terça-feira, 28 de agosto de 2012

A felicidade deve ser conquistada e alimentada; faça o teste e saiba se você é uma pessoa feliz

Rosana Faria de Freitas
Do UOL, em São Paulo

Acreditando ou não na felicidade, você pode batalhar para rechear sua vida de momentos únicos e especiais

O tema é amplo, ‘enorme’, quase inesgotável: o que é a felicidade? Mesmo considerando que dá muito pano para manga, podemos tentar condensar dizendo que é um estado de bem-estar singular, diferente para cada um, que ajuda a pessoa a sustentar a alegria de viver.

“Está relacionada com o desejo que vai além da vontade, além da necessidade. O ser humano se aproxima dela quando vive seus sonhos, realiza seus projetos de vida, consegue amar”, explica Araceli Albino, psicanalista, graduada e doutoranda em psicanálise, presidente do Sindicato dos Psicanalistas do Estado de São Paulo.

É fato: existe uma grande variedade de conceitos e definições de felicidade. Muito já foi falado e escrito sobre o tema, mas não há uma definição absoluta do que seja – talvez porque signifique algo diferente para cada indivíduo.

“Gosto de pensar na ideia de felicidade como uma disposição, um estado de espírito. Algo dinâmico, que tem a ver com a maneira como nos relacionamos com a vida”,
destaca Marília Castello Branco, psicóloga e escritora, terapeuta dos setores de adolescentes e mulheres do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Universidade Federal de São Paulo (Proad/Unifesp).

Seria, então, a capacidade de viver plenamente, em um estado de serenidade, realização, satisfação e plenitude, “apesar dessa incompletude que é inerente à experiência humana”. Tal disposição, acredita a médica, nos habilita a aproveitar todas as vivências de maneira positiva, proporcionando o aprimoramento pessoal.


Para muitos, ela não existe

Pronto, agora você já sabe o que é a felicidade. Simples, assim? A verdade é que não. Se pensarmos nela como um estado permanente de alegria, deleite, prazer e ausência de sofrimento, veremos que é impossível de alcançar.

“A tristeza, a dor, a frustração – tudo isso faz parte da vida e é necessário para o desenvolvimento da nossa personalidade. O ser humano é imperfeito, incompleto, e a vida nos proporciona inúmeras dificuldades, limitações, doenças, perdas. É preciso crescer, amadurecer, descobrindo que não se é onipotente e aprendendo a lidar com tais condições”, salienta Marília.

Há quem defenda que a felicidade simplesmente não existe – como Sigmund Freud, o criador da psicanálise. Para ele, o homem é um incansável caçador do prazer e, cada vez que tem de renunciar a ele, isso lhe custa muito e é dificílimo suportar a frustração, o que o deixa distante da felicidade.

“Segundo essa teoria, nós só podemos ter satisfação parcial. A completude, a perfeição e o contentamento total não existiriam, pois sempre há falhas pelo caminho, a falta de alguma coisa que para nós é primordial”, reflete Araceli Albino.

Desalentador? Nem tanto. Acreditando ou não na felicidade plena, você pode batalhar para rechear sua vida de momentos únicos, especiais, aprazíveis. Veja, abaixo, algumas reflexões e atitudes que podem dar uma força nessa busca. Aproveite também para fazer o teste acima e ver como anda seu grau de felicidade.

Pensamentos que ajudam a chegar lá

Não aceite os modelos impostos pela sociedade. De acordo com as convenções atuais, está bem na fita quem tem corpo talhado, roupas de grife, carro de último tipo e outras aquisições que sustentam valores como status e poder. “Tais prazeres estão ao alcance de todos, basta ter dinheiro para comprá-los, o que acaba gerando uma grande ilusão. Se a pessoa não os obtém, é como se não pudesse ser feliz. Trata-se de um desejo insaciável, baseado na falsa teoria de que a felicidade pode ser comprada, e não conquistada”, diz a psicanalista Araceli Albino

Entenda que o sofrimento faz parte da vida. Procure, então, forças para lidar com as questões desagradáveis que surgirem, resolvendo-as sem se perder, sem deixar de caminhar para frente com disposição. “Não dá para esperar apenas gozo, realizações, alegrias. As dores fazem parte e nos impulsionam a crescer, evoluir”, salienta a psicanalista. “Tais sentimentos são necessários porque nos levam a um estado de introversão e profundidade. Dessa forma, paramos e olhamos para dentro de nós mesmos. Alguém que se sente o tempo todo alegre está numa condição defensiva, superficial, evitando entrar em contato consigo”, completa a psicóloga Marília Castello Branco

Aproveite os momentos infelizes para crescer. Refletir sobre os revezes, entender por que aconteceram, buscar soluções com dignidade e não se revoltar – tudo isso ajuda, e muito. Na maioria das vezes, sofrer é abrir as portas para evoluir e melhorar como ser humano. “É interessante observar que muitas pessoas que passaram por situações limite de doenças graves ou perdas extremas relataram que tais vivências, embora devastadoras, tiveram impacto positivo. E que, depois delas, se tornaram mais plenos”, observa Castello Branco

