Considerando todos os níveis de governo, o Brasil
gastou, em 2010, cinco vezes mais com alunos no Ensino Superior do que nos
Ensinos Básico e Médio
Nos últimos dez anos, o Brasil elevou de forma expressiva os gastos públicos
com Educação, que somaram 5,8% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010, quando se
consideram despesas diretas municipais, estaduais e federais com Escolas
públicas (97% do total) e subsídios às famílias no Ensino privado (3%), em
contas da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Em proporção do PIB, o percentual é equivalente à média dos países que compõem a OCDE, de 5,8%, e até maior do que em países reconhecidos pela qualidade do Ensino, como Estados Unidos (5,5%), Espanha (5%) e Coreia (4,9%), sempre considerando gastos públicos em instituições públicas de Ensino e bolsas em instituições privadas.
Quando esse número é ajustado para levar em consideração o tamanho da economia, o número de Alunos, o nível de Ensino e, principalmente, quando se olha para os resultados que o país tem obtido em provas internacionais, o que parece grande fica pequeno. Por Aluno, os 5,8% do PIB brasileiro se transformam em gasto anual de US$ 2.964, muito abaixo da média dos países da OCDE, de US$ 8.332.
De novo, contudo, a despesa por estudante esconde a realidade, pois o Brasil continua gastando muito mais no Ensino superior e muito menos no Ensino básico, apesar de haver melhorado essa "divisão".
Considerando todos os níveis de governo, o Brasil gastou, em 2010, US$ 2.653 por Aluno nos Ensinos básico e médio, e cinco vezes mais no Ensino superior, com US$ 13.137 por estudante.
No Ensino básico, o país está quase na lanterna entre os 34 países da OCDE (e muito abaixo da média de US$ 8.412), enquanto, no Ensino superior, dez países gastam mais que o Brasil por Aluno, e a média é de US$ 11.382.
Para especialistas em Educação e em contas públicas, a pior notícia desses números é que, mais do que gastar pouco, o Brasil gasta mal os recursos destinados à Educação. Entre 2008 e 2013, as despesas com Educação subiram, em média, 82% nas capitais, 70% nos Estados e 122% na União, em termos nominais.
No mesmo período, a inflação acumulada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 39,6%, já considerando a alta de 5,86% do índice em 2013, prevista pelo mercado no boletim Focus do dia 24 de junho.
No Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), prova da OCDE destinada a avaliar habilidades de leitura, matemática e ciências, o Brasil atingiu nota média de 401 pontos em 2009, 33 pontos a mais do que em 2000. Embora tenha sido um dos maiores aumentos de nota observados entre os países que participam da prova, o Brasil segue em 53º lugar no ranking de 65 países, atrás de Chile e México, que investem 4,1% e 5,3% do PIB em Educação, respectivamente.
Diante das manifestações que tomaram as cidades brasileiras nas últimas semanas, com bandeiras que demandam mais recursos para saúde e Educação, a Câmara aprovou a destinação dos royalties do pré-sal para essas duas áreas. O Senado também se comprometeu a votar antes do recesso parlamentar, em meados de julho, o Plano Nacional de Educação (PNE), que entre outras metas estabelece que 10% do PIB sejam destinados para Educação, o que significa praticamente dobrar recursos para o setor.
Para economistas e estudiosos da Educação, no entanto, apenas elevar gastos direcionados para a área pode não resultar em melhora da qualidade do serviço prestado à população, caso não venham acompanhados de mudanças estruturais, como valorização da carreira de Professor, redefinição de etapas do Ensino, implementação de metas e bonificação de bons Professores e Escolas, por exemplo. Ainda assim, argumentam, para equiparar o Ensino público brasileiro ao de países desenvolvidos, e elevar o gasto por Aluno, será preciso investir uma parcela maior do PIB para fazer frente às defasagens históricas no Ensino do país.
Priscila Cruz, diretora-executiva do Todos Pela Educação, diz que não é possível dar um salto de qualidade na Educação brasileira sem investir mais, já que o país tem uma população jovem e precisa ainda fazer o trabalho de qualificação que outras economias fizeram no século passado. A questão, afirma Priscila, é que o aumento de recursos tem de vir acompanhado de boa gestão e excelência na implementação de políticas públicas.
