A luta por uma educação de qualidade e com recursos adequados e bem aplicados pode ganhar um reforço: a Lei de Responsabilidade Educacional (LRE), que funcionaria nos moldes da Lei de Responsabilidade Fiscal.
(*) Rosângela Bittar - Valor
Quase 25 anos depois de uma grande cruzada parlamentar em defesa da Educação, representada na luta do senador capixaba João Calmon, já falecido, para aprovar emenda constitucional que obrigou União a aplicar 13% e Estados e Municípios 25% em manutenção e desenvolvimento do ensino, inicia-se este ano uma nova iniciativa também parlamentar neste campo.
A autoria é praticamente consensual e multipartidária, existem já escritos e apresentados pelo menos cinco anteprojetos de lei, mas na liderança do movimento, que criou seus alicerces na Comissão de Educação da Câmara, está a deputada goiana Raquel Teixeira (PSDB): trata-se de instituir a Lei de Responsabilidade Educacional (LRE).
Tendo como parâmetro a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e como meta conseguir, na Educação, os resultados que a lei fiscal obteve no controle dos gastos públicos e expectativa de seu equilíbrio, os deputados envolvidos na nova campanha conseguiram o apoio da Unesco (órgão das Nações Unidos para Educação, Ciência e Cultura) e de várias instituições que atuam no setor e representam profissionais e especialistas da comunidade educacional.
Há, já em tramitação, um projeto básico, o 247/2007, do deputado também goiano Sandes Junior (PP), que propõe a criação da Lei de Responsabilidade Educacional. Este incorporou vários outros com o mesmo teor, entre os quais se destaca uma proposição do então deputado mineiro Paulo Delgado (PT) que, não tendo sido reeleito para a atual legislatura, teve agora seu projeto encampado pelo deputado matrogrossense Carlos Abicalil (PT). Os deputados Raul Henry (PMDB-PE), Marcos Montes (DEM-MG) e Carlos Souza (PP-AM) também já sugeriram seus textos, e todos eles sob a mesma justificativa.
Defendem, uma vez que já existem recursos financeiros que podem ser suficientes para a execução de uma política educacional séria, a adoção de medidas que levem à melhor gestão desses recursos, com mais resultados qualitativos. Em todos os projetos, cuja apreciação se iniciou na Comissão de Educação, por onde transitaram os parlamentares que se interessaram pelo assunto, há destaque para os riscos da leniência com a omissão e o desperdício dos recursos, além, e principalmente, da impunidade.
Alegam os deputados terem ciência de que "milhões de crianças deixam de receber a merenda escolar por falta de recursos desviados pra outros projetos e atividades". Dizem que pelas mesmas razões escolas não são construídas ou conservadas e os professores permanecem recebendo como remuneração a velha miséria, da qual já se queixaram em prosa, verso e protesto. "O risco dessa irresponsabilidade social pública com a educação brasileira é o recrudescimento do analfabetismo, da evasão escolar e do abandono da escola, entre outros sérios e irremediáveis estrangulamentos na organização e desenvolvimento da educação básica".
Os dispositivos constitucionais e as leis disponíveis exigem instrumentos que os tornem eficazes, e entre esses tem que estar, sob pena da eterna ineficiência, aqueles direcionados para, segundo definem os autores dos projetos em sua argumentação, "coibir a prática do desmando público com relação à aplicação de verbas, estabelecendo as circunstâncias e condições pelas quaisa autoridade pública poderá ser punida."
A direção da Câmara já criou uma comissão especial para trabalhar na formulação e debate da lei. Porém, isto ocorreu há quase um ano e os líderes até hoje não indicaram os representantes de seus partidos no grupo.
Ao mesmo tempo em que aguarda a instituição do comissão, a deputada Raquel Teixeira, uma líder informal do movimento pela Lei de Responsabilidade Educacional, e até por ser integrante da organização "Todos pela Educação", leva adiante uma iniciativa sua que já propunha fundamentos desta lei de responsabilidade sem denominar como tal o projeto que apresentou.
Em meados do ano passado, um seminário internacional sobre ética e responsabilidade na Educação, organizado em Brasília pela comissão da Câmara, reuniu a Unesco, o Todos pela Educação, os Conselhos de Secretários de Educação e Nacional de Educação, a União dos Dirigentes Municipais de Educação, professores e interessados no assunto, aprofundou a discussão sobre a Lei de Responsabilidade e concluiu: "Os participantes insistem sobre a importância de ser aprovada pelo Congresso Nacional uma Lei de Responsabilidade Educacional, que possa regular um conjunto de responsabilidades compartilhadas entre os vários atores da educação brasileira".
Coordenadora desse seminário, a deputada Raquel Teixeira retoma neste reinício de ano legislativo, imediatamente após o Carnaval, providências para que sejam aplicadas as suas recomendações. Antes mesmo de o assunto despertar o interesse que agora se vê, a deputada havia apresentado um projeto de lei, o de número 7420 de 2006, antes portanto de todos os demais,que dispõe sobre a qualidade da educação básica e a responsabilidade dos gestores públicos na sua promoção.
Nele, havia incluído algumas normas de apuração de responsabilidades e punição ao malfeito, já sugerindo medidas inspiradas na lei de responsabilidade fiscal. "Em 2000 o Brasil aprovou uma Lei de Responsabilidade Fiscal que disciplinou a receita e despesa da União, dos Estados e Municípios, colocando o país no rumo da modernidade fiscal que abriu caminho para a modernidade econômica e social", diz Raquel Teixeira.
"No espírito desta - afirma a deputada - é necessária uma Lei de Responsabilidade Educacional que dê à educação o tratamento de prioridade e responsabilidade que permitirá colocar o país em um novo patamar de desenvolvimento". Segundo Raquel, a LRE, que começará a ser redigida na comissão especial, vai essencialmente tipificar os crimes de responsabilidade e definir penalidades.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras
E-mail rosangela.bittar@valor.com.br
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