em sua individualidade, se descobre e vive segundo sua consciência; não rotulado, mas livre.
P.S. Além de Montaigne, o livro Grandes nomes da história intelectual retrata Foucault, Montesquieu, Rousseau, Norbert Elias, Gilberto Freire, entre outros.
Jorge Antonio de Queiroz e Silva
queirozhistoria@uol.com.br
Historiador, palestrante e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.
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