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No comando da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação por quatro anos e oito meses, Maria do Pilar Lacerda deixou o cargo no mês de janeiro, quando o ministro Aloizio Mercadante assumiu a pasta. Pilar afirma que há pelo menos dois desafios na educação brasileira que não foram enfrentados como deveriam enquanto esteve no governo porque não houve "tempo e pernas suficientes": a mudança do currículo e projeto pedagógico e a criação de padrões mais ousados de escola.
"É necessário romper o padrão da sala de aula, da carteira uma atrás da outra, do professor transmissor da informação. Há interesse do MEC pensar novos padrões de construção, mas sempre aliados a um novo projeto pedagógico", diz Pilar.
Quem assumiu a Secretaria de Educação Básica foi Cesar Callegari, integrante do Conselho Nacional de Educação. Pilar diz que sua saída não era prevista. "Esses cargos são de confiança, o chefe muda e ele quer compor sua equipe. A transição foi muito tranquila, cordial e civilizada. Por coincidência, [Cesar] Callegari além de ser meu amigo, é uma pessoa que admiro muito."
A Secretaria de Educação Básica é o órgão do MEC que zela pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Seus dois principais norteadores são a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e o Plano Nacional de Educação (PNE).
Confira abaixo principais trechos da entrevista:
G1 - Qual é o principal desafio que fica para o novo secretário de Educação Básica do MEC?
Maria do Pilar Lacerda - Ainda é necessário garantir a qualidade na educação para todos. Hoje temos 52 milhões de alunos da rede pública no Brasil. É um trabalho que começa na educação infantil até melhorar e tornar o ensino médio mais adequado à juventude. Nesse sentido, fizemos várias ações com o Pró Infância, a Provinha Brasil, a Olimpíada da Língua Portuguesa, a formação de professores... Agora o desafio que fica é tocar e aprofundar esses projetos e aperfeiçoar os que precisam.
G1 - Quais foram os principais projetos implantados durante sua permanência no ministério?
Pilar - Digo que tive muita sorte porque assumi o cargo no momento da consolidação do Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação] e do lançamento do PDE [Plano de Desenvolvimento da Escola] junto com o Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica]. Eles nortearam meu trabalho e da minha equipe, nos sabíamos as políticas a serem feitas. Criamos a Provinha Brasil de matemática e de português e os programas de literatura norteados pelas metas do Ideb. O presidente Lula efetivamente priorizou a educação, então os projetos apresentados pelo ministro [Fernando Haddad] foram aprovados e tocados com muito entusiasmo. A educação básica nunca tinha tido um espaço relevante dentro do MEC e passou a ter após essa mudança política e da própria sociedade. Foram quatro anos de trabalho exaustivo, mas também um período de formação grande profissional e política. Nas reuniões de diretoria e de coordenadores da secretaria dizia sempre: estamos aqui porque existem escolas e nós temos de garantir o direito de aprender de cada criança. Então não podíamos esquecer que a nossa política tinha de rebater positivamente dentro da escola.
G1 - Hoje temos quase quatro milhões (3.853.317 mais especificamente) de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos fora da escola. Como resolver este problema?
Pilar - Nesse total há crianças de 4 e 5 anos e jovens de 15 e 17. Não digo que o número é bom, é um número sério, mas a partir de 2016 com a emenda constitucional 59, a matrícula na educação infantil e no ensino médio será obrigatória. Agora temos quatro anos para preparar as redes públicas de ensino para receber esse contingente.
G1 - O ensino médio brasileiro apresenta grandes índices de abandono e evasão. Somente um pouco mais da metade (50,2%) dos estudantes concluem esta etapa na idade considerada ideal. Como mudar este cenário?
Pilar - Fizemos o projeto do Ensino Médio Inovador que começou com 300 escolas e esse ano vai atingir 2.000. Ele tem todo o potencial para transformar o ensino médio. Vinte por cento da carga horária é optativa, outros 20% é destinado a atividades de leitura, uma hora a mais por dia... Agora a questão é que nós precisamos cada vez mais fazer com que o vestibular pare de ser a 'cadeia' [no sentido de prisão] do ensino médio, por isso o Enem é tão importante para a educação básica, já que representa a possibilidade de flexibilizar o currículo do ensino médio. Por isso a necessidade de que o Enem se fortaleça e ganhe mais credibilidade.
G1 - Mas a série de erros e falhas do Enem não podem colocar este objetivo em risco?
Pilar - Se olharmos as últimas três edições do Enem nós temos problemas que são esperados, mas não fizeram o exame perder a credibilidade. Tanto que o número de alunos que se inscreve cresce a cada ano. O que temos de fazer é mostrar e provar que há um compromisso efetivo do governo em evitar que aconteçam mais erros. O Enem tem de se consolidar para ter impacto na melhoria do ensino médio e na democratização de acesso ao ensino superior. O Enem vai dar oportunidade para que o ensino médio se torne mais crítico, mais reflexivo, mais aprofundado, a partir do momento que o vestibular tradicional for desaparecendo.
G1 - Qual sua opinião sobre o Plano Nacional de Educação?
Pilar - Gosto do plano, mas me preocupam algumas questões a respeito da inclusão. Defendo ardorosamente a inclusão das crianças com deficiência nas escolas regulares. Acho transformador ainda mais para as crianças que não têm deficiência. Eu só fui conhecer uma pessoa com síndrome de Down quando tinha 14 anos. Me pergunto: onde estavam as crianças? Isso me privou da oportunidade de conviver com a diferença. Claro que a inclusão das crianças com deficiência deve ocorrer nas escolas que têm estrutura para isso. Isto é a vivência da democracia e a prática é fundamental.
G1 - Vai sentir saudades do MEC? Quais são seus planos profissionais?
Pilar - Vou sentir saudades das pessoas do MEC. Quero continuar envolvida com a educação pública, mas de uma maneira mais 'light'. Vou voltar para Belo Horizonte, onde sou professora da rede municipal e fui por dez anos secretária municipal de educaçã
segunda-feira, 5 de março de 2012
'Temos de romper o padrão da sala de aula', diz ex-secretária do MEC
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