domingo, 18 de março de 2012

LINGUAGEM VERBAL E APRENDIZAGEM

Ana Simone Moia Sampaio

Resumo
Tendo como objetivo investigar e compreender a “expressão da linguagem verbal” como evento mediador do pensamento, uma vez que está estreitamente relacionado com a constituição do sujeito em sua forma mais elementar: a comunicação, tenho observado pessoas em seus ambientes de trabalho, cujas dificuldades em articular pensamento e linguagem são significativas. Ao se depararem com situações mais complexas, que solicitam um grau mais elaborado de expressão verbal, fracassam por não conseguirem expressar seus pensamentos de forma organizada, os quais exigem organização complexa de funções verbais e cujas origens estão estreitamente relacionadas ao processo de aprendizagem, bem como aqueles relacionados à autonomia do sujeito em diversos aspectos. Autonomia essa entendida como a capacidade do sujeito resolver seus problemas de um modo particular, autônomo e diferenciado, ou seja, possibilitando-se ser único, ator e autor da sua própria história.

Palavras-chave:
Psicopedagogia, linguagem, sujeito aprendente, expressão verbal, comunicação.
Linguagem e Cognição

Os sujeitos destacados, ao se depararem com situações que envolvam desafios e novas aprendizagens, não se autorizam a aprender, ou seja, não se permitem entrar em contato com o objeto de conhecimento, limitando-se a modelos prontos e rotineiros. Ao vivenciarem situações atípicas no ambiente de trabalho, não conseguem improvisar ou manifestar atitudes assertivas. Existe sempre a dúvida, até mesmo com relação às atividades que executam a tempo, assim a atividade do pensar e da expressão verbal está limitada à cópia, prejudicando a autoria de pensamento, atuando o sujeito como ator, àquele que representa ou copia.

Assim, muitas vezes os sujeitos fracassam por não conseguirem expressar seus pensamentos de forma organizada, sujeitando-se ao fracasso social e a sofrimentos constantes. Algumas hipóteses podem estar envolvidas neste processo de desenvolvimento da comunicação:
? A dificuldade de expressão verbal pode estar relacionada a fatores emocionais.
? Sendo a linguagem verbal um sistema de representação, a dificuldade pode estar relacionada com a falta de compreensão.
? A falta de estímulos é um fator importante para o desenvolvimento da linguagem verbal, podendo surgir déficits na linguagem expressiva.

Sob essa ótica, é importante ressaltar que a linguagem é um instrumento humano bastante valioso, seu desenvolvimento passa por etapas e inclui aprendizagem. Aprendizagem neste contexto, entendida como humana, portanto envolve comunicação que é conseguida através das relações e estas são construídas individualmente, conforme as necessidades, oportunidades e possibilidades de cada indivíduo.
A evolução da linguagem começa nas primeiras semanas de vida, ou seja, através do afeto, das intenções, dos sons articulados, da alimentação, ela se torna objeto de aprendizagem, portanto, crianças que não são estimuladas em suas atividades diárias, suas brincadeiras, escassez de respostas às suas perguntas, privação de experiências, poderão futuramente ter problemas relativo à expressão verbal.

Luria postula que na medida em que a criança se desenvolve, o significado das palavras evolui, assim como o pensamento, as transformações são dinâmicas e não estáticas. A palavra no início da vida da criança tem um caráter afetivo, é motivada e relacionada ao afeto. A criança pequena ao se expressar oralmente, manifesta suas sensações agradáveis e desagradáveis. Sua expressão é espontânea e origina-se das emoções e dos impulsos. Um pouco mais tarde, já na fase pré-escolar e no início da fase escolar toma lugar as impressões concretas sobre a experiência direta real e prática. O sentido das palavras representa a percepção concreta que se tem das coisas. Somente após essas fases começam a surgir por trás das palavras os sistemas complexos, ou seja, torna-se possível não só perceber as coisas, como também refletir, tirar conclusões, deduções das impressões imediatas, com base no raciocínio. Capacidades mentais complexas como abstração, classificação, diferenciação, categorização, etc, são características desta fase. Em outras palavras, o sujeito passará utilizar as palavras abstratamente, os objetos não são mais evocados na condição imediatista perceptiva e sim conceitual e racional enriquecendo os conhecimentos até então adquiridos. Assim os limites da inteligência sensório-motora são ultrapassados, proporcionando uma série de operações que se elevam ao nível abstrato.

O aprendizado das formas de expressão da linguagem verbal se dá por processo regrado e bastante complexo, devendo-se respeitar o ritmo próprio e individual de cada sujeito, além de envolver um mediador, aquele que transmitirá conhecimentos e proporcionará aprendizagens, corroborando com Andrade, segundo ela, toda aprendizagem envolve um ensinante e um aprendente, bem como um vínculo entre eles, sem o qual, ou se inadequado, não há possibilidade de construção de um mundo organizado, trazendo desta forma perturbações e complicações no decorrer de todas as fases de desenvolvimento, inclusive na fase adulta. O papel do aprendente inclui permitir-se ser único e diferenciado; um ser que deseja e se permite criar, este deve ser ator de seu próprio pensamento, permitir-se entrar em contato com a realidade e com as pessoas. Esse contato acontece primeiramente com a mãe depois com os outros, é nas primeiras relações com a mãe que se estabelecem os primeiros vínculos afetivos, como sentimento de confiança e as primeiras gratificações e frustrações. Assim o desafio de aprender e se expressar oralmente e volitivamente vai se desvelando e o conhecimento se constrói a partir do conhecimento do outro, isto é, do ensinante. Do ensinante requer confiança e possibilidades de aprendizagens, sem as quais transtornos poderão ocorrer na vida do aprendente.

Neste contexto, a linguagem verbal representa os conceitos, as formas de organização do real, atua como mediadora entre o sujeito e o objeto de conhecimento, ou seja, o universo de significações permite construir e interpretar o mundo real, bem como a construção de significados pelo sujeito através do pensamento.

Considerando os sujeitos citados inicialmente, como adultos e que aparentemente já conquistaram durante o processo da ontogênese a experiência através da comunicação com os adultos, ou seja, já passaram pelas etapas do desenvolvimento da linguagem, inclusive a instrução formal e, aparentemente já atingiram a forma mais elaborada da linguagem verbal: a comunicação formal, conclui-se que o processo de desenvolvimento da linguagem expressiva se articula numa posição subjetiva, atribuindo todo o vivido a uma causalidade inteligível, sendo necessário que se estabeleça um interjogo entre as relações que o sujeito mantém entre os significados e sua maneira de agir e pensar, cuja interação pode ter características normais ou patológicas.

O psicopedagogo em sua totalidade irá trabalhar com o aprendente para ensinar-lhe a lidar com suas, frustrações, decepções, essa ligação é muito importante, pois fará com que o indivíduo se reconheça e assuma um estilo próprio.


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Publicado em 27/11/2007 15:04:00
Currículo(s) do(s) autor(es)
Ana Simone Moia Sampaio - (clique no nome para enviar um e-mail ao autor) - Pós-Graduada em Psicopedagogia Clínica e Mestranda em Psicologia da Educação pelo Centro Universitário FIEO – Osasco
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