quarta-feira, 29 de agosto de 2012

A violência na escola e a novela da Globo


Por Maria Odete, em 20 de abril de 2009.

Antonio Caloni e Duda Nagle, caracterizados como César e Zeca

Num estudo que realizei sobre a construção simbólica da violência em nossas televisões (e que pretendo publicar ainda este ano), ficou evidente a “química” existente entre o telespectador e a televisão, quando um determinado assunto monopoliza a sua atenção. Conscientes disso, óbvio, as emissoras usam e abusam de vários recursos e tecnologias para fazer a manipulação de diversas linguagens, sejam visuais, sonoras ou interpretativas, justamente para captar a sua atenção. Quando um determinado programa consegue isso você “prega o olho” e não troca de canal.

Fiz essa contextualização para entrar no assunto da reportagem sobre a violência na escola, que foi ao ar dia 18/04/09, no programa Educação e Cidadania. Na verdade, não existem estatísticas desta violência, as escolas encobrem as ocorrências (e aqui me refiro a escolas públicas e privadas também) e os pais são capazes de bater no professor que disser que o seu filhinho ou sua filhinha são tremendos arruaceiros em sala de aula. Mas a violência na escola ou nas escolas de Santa Catarina, existe sim. Em muitas delas, como o Forquilhão de São José, os educadores admitem a sua existência, debatem o assunto com os estudantes, pais e até criaram um Código de Convivência, por estarem se tornando insustentáveis as brigas das oitavas séries.

O que dizem os educadores

1) Conversar abertamente com os estudantes ajuda muito. De um debate realizado só entre os professores e os alunos no auditório do Centro Educacional no início do ano, alunos baderneiros se desculparam publicamente e garantiram que ajudariam a reverter o quadro nos intervalos, onde acontecem as maiores brigas;

2) A direção do Centro Educacional, resolveu também fazer acordos com os alunos mais problemáticos. Troca de turmas e até turnos das aulas estão entre as providências;

Aulas de boullying em rede nacional

Mas todos foram enfáticos em criticar a novela da Globo (Caminho das Índias), pela prática da violência do aluno Zeca (Duda Nagle) e as atitudes permissivas do seu pai, o advogado mau-caráter César Gallo, personagem de Antonio Calloni .

Todos entendem a atitude na escritora Glória Perez em mostrar como é a prática do boullying (que em Santa Catarina rendeu a lei 14.651 sancionada pelo governador Luís Henrique no início desse ano) e acreditam que lá no final da novela ocorrerão punições…em um capítulo. Enquanto isso, em rede nacional aulinhas de truculência do pitboy Cesar acobertado pelo paizão mau-caráter em pequenas doses, semana a semana, mês a mês no período de duração da novela, vão “fazendo” a cabeça da garotada que adora ver brigas na escola (Vide orkut. Escreva as palavras brigas na escola e surpreenda-se ou não).

“O que é violência para você?”

Assim o professor e antropólogo Theóphilos Rifiotis (coordenador do Levis/UFSC), iniciou sua aula da disciplina Antropologia das Violências e dos Conflitos: a construção do perigo e da sujeira, no curso de Ciências Sociais da UFSC.

Aquela foi uma aula onde mais nos indagamos do que obtivemos respostas. Seria a violência um julgamento? Quando um pai bate num filho, ele está sendo violento ou como justificam alguns pais, apenas tentando educar aquela criança, já que “a vida irá bater” nela de várias formas? Quando é mesmo que a mulher é vítima? Seriam as marcas de vários hematomas no rosto ou corpo da mulher espancada pelo marido? E como classificar as mulheres que verbalmente agridem e humilham seus maridos no dia-a-dia pela incapacidade deles em conseguir emprego, sustentar a família ou de estarem apáticos ou incapacitados sexualmente e que em contrapartida recebem agressões físicas? Violência é isso?

Prosseguindo com este raciocínio, não seria a violência um problema social justamente porque o senso comum a considera apenas do ponto de vista da indignação, da negatividade, da criminalidade e como problema a ser resolvido?

Quando colocamos certas questões “pequenas”, aparentemente banais, como as que acabamos de formular, relacionadas a dúvidas do senso comum e que justificam a razão da existência de páginas policiais, percebemos que pela dificuldade que temos em dar um significado sobre o que é violência, pela falta de visibilidade de um significado, ela, a violência, se transforma num receptáculo de qualquer significação. E justamente por causa dessa invisibilidade é que a violência seria o ponto cego da sociedade.

Para os educadores é aqui que mora o problema quando são avaliadas não somente a postura e dinâmica dos alunos em sala de aula, mas todo o entorno sócio cultural da origem deles e principalmente o contexto familiar. Para as emissoras, dentro dos critérios políticos de concessão e por uma ótica estritamente comercial, altos índices de audiência, uma grande e oportuna polêmica e um tremendo negócio. Bem-vindos ao debate!



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