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WALDIR SERAFIM
O senador Cristóvão Buarque veio a Cuiabá, recentemente, defender sua proposta de federalizar o ensino básico, projeto esse, aliás, que foi a principal, senão a única, plataforma de sua candidatura à presidência da República em 2006. Propõe ainda o senador a criação de um Ministério da Educação Básica, o 40º Ministério.
A qualidade na educação é, sem dúvida, um assunto preocupante, principalmente pela constatação do baixo nível em que se encontra o ensino no Brasil e isso leva a discussões apaixonadas, porém, inócuas do ponto de vista prático.
É verdade, que a qualidade da educação é uma preocupação crescente no mundo, e que tem gerado a criação de mecanismos de estímulo e cobranças, com vistas a buscar uma melhoria no sistema educacional, mas em nenhum caso existe uma proposta tão radical de centralização do sistema, como propõe o senador.
Existem experiências de centralização do ensino em países totalitários, e não federativos, e com população e número de escolas reduzidas, que nem de longe se assemelha ao caso brasileiro. Nos países assemelhados ao nosso, de ordenamento democrático e federativo, prevalece o sistema descentralizado, com maior ou menor coordenação por parte do governo central.
No Brasil, com a sua superlativa dimensão territorial, onde existem 5.564 municípios, em regiões diferentes, com características próprias, as dificuldades seriam igualmente superlativas e, conhecendo como funcionam as instituições nacionais, acredito ser impossível gerir com competência e qualidade o sistema gigantesco a ser constituído, e o prejuízo seria maior para a qualidade da educação.
Ademais, um projeto dessa magnitude não pode, ou não deve, ser discutido sem abranger um novo pacto federativo.
No Brasil, desde a Lei 9394/96 - LDBN (Lei de Diretrizes e Bases Nacional), lei que inova, mas respeita a tradição democrática e federativa das constituições anteriores, vigora os princípios da responsabilidade compartilhada na gestão do sistema educacional entre as instâncias federativas, cabendo aos municípios e estados a responsabilidade pela educação básica, que compreende a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, e tem duração de 18 anos, e o ensino superior à União. Determina ainda que a União deve gastar no mínimo 18% e os estados e municípios no mínimo 25% de seus respectivos orçamentos na manutenção e desenvolvimento do ensino público (art. 69).
Por seu lado, o texto constitucional vigente define a distribuição das receitas tributárias e, da mesma forma, a responsabilidade pela prestação dos serviços públicos entre os entes da federação.
Aí, cabe uma pergunta de natureza política: transferindo o ensino básico para a competência da União, essa teria acesso aos recursos orçamentários correspondentes, que hoje fazem parte dos orçamentos dos estados e municípios?
Uma segunda questão prática: como ficariam os milhares de professores e demais profissionais da educação, que são hoje servidores dos estados e municípios? Passariam eles também para a União? A norma vigente permite essa transferência de titularidade?
Essas são apenas algumas das questões que, a meu juízo, são fundamentais e que, por envolverem múltiplos interesses, não só financeiros, mas também políticos ferem de morte a proposta do senador.
A proposta é meritória, até mesmo pela oportunidade de instigar o debate, sobre assunto tão importante, mas creio que devemos aprofundar a discussão visando melhorar o modelo atual, sem nos aventurarmos em mudanças radicais, do tipo centralizador, conforme proposta, pois isso levaria inexoravelmente ao fracasso.
(*) WALDIR SERAFIM é economista em Mato Grosso
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