Caso contrário, é possível elevar recursos sem ter contrapartida na qualidade. Um exemplo está no Ensino médio, afirma. Os recursos para Educação nessa faixa dobraram em dez anos. Ainda assim, apenas 10% dos Alunos apresentam nível de aprendizado condizente com a sua série, mesmo patamar observado há dez anos.
Nesse caso, embora tenham aumentado os recursos, o desenho equivocado do Ensino médio brasileiro, que tem 13 matérias obrigatórias fixas, enquanto em diversos outros países o currículo é flexível, travou avanços significativos no aprendizado, diz Priscila. "Ou o financiamento vem acompanhado de reformulação, ou podemos desperdiçar os investimentos a mais."
Mansueto Almeida, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), faz diagnóstico semelhante. No curto prazo, segundo ele, é fácil ceder ao apelo de elevar recursos para áreas como o Ensino público, mas a discussão está começando pelo lado errado. "A melhoria do serviço não é uma questão de curto prazo e depende de reformas institucionais, com investimento em treinamento e qualidade dos Professores, políticas de bônus para os funcionários e Escolas com melhor desempenho", diz.
É uma dinâmica diferente dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, que dependem majoritariamente de aumento da despesa e têm impacto quase imediato. O aumento do gasto para 7% ou 10% do PIB, diz, deveria ser resultado desse rearranjo na condução das políticas públicas, e não uma meta por si só. "Para elevar a qualidade da saúde e da Educação, o aumento do gasto sozinho pode resultar em desperdício de recursos."
A essas críticas, Naércio Menezes Filho, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, adiciona a má distribuição de recursos. "Hoje, um Aluno do Ensino superior recebe seis vezes mais recursos do Estado do que um Aluno da Educação infantil."
A necessidade de priorizar o ciclo básico de Educação, em detrimento do superior, é um dos pontos consensuais entre os especialistas ouvidos pelo Valor. O Brasil tem avançado nesse caminho. Em 2000, pelos dados compilados pela OCDE, o Brasil destinava 2,4% do PIB para o Ensino básico (fundamental e médio), percentual que cresceu para 4,3% do PIB dez anos depois. Na mesma comparação, entre 2000 e 2010, a parcela destinada ao Ensino superior passou de 0,7% para 0,9%.
Para Menezes, a perenidade das políticas públicas ao longo de administrações distintas é um caminho para garantir resultados melhores, como no caso do Ceará. São duas políticas que, de certa forma, independem dos recursos. "Apenas transferir recursos não resolve a questão", diz.
O grande volume investido na área resultou em aumento das notas no Índice de Desenvolvimento da Educação básica (Ideb) em todos os ciclos. Ainda assim, mesmo onde o desempenho melhorou mais, nos anos iniciais do Ensino fundamental (que avalia o desempenho dos Alunos da 5ª série), a nota no Ensino público (4,7 pontos) continua distante da obtida no Ensino privado, que é de 6,5 pontos. Quanto mais elevado o nível de Ensino, maior a discrepância.
Outro indicador importante, que mede a distorção idade-série entre Alunos do Ensino médio (adolescentes mais velhos em séries em desacordo com a sua idade), recuou de 44,8% para 32,8% entre 2007 e 2011, mas segue elevada tanto por causa do ingresso tardio na Escola quanto por causa das taxas ainda altas de repetência e abandono Escolar.
Ana Maria Barufi, economista do Bradesco, avalia que são necessários anos de investimento forte no setor para que a qualidade do aprendizado melhore. Nelson Cardoso Amaral, Professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), também avalia que avanços importantes foram feitos na última década, e que não são percebidos pelo Ideb. "Mudanças substanciais em processos educacionais são lentos. Mesmo com recursos substanciais, a melhora da qualidade pode não aparecer de imediato." A capacidade de aprendizado do Aluno, diz o Professor da UFG, também depende de melhora do perfil socioeconômico da população e de investimento em infraestrutura, para equipar Escolas com bibliotecas, quadras e laboratórios.
