domingo, 20 de março de 2011

Educação Infantil

Mais de um milhão de crianças são reprovadas no ciclo de alfabetização em 2008
Mais de um milhão de crianças brasileiras, ainda em fase de alfabetização, iniciaram em 2008 um caminho considerado desastroso para a vida escolar: o da repetência. Elas representam uma em cada dez matriculados nessa etapa da educação básica. Para o Ministério da Educação (MEC), a punição é extremamente severa para alunos de tão pouca idade. As reprovações iniciam a trajetória do fracasso escolar, rota da qual o Brasil precisa fugir se quiser estabelecer um projeto de desenvolvimento para o País.
Priscilla Borges, iG Brasília |

Desde que a ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos tornou-se obrigatória para todas as escolas do País, em 2006, o Conselho Nacional de Educação (CNE) vem recomendando e orientando os gestores da educação para que a implantação do novo modelo seja feita da melhor forma possível. Os pareceres e as resoluções publicadas pelo órgão tentam tirar dúvidas de gestores e normatizar as mudanças para que o objetivo de ampliar a aprendizagem do aluno não seja esquecido.
Os números do Censo Escolar, porém, revelam que a realidade está bem distante da ideal. Dados obtidos pelo iG mostram que uma das recomendações mais importantes do CNE vem sendo descumprida pelos sistemas estaduais e municipais de educação: nos três primeiros anos do ensino fundamental não deve haver repetência.
As informações sobre o rendimento dos estudantes revelam que, em 2008, 1.078.000 crianças dos primeiros, segundo e terceiros anos do ensino fundamental foram reprovadas.
Para o presidente da Câmara de Educação Básica do CNE, Cesar Callegari, o cenário é perigoso. Os números mostram que muitos educadores, diretores, professores e até secretários de Educação não estão tomando cuidado suficiente com essas crianças, impondo esforços e objetivos para elas que não são corretos, pondera.
Callegari lembra que, a repetência em fases tão precoces – os alunos dessas séries têm entre seis e oito anos de idade – pode causar traumas irreversíveis.
O CNE definiu, no Parecer 04/2008, que as três primeiras séries do novo modelo do ensino fundamental formariam o ciclo da infância. Com isso, os especialistas que pensam e orientam a educação brasileira queriam esclarecer que, primeiro, o processo de alfabetização não seria concluído no primeiro ano. Utilizaria os três primeiros anos.
Segundo, queria dar mais qualidade à aprendizagem da leitura e da escrita, já que as crianças teriam mais tempo para se dedicar a essa tarefa.
O mesmo parecer reforça a necessidade de se construir um novo projeto pedagógico para colocar as ideias em prática. Professores e diretores de escola teriam de pensar uma nova maneira de ensinar e avaliar essas crianças, sempre considerando que os estudantes das séries iniciais estavam em um ciclo de aprendizagem.
As avaliações, segundo o CNE, não podem ser adotadas como mera verificação de conhecimentos visando ao caráter classificatório, diz o documento.
A recomendação é que esse ciclo não seja interrompido pela reprovação. Nossa preocupação é que, se os municípios continuarem reprovando dessa maneira, estaremos antecipando o fracasso escolar, ressalta Edna Martins Borges, coordenadora geral do Ensino Fundamental da Secretária de Educação Básica do MEC.
Novas diretrizes
Edna destaca que fazer uma criança repetir uma série não significa garantir que ela aprenda. Segundo a coordenadora do MEC, análises dos resultados dos Índices de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) mostram que, quanto maior a distância entre a idade adequada do aluno para a série em que ele de fato estuda, pior é o desempenho do estudante. A reprovação não garante aprendizagem. O importante é que a escola crie alternativas pedagógicas e estratégias para garantir que os alunos em dificuldade aprendem ao longo do processo.
Até maio, o Conselho Nacional de Educação deve aprovar novas diretrizes para o ensino fundamental. O objetivo do novo documento, de acordo com Callegari, é esclarecer possíveis dúvidas de gestores e deixar as novas regras e recomendações mais claras. Elas não são novas e os gestores têm a obrigação de observar as orientações do CNE. É uma triste surpresa constatar níveis de reprovação como esses, critica.
