"Um boneco de corda só é capaz de funcionar pela vontade do seu dono..."
Autora: Anne M. Lucille[1]
Em nosso inconsciente, a palavra autoridade quer dizer: "Aquele que conhece a verdade..."" Muitos, talvez a quase totalidade dos educadores, e homens preocupados em aplicar as centenas de teorias instrucionais existentes, para mecanizar os estudantes, acreditam que, ensinando-se cada ser humano da face da terra a ler e escrever, resolve-se, por reflexo, todos os problemas desse mundo.
Mas, por trás de cada grupo que defende o caos, a anarquia social, a estruturação de uma mente social inclinada a lhes seguir os passos, seja por ideologia ou qualquer outro motivo, o que existe senão uma autoridade culta, repleta de todo conhecimento do homem, um idealista?
E nos tempos de suposta paz, onde os governos totalitários, ou chamados democráticos, ou socialistas, cujo lema é sempre conduzir seu povo para onde apontam seus interesses pessoais, estes também não são extremamente cultos? E os cientistas sem ética, sem sensibilidade, movidos pela ganância do acumular cada vez mais méritos, mais reconhecimento público, mais poder, criadores das mais letais armas de destruição em massa, também estes, não são cultos?
E a autoridade criadora das ideologias, os chamados cientistas sociais, ou sábios, cujos ideais apenas se prestam a suprir seus desejos pessoais de poder, de dominação, que controlam sua multidão de séquitos através da prática do medo, limitando até seu modo de pensar, instituindo o que devem desejar, para onde devem direcionar seus esforços de realização, o que devem esperar da vida, conduzindo-os, como a uma manada de animais ao seu pasto, também estes não são dotados de vasta cultura?
Podemos ser bastante cultos, doutores em literatura, conhecimentos do mundo, mas ao seguirmos uma autoridade, ao nos submetermos aos caprichos de um indivíduo, ou grupo, ou ideologia política ou religiosa, não estamos também negando nossa própria liberdade de expressão? Se não somos capazes de pensar e nos deixamos conduzir pelo pensamento alheio, somos indivíduos ou autômatos mecanizados e programados coletivamente? Onde está então nossa inteligência, será coisa de segunda mão?
Se não somos capazes de pensar com liberdade, com clareza, por que devemos achar que existe em nós algum vestígio de inteligência? Há em nós inteligência quando sequer usamos nosso cérebro para decidir nosso destino, nossas preferências, como devemos nos relacionar com esse mundo, de coisas e entes humanos? Se somos conduzidos, sem questionarmos, sem direito à liberdade de escolha, enclausurados pelo domínio de outros, há diferença entre nós e uma manada de bois sendo conduzidos ao matadouro indiferentes ao perigo que lhes aguarda?
Supondo que iniciemos uma jornada em direção a um ponto, destino qualquer. Podemos nos dirigir a esse ponto sem sabermos o motivo, sem saber o que devemos encontrar no final, sem decidirmos sequer a hora de descansar e levantar para continuar a caminhada, e ainda assim, nos considerarmos inteligentes? Afinal de contas, o que é, para nós, inteligência?
Observe um robô movido a um mecanismo analógico, a chamada corda, destes que gravam e depois, ao aperto de um botão, reproduzem a voz do seu dono. Eles simplesmente repetem aquilo que ouvem, e isso, não quer dizer que sejam inteligentes, ou que sejam capazes de pensar. Há então diferença entre eles e alguém que simplesmente, sem questionar, sem pensar, segue cegamente o pensamento de uma autoridade, que o controla, a repetir suas vontades e desejos?
Há uma mecanicidade em nossos gestos e hábitos. Reparem como repetimos as coisas que nossos pais, amigos, ídolos, gente da moda, gostam de fazer, ouvir, falar, e assim, logo em nós se tornam hábitos. Não porque os preferimos, uma criança não tem preferências, mas porque pela repetição regular da coisa, aquilo termina por se alojar em nosso cérebro como uma ordem a ser executada. E assim é criada uma identificação entre nós e o hábito que repetimos. O hábito passa a fazer parte de nossa personalidade, é incorporado ao nosso eu, como um detalhe que nos identifica como o indivíduo que somos.
Não é o excesso de conhecimento que aliena o homem, mas, antes disso, o desnecessário...
Nesse processo inteiramente mecânico, onde velhos hábitos são imitados, ajustados à realidade do nosso corpo, não existe um pensador, pois nada de novo é criado, apenas copiado. Chamamos de inteligência a capacidade inata que todos possuem de imitar, mas, podemos acrescentar que mais lógico, sensato, seria considerarmos inteligente, aquele que não imita, que age de forma independente, que está disposto a questionar por quê, deve também ele continuar imitando, mesmo que isso signifique uma oposição contra o padrão que a todos guia.
Não é inteligência o saber imitar, mas seria o compreender que imitação não significa ser inteligente. A inteligência é o ato de examinar, questionar, ponderar, avaliar todas as nuances de uma mesma questão, sem opinião de qualquer espécie previamente formada. Repetir palavras e procedimentos não é ser inteligente, isso o computador já faz melhor e mais eficientemente que qualquer individuo humano, e nem por isso possui inteligência.
Nasce a inteligência quando há a liberdade do natural questionamento, seja o simples perguntar: “Por que devemos escovar os dentes três vezes por dia?”. Ao sentir-se livre para questionar, também o individuo está livre para ser criativo, e não imitativo. Imitar não é ser criativo, chama-se a isso de plágio, ou pensamento de segunda mão. Mas, aparentemente, é como vive a maioria das pessoas.
Podemos questionar desde já uma coisa simples: Por que, a despeito de toda autoridade e cultura dos sábios, que teimam em serem imitados, por motivos mil, ainda, o homem não consegue viver sem conflitos entre si? Esse inexpressivo questionar já demonstra inteligência, uma vez que indaga sobre nosso próprio modo de ser, de agir, afinal até agora tudo que fizemos foi o imitar nossos ancestrais, e aonde chegamos? Autora: Anne M. Lucille
email: annemarielucille@yahoo.com.br
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