Segundo Amaral, a partir da evolução desses outros indicadores, é possível passar a focar em elevar a qualidade do Ensino. O momento para isso é agora, enquanto o Brasil ainda pode capacitar a população e aproveitar o que resta do bônus demográfico. Além disso, há a expectativa de ingresso de recursos para a área com os royalties da exploração de óleo no pré-sal.
Apenas esses recursos não serão suficientes para elevar o investimento público em Educação para 10% do PIB, o que significa dizer que a sociedade precisará fazer escolhas. Priscila, do Todos Pela Educação, afirma que é preciso que os recursos que ingressarão nos cofres públicos carimbados para a Educação não sejam mal aproveitados. Os royalties do pré-sal, diz, poderiam ser usados para elevar os salários dos Professores. Apesar da expectativa de que a quantia somará mais de R$ 200 bilhões nos próximos anos, Priscila afirma que não seriam suficientes para equiparar o salário dos Professores do Ensino fundamental e médio aos salários médios dos profissionais de outras áreas, o que tornaria a carreira na Educação mais competitiva.
Amaral também afirma que apenas o pré-sal será insuficiente para elevar o porcentual destinado à Educação para 10% do PIB e avalia que outras medidas serão necessárias, como a redefinição do destino das contribuições existentes, estabelecimento de novas contribuições e levar União, Estados e municípios a gastar mais do que o mínimo constitucional com a área.
Para Mansueto, do Ipea, o debate no Brasil é sempre "aditivo". Ou seja, a cada nova demanda da sociedade, aumenta-se a carga tributária para acomodar a reivindicação. Hoje, no entanto, a carga tributária do país é uma das maiores do mundo e o debate precisará se dar em torno do mix de gastos do governo. "Ou vamos discutir se estamos dispostos a mudar a regra do salário mínimo, por exemplo, ou a resposta vai ser mais carga tributária, mais dívida ou mais inflação", afirma.
Só orçamento maior não garante melhor nível de aprendizado
O debate em torno da necessidade de mais recursos para Educação é questão controversa no Brasil. Há algum consenso, no entanto, sobre o fato de que apenas aumentar os gastos no setor não garantirá aprendizado efetivo dos Alunos, na avaliação do coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, Naércio Menezes Filho.
A aplicação de recursos não é condição essencial para melhora da qualidade do Ensino, segundo Menezes. O principal exemplo, diz, é o Ceará, cujo orçamento estadual da Educação cresceu abaixo da inflação entre 2008 e 2013, para R$ 2,5 bilhões. Ainda assim, o Estado é um dos que mais se destacam no Índice de Desenvolvimento da Educação básica (Ideb). Com um gasto anual por Aluno de R$ 2.666,08, a nota do Ensino médio cearense no indicador passou de 3,3 para 3,7 entre 2005 e 2011.
"No início, investimos na ideia da gestão eficiente e de resultados um pouco intuitivamente, hoje temos resultados", diz o secretário-adjunto de Educação do Ceará, Maurício Holanda Maia. "Foi preciso romper com argumentos universitários e ideológicos de determinados grupos, uma visão que tende a taxar de neoliberalismo qualquer busca de eficiência."
Maia reconhece que depende muito de repasses federais para implementar as políticas educacionais do Estado. O maior exemplo é Educação profissional: o governador Cid Gomes (PSB) buscou o máximo de recursos do programa federal Brasil Profissionalizado, do Ministério da Educação (MEC), e conseguiu sair de um patamar de pouco mais de duas centenas de matrículas em 2008 para mais de 35 mil em 2013, com abertura de Escolas técnicas por todo o Estado.
Menezes, do Insper, também atribui parte dos bons resultados recentes a uma iniciativa do governo do Estado. No Ceará, 25% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) repassado para os municípios depende dos índices de Educação, saúde e ambiente locais. Os resultados da avaliação da Alfabetização no 2º ano, e do aprendizado no 5º ano do ciclo básico, entram com maior peso.
"É uma iniciativa que gera resultados, porque como os prefeitos necessitam de recursos, precisam fazer um esforço adicional para melhorar a Educação, e passaram a perseguir políticas públicas mais estáveis", afirma Menezes. Para ele, a iniciativa poderia ser replicada em outros Estados e até pela União, como já acontece nos Estados Unidos, com o programa "Race to the Top", que associa repasse de recursos federais à indicadores na área da Educação.