O conselheiro lembra que as escolas têm de preservar ambientes lúdicos para garantir a alfabetização de crianças tão pequenas.
A coordenadora do Ensino Fundamental diz que o MEC também realizará um mapeamento dos municípios que mais estão reprovando nos anos iniciais da educação básica. A partir daí, a proposta é estabelecer parcerias com os gestores dos locais mais críticos para resolver os problemas específicos.
Muitos municípios justificam a reprovação em faltas das crianças. Mas precisamos lembrar que a freqüência do aluno é responsabilidade da escola. Se a criança está faltando, é preciso verificar o porquê, diz.
O mais importante para ela é dialogar com diretores, professores e gestores educacionais. Precisamos lutar contra a exclusão escolar. Reprovar uma criança com seis anos de idade é tirar dessa criança o direito à educação, reforça Edna.
Reprovação em números
Em 2008, 2.266.667 crianças estavam matriculadas no primeiro ano do ensino fundamental. Dessas, 3,5% (79.333) foram reprovadas. Na série seguinte, em que havia 3.749.503 matrículas, 12,6% repetiram o ano (472.437). Na última série do ciclo da infância havia 3.899.166 alunos e 13,5% reprovaram (526.387).
Fábio Santos conta que na turma de aceleração conseguiu aprender a ler a escrever
Nas salas de aula do projeto, quando alguém pergunta se as crianças estão aprendendo, a resposta é rápida. Em coro, os alunos dizem que sim, sorridentes. Jhennefer Lorrany Silva Costa, 10 anos, diz que adora as aulas. Garante que, agora, consegue ler o que não lia. Layene Moraes, 10 anos, conta que lê todos os papéis que encontra pela frente e já sonha em ser juíza. “A professora ajuda muito”, garante Jhennefer Lorrany.
Fábio Santos, de 13 anos, deveria estar na 7ª série. Mas ainda não conseguiu sair do equivalente à 4ª série. Por isso, foi colocado na turma do Acelera na escola de Planaltina. A vontade de colaborar com as aulas passou a ser enorme. No meio dos colegas, não é mais tão diferente. Os pré-adolescentes à sua volta têm os mesmos gostos. A professora lhe dá a atenção que precisa. “Cheguei aqui sem saber de nada. Agora, já sei ler direito e aprender ficou bem mais fácil”, garante.
Nas salas de aula, cartazes com os nomes de todos da turma mostram quem leu os livros recomendados, quem fez as tarefas, as atividades planejadas para cada dia. O professor sabe o que deve fazer e os estudantes também. As atividades são monitoradas pelos coordenadores, que visitam a escola a cada 15 dias. “A autoestima do professor também muda. O trabalho dele reflete sucesso. Acredito no meu trabalho”, afirma Suely Sodré, professora do Se Liga desde 2007.
Em números
A realidade dos estudantes da escola CAIC Assis Chateaubriand é a mesma de milhares de crianças e adolescentes brasileiros. A Síntese de Indicadores Sociais do IBGE, publicada na semana passada, mostra que a trajetória de fracasso escolar das crianças brasileiras começa nas primeiras séries do ensino fundamental.
Em média, os alunos dessa etapa da educação básica mantêm um atraso de dois anos em relação ao ideal. As crianças de 10 anos de idade, que deveriam estudar na 4ª série, possuem apenas 2,3 anos de estudos concluídos. Aos 12, chegam a quatro anos. Aos 14, quando completariam os oito anos de ensino fundamental obrigatório (o País está em transição para nove anos), chegam a 5,8 anos de estudo.
Não é estranho que, depois desse início educacional, apenas metade dos adolescentes de 15 a 17 anos esteja cursando o ensino médio (etapa em que todos os brasileiros nessa faixa etária deveriam estar matriculados). Para conter o atraso escolar, não basta melhorar a qualidade de ensino para os que estão entrando na escola agora. É preciso recuperar a aprendizagem dos que ficaram para trás. "Seja qual for a tecnologia utilizada, para nós, do MEC, todos os esforços devem ser empreendidos para se garantir o direito básico de toda criança e adolescente brasileiro, que é o direito de aprender", comenta Marcelo.
 

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