Aprender e Imitar
"Nossa imaginação é capaz de criar nossos maiores problemas existenciais, mas incapaz de resolver mesmo o menor deles..."
Autor: Jon Talber[1]
Observar tudo aquilo que já foi construído, nos ajuda a refletir sobre aquilo que não nos serve, embora seja ainda prática comum Há sem dúvida, uma condição onde o homem possa finalmente transcender seus problemas existenciais. Não havendo essa condição, a vida como nós a conhecemos, perde completamente o sentido, uma vez que teremos que viver sem paz e em conflito enquanto existir sobre a terra o homem. Se de um lado existe um conhecimento capaz de organizar nossa vida material, por outro lado, nossos problemas de origem psicológica se perpetuam sem indicação alguma que possam ser erradicados a partir desse conhecimento, a qualquer tempo, agora ou num futuro incerto.
E temos diante de nós grandes problemas; a complexidade dos conflitos entre indivíduos, o sofrimento humano, a miséria em suas múltiplas formas, a ausência de uma transformação psicológica no homem, uma mutação em sua mentalidade, mesmo depois de passados tantos anos, desde sua primeira incursão sobre essa terra. Embora com o passar de tantas civilizações o homem tenha progredido ao lidar com a transformação do mundo concreto à sua volta, psicologicamente ele continua como era ao dar os seus primeiros passos; inseguro, temeroso do futuro, pleno de todas as formas de sofrimento e violência, incapaz de compartilhar por igual o mundo onde vive com o seu próximo.
É imaturo de nossa parte, quando imaginamos que o tempo, resolverá por si mesmo os nossos problemas existenciais. Basta olhar nosso passado. Basta retroceder no tempo, e teremos como resposta um homem que ciclicamente se repete, conservando assim seus conflitos, suas preocupações com a morte e a vida, sem conseguir se libertar de suas angústias mais primárias, como o medo de ficar só, suas ansiedades, e o medo de perder tudo. A raiz "Medo" continua a fazer parte dos seus dias, desde o tempo quando ainda era um animal, menos racional do que o é hoje em dia.
Então estamos diante de um quadro que se repete, porque nós somos o meio através do qual ele se recicla permanentemente, e desejamos saber por que esse homem, depois de tanto progresso científico obtido, ainda não consegue ser feliz, viver em paz e livre do todo o antagonismo que acompanha seus passos através das gerações.
Quando se observa o mundo atual, a relação entre as pessoas, logo questionamos o porquê de tanto conflito, especialmente quando isso de alguma forma nos afeta. E olhando mais de perto, vemos que os problemas são sempre os mesmos. Fazendo uma reflexão, perceberemos que quando chegamos ao mundo, os problemas já existiam; apenas vivenciados por outros que viveram antes de nós; as mesmas questões, repassadas de geração em geração, como uma herança genética, se podemos admitir que exista uma genética social capaz de se reciclar ao longo do tempo.
Não inventamos a forma da relação humana, nem o modo de vida, nem as normas, regras e padrões da tradição, nem os dogmas e conceitos filosóficos que já existiam antes de nascermos. Assim, quando chegamos, nos transformamos então numa espécie de via de retransmissão de todos esses caracteres. Não temos escolha, assim como também não tiverem nossos pais, e aqueles antes destes, pois uma criança de berço, não pode escolher, e acima de tudo, possui uma mente que já foi concebida para imitar tudo que acontece dentro do espectro dos seus sentidos. É um processo involuntário esse condicionamento primário, e dele só podemos nos dar conta, passados muitos anos depois.
O fato é que psicologicamente fomos inteiramente construídos pelos conceitos existentes nesse mundo, somos enfim, uma réplica viva dessas idéias e ideais, das crenças e desejos que fazem parte da vida dessa humanidade. Tanto nossos desejos são comuns, que há a possibilidade de sermos atendidos, e isso evidentemente só é possível, se outros antes de nós, já possuíam desejos semelhantes. Não há desejo novo, nem idéia nova, mas apenas um veículo novo expressando as mesmas coisas de antes. Muda-se o tom das palavras, criam-se palavras novas para designar coisas antigas, e o indivíduo novo que repete os velhos modelos, imagina estar criando coisa nova.