O exemplo de Santa Catarina mostra que mais gastos, se bem aplicados, também resultam em maior qualidade do aprendizado. O orçamento educacional do Estado foi o que mais cresceu nominalmente em todo o país, alta de 135% entre 2008 e 2013, de R$ 1,5 bilhão para R$ 3,5 bilhões. Nos anos iniciais do Ensino fundamental, por exemplo, o Estado marcou, em 2011, 5,7 pontos no Ideb, 0,6 ponto percentual acima da meta estabelecida para o ano, que era de 5,1 pontos.
O Estado também vem sendo bem-sucedido ao reduzir a taxa de Analfabetismo, que era de 7,4% da população com 15 anos ou mais em 1995, e passou para 3,9% em 2011, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio.
Para Cleuza Repulho, secretária municipal de Educação de São Bernardo do Campo (SP) e presidente da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime), avanço econômico está claramente relacionado com avanço educacional. "O exemplo claro disso é perceber a pequena melhora da maioria dos municípios brasileiros que dependem de repasses para tocar as políticas de todas as áreas", diz Cleuza. "Com os repasses na Educação, eles conseguem melhorar. Mas com a chegada de recursos significativos, como esperamos do petróleo ou da maior participação da União no financiamento da Educação, é possível ir além da melhora, é possível, de fato, avançar, dar saltos", afirma a secretaria.
Para Cleuza, na Educação, gestão e financiamento não são processos separados. O projeto de lei do Plano Nacional de Educação (PNE) que tramita no Senado, diz ela, tem metas claras, quantitativas e qualitativas, sobre como gastar os novos recursos da Educação.
"Tem muito trabalho de gestão aí. Além disso, temos um levantamento que mostra que os secretários municipais de Educação no Brasil têm uma formação cada vez mais técnica, a maioria tem formação superior, carreira na gestão pública. Nas capitais, muitos são ex-reitores de universidades. Conhecem bem a demanda da Educação de suas cidades", afirma Cleuza, para quem os recursos dos royalties do petróleo devem focar três pontos: "Salário decente, para atrair o jovem para o magistério, carreira com formação continuada, para manter a qualificação do quadro, e infraestrutura Escolar".
Fonte: Valor Econômico 04/07/2013
Em proporção do PIB, o percentual é equivalente à média dos países que compõem a OCDE, de 5,8%, e até maior do que em países reconhecidos pela qualidade do Ensino, como Estados Unidos (5,5%), Espanha (5%) e Coreia (4,9%), sempre considerando gastos públicos em instituições públicas de Ensino e bolsas em instituições privadas.
Quando esse número é ajustado para levar em consideração o tamanho da economia, o número de Alunos, o nível de Ensino e, principalmente, quando se olha para os resultados que o país tem obtido em provas internacionais, o que parece grande fica pequeno. Por Aluno, os 5,8% do PIB brasileiro se transformam em gasto anual de US$ 2.964, muito abaixo da média dos países da OCDE, de US$ 8.332.
De novo, contudo, a despesa por estudante esconde a realidade, pois o Brasil continua gastando muito mais no Ensino superior e muito menos no Ensino básico, apesar de haver melhorado essa "divisão".
Considerando todos os níveis de governo, o Brasil gastou, em 2010, US$ 2.653 por Aluno nos Ensinos básico e médio, e cinco vezes mais no Ensino superior, com US$ 13.137 por estudante.
No Ensino básico, o país está quase na lanterna entre os 34 países da OCDE (e muito abaixo da média de US$ 8.412), enquanto, no Ensino superior, dez países gastam mais que o Brasil por Aluno, e a média é de US$ 11.382.
Para especialistas em Educação e em contas públicas, a pior notícia desses números é que, mais do que gastar pouco, o Brasil gasta mal os recursos destinados à Educação. Entre 2008 e 2013, as despesas com Educação subiram, em média, 82% nas capitais, 70% nos Estados e 122% na União, em termos nominais.
No mesmo período, a inflação acumulada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 39,6%, já considerando a alta de 5,86% do índice em 2013, prevista pelo mercado no boletim Focus do dia 24 de junho.
No Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), prova da OCDE destinada a avaliar habilidades de leitura, matemática e ciências, o Brasil atingiu nota média de 401 pontos em 2009, 33 pontos a mais do que em 2000. Embora tenha sido um dos maiores aumentos de nota observados entre os países que participam da prova, o Brasil segue em 53º lugar no ranking de 65 países, atrás de Chile e México, que investem 4,1% e 5,3% do PIB em Educação, respectivamente.
Diante das manifestações que tomaram as cidades brasileiras nas últimas semanas, com bandeiras que demandam mais recursos para saúde e Educação, a Câmara aprovou a destinação dos royalties do pré-sal para essas duas áreas. O Senado também se comprometeu a votar antes do recesso parlamentar, em meados de julho, o Plano Nacional de Educação (PNE), que entre outras metas estabelece que 10% do PIB sejam destinados para Educação, o que significa praticamente dobrar recursos para o setor.
Para economistas e estudiosos da Educação, no entanto, apenas elevar gastos direcionados para a área pode não resultar em melhora da qualidade do serviço prestado à população, caso não venham acompanhados de mudanças estruturais, como valorização da carreira de Professor, redefinição de etapas do Ensino, implementação de metas e bonificação de bons Professores e Escolas, por exemplo. Ainda assim, argumentam, para equiparar o Ensino público brasileiro ao de países desenvolvidos, e elevar o gasto por Aluno, será preciso investir uma parcela maior do PIB para fazer frente às defasagens históricas no Ensino do país.
Priscila Cruz, diretora-executiva do Todos Pela Educação, diz que não é possível dar um salto de qualidade na Educação brasileira sem investir mais, já que o país tem uma população jovem e precisa ainda fazer o trabalho de qualificação que outras economias fizeram no século passado. A questão, afirma Priscila, é que o aumento de recursos tem de vir acompanhado de boa gestão e excelência na implementação de políticas públicas.
Caso contrário, é possível elevar recursos sem ter contrapartida na qualidade. Um exemplo está no Ensino médio, afirma. Os recursos para Educação nessa faixa dobraram em dez anos. Ainda assim, apenas 10% dos Alunos apresentam nível de aprendizado condizente com a sua série, mesmo patamar observado há dez anos.
Nesse caso, embora tenham aumentado os recursos, o desenho equivocado do Ensino médio brasileiro, que tem 13 matérias obrigatórias fixas, enquanto em diversos outros países o currículo é flexível, travou avanços significativos no aprendizado, diz Priscila. "Ou o financiamento vem acompanhado de reformulação, ou podemos desperdiçar os investimentos a mais."
Mansueto Almeida, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), faz diagnóstico semelhante. No curto prazo, segundo ele, é fácil ceder ao apelo de elevar recursos para áreas como o Ensino público, mas a discussão está começando pelo lado errado. "A melhoria do serviço não é uma questão de curto prazo e depende de reformas institucionais, com investimento em treinamento e qualidade dos Professores, políticas de bônus para os funcionários e Escolas com melhor desempenho", diz.
É uma dinâmica diferente dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, que dependem majoritariamente de aumento da despesa e têm impacto quase imediato. O aumento do gasto para 7% ou 10% do PIB, diz, deveria ser resultado desse rearranjo na condução das políticas públicas, e não uma meta por si só. "Para elevar a qualidade da saúde e da Educação, o aumento do gasto sozinho pode resultar em desperdício de recursos."
A essas críticas, Naércio Menezes Filho, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, adiciona a má distribuição de recursos. "Hoje, um Aluno do Ensino superior recebe seis vezes mais recursos do Estado do que um Aluno da Educação infantil."
A necessidade de priorizar o ciclo básico de Educação, em detrimento do superior, é um dos pontos consensuais entre os especialistas ouvidos pelo Valor. O Brasil tem avançado nesse caminho. Em 2000, pelos dados compilados pela OCDE, o Brasil destinava 2,4% do PIB para o Ensino básico (fundamental e médio), percentual que cresceu para 4,3% do PIB dez anos depois. Na mesma comparação, entre 2000 e 2010, a parcela destinada ao Ensino superior passou de 0,7% para 0,9%.
