Estamos convivendo, diariamente, com situações de revolta de alunos contra professores nas salas de aula. Aquele respeito de veneração que existia no passado pelos mestres hoje se tornou raro. Professores trocam sua profissão por outras, por medo. Há algo que se poderia fazer nas escolas tendo em vista melhorar as relações entre alunos e professores? O objetivo deste artigo é refletir, a partir de viagens realizadas por um professor de Educação Física a aldeias indígenas, sobre a sensibilidade indígena relatada em entrevista.
Acostumado à “bagunça” rotineira nas escolas não indígenas, George Luiz Alves Barbosa, que faz parte do Conselho da Alimentação (merenda) Escolar do Estado do Paraná, representando a educação, relata ter estado nas escolas indígenas de Laranjeiras do Sul, Nova Laranjeiras e Palmas e ter se maravilhado com a sensibilidade observada nos alunos indígenas:
[...] Geralmente a gente chega à sala de aula e pergunta para os alunos como está a merenda. E foi nesse momento que nós vimos que a educação dos alunos indígenas é fantástica. O professor que trabalha lá não tem estresse devido a bagunças. Interessante que não são somente as crianças. Os adultos que estudam línguas estrangeiras manifestam o mesmo respeito. É aquele silêncio total. [...] É possível notar na organização de uma fila, na hora de receber o alimento, em sala de aula, nas atividades das várias salas e no lazer, como vi nas salas em que entrei, eles queriam fazer tudo o que era passado para eles.
Por conta dessa postura de respeito diante de outras pessoas, pela sensibilidade resultante da prática de suas normas educacionais internas, às vezes têm dificuldades de fazer perguntas. “Os professores me disseram que é necessário incentivá-los bastante para que perguntem”, conta o professor George Barbosa.
Perguntei ao professor: Qual seria a origem dessa educação e sensibilidade indígena? Sua opinião é que embora os Kaingangues falem um pouco mais que os Guaranis, ambas as etnias praticam a reflexão: “A gente percebe que eles pensam, refletem bastante e têm muita sabedoria, têm até certa dificuldade de expressar essa sabedoria, pelo menos conosco”.
Quais os aspectos positivos e negativos, então, quanto à escola indígena? Na sua opinião,
[...] nas escolas indígenas existem poucos alunos por sala de aula, eles são mais educados e, no contexto geral, parece bem melhor trabalhar lá do que nas escolas dos não índios, porque, embora os educadores me disseram que eles têm dificuldades relativas ao ensino-aprendizado na escola, quando participei das reuniões de pais, que por coincidência estava acontecendo lá, observei que é maciça a participação deles na escola, então eles também, em casa, contribuem, embora a gente encontre por aí afora pais vendendo artesanato com as crianças junto, consequentemente não vão à escola. É algo a ser visto.
Além da participação dos pais na educação dos filhos, o cacique exerce o seu papel, o que deixou o professor George admirado: “[...] Também as lideranças, os caciques, participam da educação. Para alguém sair da aldeia, é necessário pedir a autorização do cacique. Se o professor quiser trabalhar na escola tem que ter uma carta de anuência do cacique”.
Embora se saiba que as circunstâncias das escolas indígenas e não indígenas são diferentes, bem como seus contextos, perguntei-lhe: A que se pode atribuir a indisciplina existente nas escolas da sociedade não indígena na sua opinião? Respondeu-me:
[...] No mundo capitalista, em que o pai e a mãe precisam sair para trabalhar e acabam deixando os filhos em casa, quem cuida é a sociedade. [...] A criança passa quatro horas e pouco na escola e se encontra com os pais, geralmente, só no comecinho da noite. Diante de um afastamento do convívio familiar, a criança acaba se desequilibrando.
Sabe-se que são muitas as causas da indisciplina escolar, as quais, inclusive, podem ser identificadas em diversos estudos científicos, alguns disponíveis na internet. Por outro lado, se poderia aproveitar para pensar que o hábito da prática da reflexão das etnias indígenas possibilita a criação de condições de respeito pelo Outro. Tal procedimento desencadeia também uma relação de respeito dos professores em relação aos alunos. E também dos visitantes, pois o professor George Barbosa diz reconhecer que o silêncio deles é fruto da reflexão e da sabedoria.
Jorge Antonio de Queiroz e Silva
queirozhistoria@uol.com.br
Historiador, palestrante e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.
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