sábado, 28 de janeiro de 2012

Professores excluídos: de quem é a culpa?

Sara R. Oliveira

Ainda não se sabe. O certo é que milhares de professores que concorreram a horários anuais foram ultrapassados por docentes com menores habilitações e menos anos de serviço. Ministério garante que respeitou os pedidos das escolas, diretores dos estabelecimentos de ensino asseguram que a aplicação não está a validar corretamente.

A polémica estalou. Milhares de professores que concorreram a horários anuais ficaram automaticamente excluídos da lista de colocação porque as vagas anuais se tornaram temporárias - estima-se que mais de 85% dos horários disponibilizados na segunda bolsa de recrutamento eram temporários, quando no ano passado esse valor rondou os 29%. O Ministério da Educação e Ciência (MEC) já assegurou que está a respeitar as indicações dadas pelas escolas. A Federação Nacional dos Professores (FENPROF) pede a anulação do concurso e pondera interpor uma providência cautelar.

A aplicação informática estará a ignorar os docentes que se candidataram a horários anuais porque o sistema só valida horários para um mês? O MEC garante que está a cumprir a lei, mas as escolas asseguram que não se enganaram nos pedidos de horários e que a aplicação transforma horários anuais em temporários. Na semana passada, o ministro Nuno Crato lembrou que sempre houve professores com contratos a termo de um mês. O que mudou, sustentou, foi que a Direção-Geral dos Recursos Humanos da Educação promoveu as contratações na sua plataforma. "Está a fazer-se o mesmo que já se fazia, mas não de forma automática e sem apoio central", disse.

O secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar esclareceu entretanto que os contratos temporários terão a duração mínima de um mês e que duram conforme as necessidades. "O que diz a legislação é que os contratos não podem ter um período inferior a um mês", adiantou João Casanova Almeida. O assunto, que está a perturbar a comunidade educativa, poderá não ser discutido na Assembleia da República. O BE pediu uma audição ao ministro Nuno Crato sobre a questão, mas o requerimento foi chumbado pela maioria PSD-CDS/PP. "Só falta o ministro da Educação contratar professores ao dia ou pagar a recibos verdes", comentou a deputada Ana Drago.

A situação não é consensual e está a agitar águas. O movimento de professores desempregados, criado a partir das redes sociais, vai pedir uma reunião ao Provedor de Justiça a propósito desta colocação de professores e também para abordar a condição precária dos docentes sem trabalho. "Precisamos de uma clarificação, por exemplo, na questão das contratações de escolas por mês. Parece que o Ministério se recusa a contratar ao mês em junho para poder despedir e não pagar os meses de julho e agosto. É um abuso que nos surpreende", referiu, à Lusa, Miguel Reis, do movimento.

A Federação Nacional de Educação (FNE) escreveu a Nuno Crato uma carta sobre o assunto porque, em seu entender, não faz sentido que se substitua professores aposentados ou em licença de parto por contratados a um mês. E considera uma "ilegalidade grosseira" que o prazo máximo de duração dos contratos de trabalho termine a 31 de julho, acusando o ministério de estar a provocar "instabilidade e insegurança" no corpo docente. "Se não quiser pagar o mês de Agosto aos professores que diga isso e seja claro", refere João Dias da Silva, secretário-geral da FNE.

Nos últimos dias, a FNE tem sido confrontada com diversas situações, pediu uma reunião ao MEC que está marcada para esta quarta-feira ao final da tarde. A FNE fez uma recolha exaustiva dos casos que lhe foram parar às mãos e tenciona discutir os que lhe parecem "irregulares". "Temos de perceber qual a origem destas circunstâncias", defende Dias da Silva, secretário-geral da FNE, em declarações ao EDUCARE.PT.

A FNE exige o cumprimento da lei e, para isso, sustenta que é necessário esclarecer as dúvidas quanto aos horários mensais ou anuais, percebendo se o problema está na aplicação informática ou nos horários solicitados pelas escolas ou ainda no procedimento adotado pela Direção-Geral dos Recursos Humanos da Educação. Dias da Silva diz que convém não esquecer o respeito pela graduação e pela manifestação de preferências por parte dos professores.

O Sindicato dos Professores do Norte, que está a contactar vários diretores de escolas para perceber o que passou, concorda que a situação tem de ser esclarecida e resolvida quanto antes. "Está criada uma situação de grande injustiça para os professores e de falta de transparência. Exigimos que o MEC corrija esta situação", sustenta Manuela Mendonça, coordenadora da estrutura sindical, ao EDUCARE.PT.

Depois da indicação da tutela de que as escolas seriam responsáveis pela situação, o sindicato está empenhado em esclarecer o que se passou. Até porque a última indicação é de que os diretores não assumem a responsabilidade nesta matéria. "Trata-se de uma situação que tem necessariamente de ser corrigida rapidamente. É injusto para os professores que só concorreram a horários anuais serem ultrapassados por outros com graduação inferior", afirma Manuela Mendonça.

A Associação Nacional de Professores (ANP) defende que o bom senso deve imperar. "O Ministério diz que a culpa não é sua, que é das escolas. Acontece que este procedimento foi aplicado sem qualquer problema no ano passado. Não vejo que, este ano, as direções das escolas tenham incorrido em tantos erros que lhes permitiram transformar horários que eram anuais em horários temporários", adianta Armindo Cancelinha, da ANP, ao EDUCARE.PT. A associação pede celeridade na resolução do problema. "É necessário averiguar a situação, apurar a verdade e depois agir em conformidade", acrescenta o responsável.

A FENPROF admite recorrer aos tribunais para impugnar a segunda bolsa de recrutamento dos professores se se comprovar a existência de ilegalidades. A hipótese de "recorrer aos tribunais administrativos com uma providência cautelar se houver razões jurídicas para isso, se se provar que há ilegalidades", está em cima da mesa, conforme anunciou Mário Nogueira, secretário-geral da FENPROF - que diz ter conhecimento de uma escola do Norte que quis declarar 14 horários anuais e 13 acabaram por ser validados como temporários. A FENPROF está também a contactar várias escolas para perceber o que está a acontecer.

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