É interessante que o professor tenha à sua disposição o maior número possível de recursos.
Doutor em educação e mestre em ensino de ciências, o professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP), Luís Paulo de Carvalho Piassi, pesquisa o ensino de ciências com o uso de literatura, cinema e música.
Na linha de pesquisa intitulada Crítica da Cultura, realiza estudos sobre a ficção científica e fantástica, os gêneros do rock, suas relações e manifestações ideológicas na música, na literatura, no cinema e na moda. Na linha de pesquisa denominada Cultura e Ciência, investiga as representações socioculturais e ideológicas da ciência e tecnologia na literatura, na música e no cinema.
Um dos projetos de pesquisa de Piassi, que é bacharel e licenciado em física, é relativo à criação de um portal de ensino de ciências para professores de ensino fundamental e médio. É a Central Interativa de Ensino por Investigação, que procura oferecer ao professor acesso rápido e fácil a diferentes possibilidades em recursos didáticos.
Jornal do Professor – Qual é a importância dos materiais didáticos para a aprendizagem?
Luís Paulo de Carvalho Piassi – Os materiais ou recursos didáticos são ferramentas que podem auxiliar na relação didática professor-alunos, ou mesmo em atividades entre os alunos, de forma a incentivar, facilitar, as interações sociais entre os diversos atores do contexto escolar.
JP – Alguns materiais didáticos apresentam melhores resultados em uma disciplina do que em outra?
LPCP – A escolha do material deve ser, sempre, do professor e orientada por diferentes fatores ligados à disciplina, e não só a ela, mas também a características do grupo de alunos, do formato e duração das aulas, enfim, do contexto escolar de forma mais ampla.
JP – Quais os melhores para a área de ciências, especificamente?
LPCP – Não há fórmula pronta. Cada caso é um caso e o principal papel do professor é, nesse contato com cada turma, avaliar as necessidades e anseios dos alunos. Então, claro que é interessante que o professor tenha à sua disposição o maior número possível de recursos. Não para que necessariamente precise utilizar todos eles sempre, mas para que possa ter o menor número possível de limitações para as sua escolhas.
JP – Um de seus projetos de pesquisa na USP é voltado à formação continuada de professores na área de astronomia, atingindo aqueles que dão aulas de ciências no ensino fundamental e de física do ensino médio. Desde quando o senhor vem desenvolvendo esse projeto, conhecido pela sigla M.A R.T.E. (Ministrando Astronomia com Recursos Textuais e Experimentos)? Como é seu funcionamento?
LPCP – A ideia desse projeto surgiu em 2008 a partir de uma pesquisa com um grupo de professores em formação continuada sobre os temas que mais os interessavam e sobre os quais mais tinham dificuldades, em especial, no que se refere à implementação da nova proposta curricular em São Paulo. A partir dessa demanda, nosso grupo de pesquisa elaborou e implementou um curso de especialização em ensino de astronomia voltado para professores de física e de ciências do ensino básico. O desenvolvimento do curso tem gerado diversos trabalhos apresentados pelos professores em diferentes eventos da área de ensino de ciências como, por exemplo, a simpósio nacional de ensino de física. Ao final do curso os professores-participantes também deverão apresentar uma monografia, desenvolvida sob orientação de professores da universidade, que tratará de temas ligados à sua prática de sala de aula e ao mesmo tempo de questões que os interesse.
JP – Outro de seus projetos de pesquisa é relativo à criação de um portal de ensino de ciências para professores de ensino fundamental e médio: a Central Interativa de Ensino por Investigação. Como funciona?
LPCP – O cienciamao.usp.br é um portal que procura oferecer ao professor acesso rápido e fácil a diferentes possibilidades em recursos didáticos. Consiste basicamente de um buscador, por assunto, de recursos didáticos disponíveis em diversos sites como por exemplo de universidades e centros de pesquisa, revistas de ensino de ciências e de divulgação científica, sites específicos de experimentos didáticos, anais de eventos da área, etc. O acesso é livre e irrestrito e procuramos atualizar e ampliar nosso banco de dados constantemente.
JP – O que o senhor pensa a respeito da utilização, no ensino, de elementos como poesia, teatro, cinema e história em quadrinhos? E de que forma eles podem ser usados?
LPCP – Todos esses elementos fazem, ou ao menos podem fazer parte da cultura geral dos estudantes e trazer elementos dessa cultura geral para dentro da sala de aula é importante para contextualizar o conteúdo escolar relacionando-o com outros elementos culturais. Por outro lado, algumas vezes também, a sala de aula pode ser um incentivo ao primeiro contato do estudante com diferentes formas de cultura.
JP – De que modo o uso de filmes, documentários ou séries pode auxiliar os professores?
LPCP – Recursos audiovisuais são uma forma de linguagem que, se bem escolhidas, podem trazer para a sala de aula diferentes visões e interpretações para alguns temas bem como mostrar diferentes pontos de vista sobre algum assunto. Isso não falando apenas de conteúdos conceituais, de ciências por exemplo, mas também de implicações sociais e políticas que muitas vezes são desdobramentos da produção de conhecimento.
JP – Qual a contribuição que as histórias de ficção científica podem trazer para o aprendizado?
LPCP – Na minha opinião, a maioria das histórias de ficção científica não necessariamente tem como tema central a ciência ou conceitos científicos. O contexto de futuro ou de tecnologia muitas vezes é na verdade um pano de fundo para a discussões de questões mais profundas, por exemplo, de caráter sócio-político.
JP – Em sua opinião, os professores do ensino básico estão preparados para a escolha e utilização de materiais didáticos?
LPCP – De uma forma geral, posso dizer que essa questão ainda não é suficientemente discutida na formação inicial de professores. Talvez o assunto mereça uma atenção maior.
JP – Os recursos tecnológicos estão cada vez mais presentes e disponíveis nas escolas. Como eles podem ser usados pelos professores?
LPCP – Em primeiro lugar é preciso proporcionar aos professores o acesso e a intimidade com esses recurso, não só na sala de aula ou na escola, mas em seu cotidiano. O professor precisa se sentir seguro para incorporar as tecnologias à sua prática e isso se dá com a experiência.
JP – Como as instituições de ensino superior podem colaborar para que os professores se tornem mais capazes de decidir quais materiais didáticos utilizar em suas aulas?
LPCP – Propiciando o exercício dessas escolhas e a reflexão sobre elas durante a formação do professor.
JP – O Brasil tem programas de livros didáticos e há uma preocupação em ofertar obras de maior apoio pedagógico. O que deve constar num bom livro de apoio pedagógico a professores?
LPCP – Esse livro de apoio pedagógico não deve se resumir a uma coletânea de resoluções de exercícios. Deve oferecer um conteúdo de aprofundamento e de reflexão para o professor sobre a sua prática.
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