Confunde-se a capacidade cerebral, o poder de adaptação do nosso cérebro ao meio onde vivemos, com aprendizado e inteligência. Viver de conformidade com os padrões já definidos como postura individual, requer apenas saber imitar, e isso nosso cérebro sabe fazer como ninguém, afinal, imitar é sua função. É uma extraordinária máquina de imitar, a mais perfeita jamais existente. Não só imita, como também memoriza tudo que se presta a imitar. Na verdade o processo seletivo, a ilusão de que podemos escolher conforme sejam nossas preferências, ocorre muito depois do processo de memorização involuntária, onde imitamos mesmo sem saber o porquê, uma vez que se trata de um simples mecanismo de sobrevivência do animal que somos.
Imitamos inicialmente para sobreviver ao mundo, e depois, construída uma base sólida de memórias, o que reflete toda nossa experiência de vida, achamos que já podemos escolher conforme sejam nossas preferências, esquecendo-nos, porém, que todo o lastro que constitui a base de onde podemos elaborar nossas preferências e opiniões, foi construída pelo mundo e repassada para nós. Não há nada de novo, nada que verdadeiramente seja nosso, nos pertença, de nossa autoria, é tudo imitação, adequação, ou meios de adaptação. O mundo nos construiu, e todo o nosso trabalho tem sido até então, apenas levá-lo adiante, como ele é, com suas distorções e incapacidade de transformar-nos como seres humanos. Somos enfim, a expressão viva desse mundo, o meio através do qual ele ganha vida, se perpetua, como se fosse um imenso organismo vivo.
Um animal é domesticado através do hábito de imitar, e isso requer uma mente simples. Será também esse nosso destino inflexível? Se objetivamente formos capazes de perceber essa realidade, o fato de que, nem o mundo, nem o tempo é capaz de transformar psicologicamente o homem, de modo que ele seja capaz de, por si mesmo, livrar-se da prisão do sofrimento, resta-nos refletir qual a ação necessária para que isso seja possível. Se esperarmos pelo tempo, não teremos a possibilidade de ver mudança alguma, uma vez que os milhares de anos que já passaram sem que a mudança ocorresse, não apontam nessa direção. Todas as reformas possíveis, sociais e religiosas já foram tentadas, e no máximo, isso apenas muda as características materiais das sociedades, enquanto que o homem psicológico permanece no mesmo ponto; medroso, angustiado, à espera de uma segurança, de um milagre que nunca encontra.
Se nos conformarmos em apenas seguir e imitar aquilo que já existe, aquilo que atravessa os séculos condicionando todos os homens, sem contudo resolver seu problema existencial, não resta esperança alguma para nós. Nosso destino já está selado no berço, embora não saibamos disso. Nem a criatividade, nem o conhecimento, nem a melhor imaginação humana foi capaz de por a termo seu sofrimento e angústias mais simples, como por exemplo, o medo. Isso ocorre simplesmente porque só somos capazes de reproduzir o que já existe, e toda nossa criatividade reside em modificarmos a aparência externa de uma ou outra coisa existente, e isso, definitivamente não é mudança.
Se nunca aprendemos a lidar com nossas angústias primárias, estados emocionais que nos afetam internamente, deve ser porque tudo que sabemos a nosso respeito é superficial e falso. Se de fato nos conhecêssemos, já teríamos resolvido a questão. Sabemos sobre nós, o que dizem que somos; mas o que dizem que somos, nossa estética externa, representa apenas um personagem de momento, dos muitos que somos, criados conforme sejam as circunstâncias, exigências, do mundo. Somos tantas coisas, a depender da influência do dia, e ao mesmo tempo, nenhuma delas. Logo o que aparentamos ser, que é a base de onde os outros nos analisam, não reflete uma verdade. Assim, somos o que nos dizem para ser; aceitamos, e assim seguimos em frente, sem identidade, sem vontade própria, sem originalidade.
Se refletirmos sobre tudo isso, resta-nos então descobrirmos o que somos, mas não sem antes, esquecermos tudo que já foi dito sobre nós; essa coisa de personalidade. Trata-se de uma descoberta pessoal, ou não é descoberta. Se não descobrirmos por nós mesmos, nunca descobriremos, estaremos apenas copiando, imitando, aceitando a opinião de outros. Se nós não nos conhecemos, imagine aceitar que outros sejam capazes de fazer isso por nós. É infantil e absurdo, pois apenas nós temos essa possibilidade, e no máximo, de fora, apenas podemos ter a conscientização de que esse é um caminho possível, nada mais. Conhecer a si mesmo é uma jornada nova, já que estamos a descobrir o novo, o ser oculto e desconhecido que somos nós mesmos.
Autor: Jon Talber
Veja mais detalhes sobre o autor nas notas abaixo.
email: jontalber@gmail.com
sábado, 13 de agosto de 2011
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