Prof ª. Sonia Aparecida Menegaz Thomaz de Aquino
Sete da manhã. Marilda tinha acabado de passar um pano nas carteiras toscas, depois de varrer a sala de terra batida. Daqui a pouco as crianças começariam a chegar, vindas dos sítios das redondezas. O sol, já meio alto, deixava antever que o dia seria quente.
Fazia oito meses que lecionava naquela escolinha rural. No início teve receio de lidar com crianças de diversas idades, mas eram todos tão bonzinhos e interessados em aprender que a tarefa ficou mais fácil. Temera ainda não se acostumar com a vida no campo, com a falta de conforto, mas logo se adaptar, tanto que nem se lembrava mais da agitação da cidade.
Simplesmente adorava lecionar. Vibrava quando seus alunos apresentavam progressos ou quando se lembravam dela com um pequeno mimo.
As primeiras crianças foram chegando. Zuleica e Soleco, filhos de seu Lindolfo, eram sempre os primeiros, com sua matula guardada na trouxinha de pano.
Começou a aula. Marilda notou que o Tonho não tinha vindo. No dia anterior também não viera. Isso a deixava triste. Sempre que começava a roçada, alguns alunos deixavam de freqüentar a escola, tinham que ajudar os pais.
Uma aluna, magrinha e sardenta, levantou a mão:
- Fessora, tinha muito aribu no matinho perto da venda.
- Não é aribu que se fala, Lurdinha. É urubu.
- Não, é aribu mesmo. Ele não fica no ar?
Marilda segurou o sorriso. Criança tinha cada uma!
Às nove horas chegou um homem magro, de bigode. Tirou o chapéu, cumprimentou a professora, identificou-se como o tio de Tonho e perguntou à classe se alguém tinha visto o garoto. Diante da resposta negativa, disse que o menino estava sumido desde a véspera e que os pais pensavam que talvez tivesse dormido na casa de algum colega.
A professora ficou preocupada. Achava que ele estava ajudando o pai na roça, mas qual! Estava desaparecido. Onde poderia estar?
Lembrou-se da lagoa onde os meninos costumavam nadar. E se tivesse se afogado? Não, ele sabia nadar bem. E se tivesse sido seqüestrado? Não, os pais eram uns pobres diabos que arrendavam uma terrinha na Santa Luzia; não tinham quase o que comer, quanto mais pagar resgate. Onde estaria, meu Deus do céu?
A aula foi interrompida e saíram todos à procura de Tonho. Foram de sítio em sítio perguntando por ele. Em vão. Ninguém sabia o seu paradeiro.
Quando passavam perto da matinha do ribeirão, Marilda notou que, de fato, havia muitos urubus voando sobre as árvores. Teve um pressentimento, um pensamento ruim. Chamou o tio de lado e pediu-lhe que entrasse com ela na mata. Antes, porém, disse às crianças que continuassem a busca, que fossem até o próximo sítio.
Entraram na mata. Tudo quieto, nenhum barulho. Andaram uns cem metros e encontraram o menino caído ao lado de um pé de manacá. No caderno, aberto e caído a uns vinte centímetros do corpo, havia algumas palavras escritas com letra irregular e infantil.
Marilda pegou o caderno e, emocionada, leu a última mensagem do menino: "Para minha querida professora dou esta flor com muito amor".
EEPSG "Carlos Maximiliano P. dos Santos - Capital
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