William Maia
Do UOL, em São Paulo
Há mais de dois anos no Congresso, o projeto de lei que valida o PNE
2011-2020 (Plano Nacional da Educação) segue sem aprovação. Para especialistas
em educação, o impasse na aprovação das 20 metas do novo PNE é fruto de uma
disputa de interesses de grupos políticos e econômicos que envolve o Executivo
e o Legislativo e da falta de compreensão dos parlamentares sobre a prioridade
que deve ser dada à educação pública.
Para Roberto Romano, professor de ética e filosofia da Unicamp
(Universidade Estadual de Campinas), o Congresso é influenciado por grupos
poderosos que travam o debate. "O lobby das empresas de ensino privado no
Congresso é muito forte. Eles certamente não têm interesse em que se aprove um
aumento substancial dos investimentos em educação pública", afirma.
"No fundo, o que nós temos é a velha dicotomia entre os que
defendem o incentivo ao ensino privado e os que defendem o fortalecimento da
educação pública. Isso vem desde a década de 1960, com os militares, que
expandiram o ensino público sem garantir que ele tivesse as condições de manter
os níveis de excelência que possuía. Não podemos
continuar incentivando esse processo", acrescenta.
A meta 20, que define o volume e o destino final dos recursos públicos
investidos em educação, representa o maior entrave para a aprovação do PNE no
momento. Após a Câmara dos Deputados aprovar a meta de investimento
equivalente a 10% do PIB (Produto Interno Bruto) até o fim da década, o texto
seguiu para o Senado, onde ganhou a relatoria do senador José Pimentel (PT-CE).
Pimentel defende que no cálculo dos 10% do PIB também sejam incluídos os
gastos públicos indiretos, o que inclui bolsas de estudo do Prouni (Programa
Universidade Para Todos) e o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil), que
beneficiam a rede particular de ensino superior, além de outros convênios com a
iniciativa privada. Pimentel considera necessário contemplar parcerias, como as
que existem com o Sistema S, por exemplo.
Salto de qualidade
Os críticos da medida alegam que isso, na prática, reduziria o
percentual de comprometimento em relação ao PIB para algo em torno de 8,5%, mesmo
com o reforço dos ganhos com a exploração do petróleo na camada pré-sal. Hoje,
o país investe em educação o equivalente a 5,3% do PIB.
"Não será possível dar um salto de qualidade na educação sem o
investimento de 10% do PIB a partir da próxima década. Esse é o percentual
mínimo, segundo cálculos da maioria dos pesquisadores, para garantir que todas
as outras metas sejam cumpridas", garante Nelson Cardoso Amaral, professor
da UFG (Universidade Federal de Goiás).
Amaral alerta para a "oportunidade histórica" de elevar os
investimentos no setor, levando em conta as transformações demográficas que o
país enfrentará nas próximas décadas. "A partir de 2030, a população
brasileira deixará de crescer, por conta da baixa taxa de natalidade. Se não
investirmos o suficiente em educação agora, teremos uma população envelhecida e
deseducada", prevê.
O pesquisador cita como exemplo os casos da Coreia do Sul e do Japão,
que nas décadas de 1960 e 1970 elevaram o investimento público e revolucionaram
seus sistemas de educação.
"O que o governo e os parlamentares precisam ter em mente, é que,
no futuro, esse nível de investimento pode e deve ser reduzido, para algo em
torno de 6% do PIB, que é a taxa média praticada nos países
desenvolvidos". Isso será possível porque cairá o número brasileiros em
idade educacional; hoje são 82,5 milhões e passariam a ser 65,4 milhões em
2030.
O atraso
As discussões sobre o novo PNE se intensificaram no fim de 2010, quando
o governo enviou o PL 8.035 ao Congresso para substituir o plano anterior, que
vigorou entre 2001 e 2010 e não cumpriu a maior parte das metas. "O PNE
anterior praticamente não existiu, porque o presidente Fernando Henrique
Cardoso vetou a vinculação de 7% do PIB e isso prejudicou completamente sua
aplicação", relembra Amaral. "Sem uma meta objetiva de investimentos,
qualquer plano está fadado ao fracasso".
Desde 2010, o projeto tem tido uma tramitação lenta e conturbada no
Congresso, o que deixa o país, na prática, sem um programa de metas para
orientar as ações de Estados, municípios e do governo federal.
"A falta de um plano de metas em vigor desestabiliza e enfraquece
as ações do poder público na área da educação. As coisas continuam acontecendo,
mas sem a coordenação e a unidade garantida por uma base legal",
avalia Carmenísia Jacobina Aires, professora da faculdade de educação da
UnB (Universidade de Brasília).
Para a professora, que participou de audiências públicas na Câmara para
debater o plano, o atraso na votação revela a "falta de prioridade"
dos parlamentares em relação à educação.
A expectativa do senador José Pimentel é que o Senado conclua a votação
do PNE em junho. Se houver alterações de mérito, a proposta terá de voltar à
Câmara. Com isso é pouco provável que o novo PNE seja aprovado antes do fim do
segundo semestre.
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