* Por Marcelo Neri
Nosso ponto de partida é o salto recente da proporção de pessoas em idade ativa com cursos profissionalizantes. Segundo a PME, em maio de 2004, 13,4% dessas pessoas estariam frequentando, ou já teriam frequentado cursos profissionalizantes, leia-se qualificação profissional, técnico de ensino médio, ou tecnólogo superior. Em setembro de 2010 este número passa a 24,6% – crescimento de 83%.
O que gerou esse aumento de 83% daqueles com cursos profissionalizantes nas 6 principais metrópoles? Investimentos federais? Vagas técnicas estaduais? Uma combinação dos dois ou nenhuma das alternativas acima? Esta é uma das perguntas-chave da pesquisa do CPS/FGV realizada sob os auspícios do Senai. O tom apimentado das perguntas vai ao gosto do autor.
A proporção das pessoas cursando tais cursos – só fluxos flexíveis – nos permite entender as origens da mudança observada. Houve salto permanente da curva de frequência etária nos mais jovens. Subindo como uma onda no mar de um pico aos 16 anos de 3% para 7%. Na população jovem aos olhos da política pública, aquela entre 15 e 29 anos, a frequência nesses cursos sobe de 2,1% em março de 2002 para 3,7% em setembro de 2010, a quase totalidade do salto foi entre 2004 e 2007.
Modelo de demanda por educação profissional desses jovens permite isolar o papel de diferentes determinantes da demanda corrente por cursos profissionalizantes. Senão vejamos: a demanda por educação profissional é mais jovem entre os jovens (15 a 19 anos com chances 125% maiores que 20 a 24 anos); mais feminina (9%+); mais negra (3%+), menor na capital (16%+) do que da periferia metropolitana. Ou seja, aqueles com cursos estão mais em grupos tidos como excluídos: mulheres, negros e jovens da periferia.
O que gerou o salto de 83% daqueles com cursos profissionais? Ações federais? Estaduais? Lan houses?
O impacto da renda familiar na demanda é positivo, mas decrescente à medida que a renda sobe; é mais de famílias menores que zelam melhor pela educação de seus filhos; é mais de filhos do que chefes do domicílio (chances 74% maiores).
Os locais da maior demanda por cursos profissionalizantes entre 2002 e 2010 foram as grandes Belo Horizonte e Porto Alegre com chances 25% e 37% maiores que Grande São Paulo que supera Recife, Salvador e Rio.
Olhando as mudanças no tempo: no aumento de 49% das chances de frequência, o grande salto se deu entre 2004 e 2007. Houve incremento diferencial dos mais jovens. A chance de frequentar cursos profissionalizantes dos 15 aos 19 anos subiu 23% mais que dos 25 aos 29 anos.
O que causou essa onda jovem? Seriam investimentos federais? A quantidade de escolas federais de educação profissional criadas de 2005 a 2010 foi a mesma do século passado. Agora há um hiato até a operação efetiva das escolas. A bandeira federal foi levar cursos a cidades menores. E o aumento aqui é o já observado nas metrópoles.
Outra vertente é o anúncio de que São Paulo dobrou as vagas técnicas. De fato, a análise de diferenças revela a Grande São Paulo como bandeirante da nova educação profissional: salto inicial de chances duas vezes superior ao das demais cidades, seguido de recuperação parcial. A capital e periferia das metrópoles revela quadro similar. Salto inicial do município de São Paulo seguido de recuperação parcial das demais unidades ao longo do tempo.
A única que reverte o salto da capital paulista é a sua periferia.
O Censo do INEP/MEC aponta aumento das matrículas nesses cursos entre 2004 e 2009 de 49,6% na rede estadual e 45,2% na rede privada o que é consistente com as duas causas aqui discutidas. Entretanto a magnitude do salto é inferior àquela observada nos dados da PME, o que sugere que os dados do INEP não estão captando toda ação ocorrida.
O suplemento nacional da PNAD/IBGE de 2007 indicou que 22,5% dos indivíduos em idade ativa já frequentaram cursos de educação profissional. Apesar do estoque de oportunidades do indivíduo que já frequentou algum curso de educação profissional dever aumentar naturalmente com a idade da pessoa, por força cumulativa do tempo, na verdade essa proporção cai depois dos 20 anos de idade. Isto confirma a onda jovem recente com educação profissional observada na PME.
Os cursos de informática representam 36,8% da educação profissional corrente pela PNAD. O boom desses cursos encerra boa parte do aumento recente da educação profissional assim como descolamentos das estatísticas de pesquisas domiciliares com as do INEP. Na população entre 15 e 19 anos de idade os cursos de informática representam metade dos cursos de educação profissional. Na população entre 10 e 14 anos de idade são três quartos dos cursos de educação profissional lato senso. Portanto, o mistério do boom profissionalizante passa pelo boom de cursos de informática para adolescentes em ONGs ou Lan houses de qualidade desconhecida. Informática abriga mais da metade dos cursos de qualificação nas classes E e D, 44.9% na classe C e 28,5% na classe AB.
Há nova onda de cursos desde meados de 2010. Será ela uma inócua marolinha ou, como diria Roberto Macedo, ajudará o jovem pobre a surfar sua passagem para a nova classe média?
* Marcelo Côrtes Neri, economista-chefe do Centro de Políticas Sociais e professor da EPGE, Fundação Getulio Vargas. mcneri@fgv.br www.fgv.br/cps
Fonte: Valor Online
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