Para Menezes, a perenidade das políticas públicas ao longo de administrações distintas é um caminho para garantir resultados melhores, como no caso do Ceará. São duas políticas que, de certa forma, independem dos recursos. "Apenas transferir recursos não resolve a questão", diz.
O grande volume investido na área resultou em aumento das notas no Índice de Desenvolvimento da Educação básica (Ideb) em todos os ciclos. Ainda assim, mesmo onde o desempenho melhorou mais, nos anos iniciais do Ensino fundamental (que avalia o desempenho dos Alunos da 5ª série), a nota no Ensino público (4,7 pontos) continua distante da obtida no Ensino privado, que é de 6,5 pontos. Quanto mais elevado o nível de Ensino, maior a discrepância.
Outro indicador importante, que mede a distorção idade-série entre Alunos do Ensino médio (adolescentes mais velhos em séries em desacordo com a sua idade), recuou de 44,8% para 32,8% entre 2007 e 2011, mas segue elevada tanto por causa do ingresso tardio na Escola quanto por causa das taxas ainda altas de repetência e abandono Escolar.
Ana Maria Barufi, economista do Bradesco, avalia que são necessários anos de investimento forte no setor para que a qualidade do aprendizado melhore. Nelson Cardoso Amaral, Professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), também avalia que avanços importantes foram feitos na última década, e que não são percebidos pelo Ideb. "Mudanças substanciais em processos educacionais são lentos. Mesmo com recursos substanciais, a melhora da qualidade pode não aparecer de imediato." A capacidade de aprendizado do Aluno, diz o Professor da UFG, também depende de melhora do perfil socioeconômico da população e de investimento em infraestrutura, para equipar Escolas com bibliotecas, quadras e laboratórios.
Segundo Amaral, a partir da evolução desses outros indicadores, é possível passar a focar em elevar a qualidade do Ensino. O momento para isso é agora, enquanto o Brasil ainda pode capacitar a população e aproveitar o que resta do bônus demográfico. Além disso, há a expectativa de ingresso de recursos para a área com os royalties da exploração de óleo no pré-sal.
Apenas esses recursos não serão suficientes para elevar o investimento público em Educação para 10% do PIB, o que significa dizer que a sociedade precisará fazer escolhas. Priscila, do Todos Pela Educação, afirma que é preciso que os recursos que ingressarão nos cofres públicos carimbados para a Educação não sejam mal aproveitados. Os royalties do pré-sal, diz, poderiam ser usados para elevar os salários dos Professores. Apesar da expectativa de que a quantia somará mais de R$ 200 bilhões nos próximos anos, Priscila afirma que não seriam suficientes para equiparar o salário dos Professores do Ensino fundamental e médio aos salários médios dos profissionais de outras áreas, o que tornaria a carreira na Educação mais competitiva.
Amaral também afirma que apenas o pré-sal será insuficiente para elevar o porcentual destinado à Educação para 10% do PIB e avalia que outras medidas serão necessárias, como a redefinição do destino das contribuições existentes, estabelecimento de novas contribuições e levar União, Estados e municípios a gastar mais do que o mínimo constitucional com a área.
Para Mansueto, do Ipea, o debate no Brasil é sempre "aditivo". Ou seja, a cada nova demanda da sociedade, aumenta-se a carga tributária para acomodar a reivindicação. Hoje, no entanto, a carga tributária do país é uma das maiores do mundo e o debate precisará se dar em torno do mix de gastos do governo. "Ou vamos discutir se estamos dispostos a mudar a regra do salário mínimo, por exemplo, ou a resposta vai ser mais carga tributária, mais dívida ou mais inflação", afirma.
Só orçamento maior não garante melhor nível de aprendizado
O debate em torno da necessidade de mais recursos para Educação é questão controversa no Brasil. Há algum consenso, no entanto, sobre o fato de que apenas aumentar os gastos no setor não garantirá aprendizado efetivo dos Alunos, na avaliação do coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, Naércio Menezes Filho.