Tenha autoestima. E, atenção, isso não significa se achar o máximo – quem pensa assim na verdade está se defendendo contra sentimentos de inferioridade. Para gostar de si mesmo, é essencial se reconhecer como ser humano, acatar suas limitações e perdoar suas falhas e seus fracassos

Exercite o desapego. Acredite, de verdade, que qualquer pessoa pode ser feliz com menos, ou com pouco. Um armário abarrotado de roupas – muitas delas que você não usa há um tempão – não é nem um pouco decisivo para a sua felicidade. Exercendo a abnegação, você pode cultivar uma das qualidades mais nobres que existe, a generosidade. “Vivemos em uma cultura consumista que propõe a busca incessante pelo prazer através das coisas, da satisfação imediata dos desejos. É por isso que vemos, nas últimas décadas, um grande aumento de doenças que têm a ver com impulsos – como os transtornos alimentares e as dependências químicas e não químicas”, diz a psicóloga, que recomenda um freio nessa ânsia que parece não ter fim.

Conviva com pessoas. A sensação de pertencimento é importante para o homem. Fazer parte de uma família, um grupo, uma comunidade traz segurança e a impressão reconfortante de ser compreendido.

Faça algo pelo outro. “Frequentemente, doar-se traz mais satisfação do que uma conquista voltada para si mesmo”, defende Castello Branco. Ela acredita que, à medida que desenvolvemos a auto-estima e aprendemos a cuidar dos outros e não apenas de nós, acabamos nos tornando mais capazes de lidar com nossas carências e aceitar as limitações como parte da condição humana. “A angústia e a solidão tendem a ser relativizadas.”

Busque o autoconhecimento. Saber identificar seus sentimentos, suas capacidades e seus limites lhe permitirá avaliar as situações para fazer as melhores escolhas. “Alguém que não compreende a si mesmo fica perdido, sempre em compasso de espera, adiando decisões. Há um desgaste constante de energia para nada, é o mesmo que água que corre pelo ralo – o que, consequentemente, trará mais momentos infelizes”, sustenta Albino. O autoconhecimento fortalece o indivíduo para lidar com os inevitáveis insucessos. Ele resolve as questões difíceis de uma maneira simples, sem tentar mudar o que não é possível. “Em resumo, leva a pessoa a viver a realidade, resolvendo o que é preciso e usufruindo os prazeres que tem".

Não sacrifique sua própria felicidade em detrimento de ninguém. Nem dos filhos. “Tal ato não tornará as crianças mais felizes. Apenas irá ensiná-las de que a busca pela felicidade é algo menor, que se deve e pode abrir mão. Se quer vê-las bem, o mais valioso é mostrar, pelo exemplo, o quanto essa luta é válida para quem está disposto a isso. Provavelmente, eles farão o mesmo”, diz Castello Branco

Pense que a felicidade não é obrigatória. “Nem todo mundo quer ser feliz. Muitas pessoas não acreditam que isso existe. Outras têm medo, e existem até as que encontram prazer no sofrimento. A felicidade, como a liberdade, não pode ser obrigatória”, assegura Castello Branco

Procure ajuda, caso se sinta perdido em relação ao tema. “Um sujeito eternamente insatisfeito e mal humorado pode estar sofrendo de depressão”, diz a psicóloga, observando que nossa cultura privilegia muito a extroversão. “A introversão passa a ser algo indesejado. E a tristeza, que é um sentimento natural e necessário, acaba se transformando em uma patologia.” Vale citar também a ansiedade, comum em uma sociedade que cobra tanto pelo desempenho. “Tem a ver com o medo. Enquanto o depressivo vive no passado, na culpa pelo que vivenciou, o ansioso vive no futuro, antecipando e temendo o que vai acontecer. Isso pode ser muito angustiante”
Recorra a atividades que proporcionam realização e dão sentido à existência.

Especialmente as voltadas para o desenvolvimento pessoal, como psicoterapia, vivências espirituais, meditação

Por fim, acredite que não existe milagre, nem um livro de receitas. A felicidade é algo que precisa ser conquistado, e cultivado. “Se tiver que ser a qualquer preço, sem ética, será só uma manifestação da insatisfação, da agressividade interior. É preciso investir em algo bom, construtivo, que fará com que você se sinta realizado com suas ações e seus afetos. O sentido da vida é singular, de cada um, então é preciso se questionar sempre e ir atrás de respostas que irão pautar suas escolhas.

Só assim teremos mais momentos plenos e uma vida saudável”, enfatiza Albino. “A busca precisa ser feita dentro de nós mesmos. Paradoxalmente, a pessoa feliz é também aquela que consegue entrar em contato com o sofrimento”, finaliza Castello Branco

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