segunda-feira, 8 de abril de 2013

Cuiabá da minha infância

Wilson Carlos Fuá

Para chegar ao centro da cidade, vou descendo a Rua Coronel Escolástico numa manhã de setembro dos anos 60, sentindo o cheiro de manga madura, cheiro de Cajá e Tarumã. Vestindo o uniforme escolar (calça azul marinho, camisa branca e sapato “passo Double”), vou contemplando a beleza que representa cada ponto histórico desta cidade abençoada. Passo pelo “Poço do Buracão” nele tem história - lenda da 

“Alavanca de Ouro”, em seguida passando pela Praça do Rosário, ali foi extraído pelos escravos: sacos e sacos de ouro; chego a “Prainha”: córrego que um dia teve vida; seguindo pelo “Beco do Candeeiro” hoje de péssimas lembranças; sigo pela “Rua de Baixo” até chegar à “Praça da República”, passo em frente da Catedral e benzo o corpo, pedindo proteção ao Nosso Senhor Bom Jesus de Cuiabá. 

Depois dessa pequena viagem contemplativa chego ao magnífico e imponente prédio escolar, lembro que tenho prova na Escola Modelo Barão de Melgaço, cheguei muito tarde, depois da hora, conclusão: perdi a prova.
Aqui passo a viajar na minha infância vivida pelas ruas de Cuiabá, tendo uma conversa imaginária com a primeira estátua humana de Cuiabá, (ele ficava por horas parado no mesmo lugar e sem mexer), era o militar com a patente imaginária de General, com as insígnias e medalhas de condecorações de uma guerra que nunca existiu.
Pedi a prova, mas como sou sortudo, encontro uma moeda que encontrei também no meu imaginário infantil. Essa moeda estava na calçada e a partir estabeleço uma relação aparentemente louca entre aquela moeda e tudo que aconteceu de errado naquela manhã de setembro de 1964.
Eu tinha encontrado uma moeda, que alguém perdeu. Aquela moeda brilhou em meus olhos, antes que uma pessoa necessitada pudesse encontrá-la, eu peguei. Quem sabe tirei aquela moeda do caminho de alguém que estava precisando mais que eu. Quem sabe interferi no que é sagrado. Será que é um agouro?
Preciso livrar-me dela, o quanto antes, é agora, vou dá-la ao primeiro mendigo que encontrar. Vejo o General Saco na posição de sentido, como um verdadeiro militar. Sisudo com as suas sobrancelhas enormes e desalinhadas, e com suas barbas crescidas, vestindo elegantemente seu terno com as medalhas de condecoração da Guerra do Paraguai (Tampinhas de Garrafas) e com o inseparável Saco de Estopa no ombro. Paro diante dele e entrego-lhe a moeda como a querer ajudá-lo.
Nesse ato, por um instante parece que eu teria recebido uma benção de São Benedito, e as coisas instantaneamente entraram no eixo, senti um alívio. Mas o General Saco, não gostou e disse aos gritos, como se estivesse dando uma voz de comando aos seus subordinados: Não sou mendigo e nunca mendiguei.
Saiba de uma coisa Guri: tudo que tenho é meu; nunca roubei, nunca pedi nada a ninguém e a minha missão militar é defender Cuiabá contra as forças ocultas e desonestas, corruptas e trapaceiras. Lembre-se bem: estou a serviço de Cuiabá. Fique com a sua moeda, e entenda o sentido da vida e os sinais que a poderosa força da natureza coloca a nossa disposição. Ali no entroncamento da Av. Getúlio Vargas com a Rua Comandante Costa era o ponto avançado do General Saco, um ser espetacular, emblemático e inconfundível. Andava como um personagem que saiu do nada e indo para lugar nenhum, e ao olhá-lo, imediatamente começou a abrir o famoso “Saco de Estopa” que carregava nos ombros, e ficou um longo tempo olhando para dentro a examinar o seu conteúdo.
Logo em seguida, comentou comigo:
- “Sabe que as mangas podem lhe ensinar o significado da existência”?
Fiquei a pensar: o que é que esse louco está dizendo? Em seguida, tirou uma manga podre de dentro do Saco, e jogou-a fora.
- “Esta manga representa o momento que passou, não foi aproveitado na hora certa, e agora é tarde demais”. Em seguida, tirou do saco de estopa, uma manga ainda verde, mostrou-a, e tornou a guardá-la, e disse:
- “Esta manga representa o momento que ainda não aconteceu, é preciso esperar a hora certa para decidir”. Finalmente, tirou uma manga madura, descascou-a, e consumindo-a, e disse:
- “Esta manga representa o momento presente para tomar decisões. Saiba devorá-la sem medo e sem culpa”.
- “Durante a nossa vida estamos sempre a buscar as respostas pelas coisas que aparecem em nossas vidas, e esquecemos cada momento trás opções e mais opções, é só viver em busca das respostas os fatos e o exemplo periférico nos orienta”. Antes de decidir, converse com o seu coração, com as suas lembranças e busque na sua infância ou nas experiências intelectuais seguindo as lições do imaginário, e se a emoção for positiva, decida sempre sem remorso e sem dúvidas, mas decida sempre com ética e honestidade.
Este “causo” faz parte do passado de uma cidade cheia de história, é um presente em forma de passado, para parabenizar a nossa amada Cuiabá no dia do seu aniversário.
 

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