A aplicação de recursos não é condição essencial para melhora da qualidade do Ensino, segundo Menezes. O principal exemplo, diz, é o Ceará, cujo orçamento estadual da Educação cresceu abaixo da inflação entre 2008 e 2013, para R$ 2,5 bilhões. Ainda assim, o Estado é um dos que mais se destacam no Índice de Desenvolvimento da Educação básica (Ideb). Com um gasto anual por Aluno de R$ 2.666,08, a nota do Ensino médio cearense no indicador passou de 3,3 para 3,7 entre 2005 e 2011.
"No início, investimos na ideia da gestão eficiente e de resultados um pouco intuitivamente, hoje temos resultados", diz o secretário-adjunto de Educação do Ceará, Maurício Holanda Maia. "Foi preciso romper com argumentos universitários e ideológicos de determinados grupos, uma visão que tende a taxar de neoliberalismo qualquer busca de eficiência."
Maia reconhece que depende muito de repasses federais para implementar as políticas educacionais do Estado. O maior exemplo é Educação profissional: o governador Cid Gomes (PSB) buscou o máximo de recursos do programa federal Brasil Profissionalizado, do Ministério da Educação (MEC), e conseguiu sair de um patamar de pouco mais de duas centenas de matrículas em 2008 para mais de 35 mil em 2013, com abertura de Escolas técnicas por todo o Estado.
Menezes, do Insper, também atribui parte dos bons resultados recentes a uma iniciativa do governo do Estado. No Ceará, 25% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) repassado para os municípios depende dos índices de Educação, saúde e ambiente locais. Os resultados da avaliação da Alfabetização no 2º ano, e do aprendizado no 5º ano do ciclo básico, entram com maior peso.
"É uma iniciativa que gera resultados, porque como os prefeitos necessitam de recursos, precisam fazer um esforço adicional para melhorar a Educação, e passaram a perseguir políticas públicas mais estáveis", afirma Menezes. Para ele, a iniciativa poderia ser replicada em outros Estados e até pela União, como já acontece nos Estados Unidos, com o programa "Race to the Top", que associa repasse de recursos federais à indicadores na área da Educação.
O exemplo de Santa Catarina mostra que mais gastos, se bem aplicados, também resultam em maior qualidade do aprendizado. O orçamento educacional do Estado foi o que mais cresceu nominalmente em todo o país, alta de 135% entre 2008 e 2013, de R$ 1,5 bilhão para R$ 3,5 bilhões. Nos anos iniciais do Ensino fundamental, por exemplo, o Estado marcou, em 2011, 5,7 pontos no Ideb, 0,6 ponto percentual acima da meta estabelecida para o ano, que era de 5,1 pontos.
O Estado também vem sendo bem-sucedido ao reduzir a taxa de Analfabetismo, que era de 7,4% da população com 15 anos ou mais em 1995, e passou para 3,9% em 2011, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio.
Para Cleuza Repulho, secretária municipal de Educação de São Bernardo do Campo (SP) e presidente da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime), avanço econômico está claramente relacionado com avanço educacional. "O exemplo claro disso é perceber a pequena melhora da maioria dos municípios brasileiros que dependem de repasses para tocar as políticas de todas as áreas", diz Cleuza. "Com os repasses na Educação, eles conseguem melhorar. Mas com a chegada de recursos significativos, como esperamos do petróleo ou da maior participação da União no financiamento da Educação, é possível ir além da melhora, é possível, de fato, avançar, dar saltos", afirma a secretaria.
Para Cleuza, na Educação, gestão e financiamento não são processos separados. O projeto de lei do Plano Nacional de Educação (PNE) que tramita no Senado, diz ela, tem metas claras, quantitativas e qualitativas, sobre como gastar os novos recursos da Educação.
"Tem muito trabalho de gestão aí. Além disso, temos um levantamento que mostra que os secretários municipais de Educação no Brasil têm uma formação cada vez mais técnica, a maioria tem formação superior, carreira na gestão pública. Nas capitais, muitos são ex-reitores de universidades. Conhecem bem a demanda da Educação de suas cidades", afirma Cleuza, para quem os recursos dos royalties do petróleo devem focar três pontos: "Salário decente, para atrair o jovem para o magistério, carreira com formação continuada, para manter a qualificação do quadro, e infraestrutura Escolar".
Fonte: Valor Econômico 04/07/2013
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