domingo, 20 de março de 2011

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Mateus Prado
Educador analisa o Enem, os vestibulares e o ensino brasileiroAdolescentes procuram ensino médio apenas por diploma
Enquanto escola abrir mão de educar, em vez de só ensinar conteúdos para o vestibular, alunos continuarão sem interesse por aulasNos últimos 50 anos, muita coisa mudou no mundo. Temos a TV, o telefone, os carros, a internet, as redes sociais e uma infinidade de novas tecnologias. Apesar de tantas transformações, a sala de aula continua sendo muito parecida com o que era no começo do século anterior. Mesmo escolas que adotam novas tecnologias, como as lousas digitais, as utilizam para o mesmo método, em que o tradicional professor fala e aluno ouve (ou fica bagunçando à sua frente).
É a famosa e perversa educação bancária, na qual o professor tenta depositar conhecimento na cabeça do aluno. Aliás, nem educação é. Educar é capacitar para o convívio em sociedade, para o seu desenvolvimento de forma a incluir e ser incluído, para o respeito às diversidades e para a valorização das diversas capacidades e talentos.
O que a escola faz hoje é cuidar, e na maioria das vezes mal, do ensino que é tido pela simples transmissão de conhecimento. Muitos dos nossos líderes políticos têm muito ensino (conhecimento) e pouca educação (valores que se sobrepõem às necessidades fisiológicas). Só isso explica tanto desrespeito com aquilo que é público.
Aos saudosos, eu convidaria a uma visita à uma sala de aula. Não tem nenhum outro lugar que se sentiriam mais à vontade. A única diferença de 50 anos atrás é que o ensino se universalizou, pelo menos no oferecimento, e por isso, naturalmente, sua qualidade piorou.
Essa falta de sensibilidade para entender que o mundo mudou e que a escola precisa abandonar o ensino, em favor da educação, é o que faz com que o ensino médio seja extremamente desinteressante para o adolescente. E digo mais: se o mercado de trabalho não tivesse passado a exigir, em muitos casos, o diploma de ensino médio, nem mesmo os 50% dos ingressantes que hoje concluem esta etapa de ensino estariam nessa situação.
A verdade é que muitos alunos, principalmente de escolas públicas, frequentam as salas para adquirir o diploma e manter a rede de capital social, e não para passar pelos seus conteúdos. Esse desinteresse de quem sai e também de quem fica tem a ver, além da inutilidade do ensino médio para a vida cotidiana percebida pelo aluno, com a tradição de transformar educação em ensino desde o ensino fundamental.
Quem não foi educado para valorizar processos educativos chega ao ensino médio, quando tem mais autonomia, entendendo que os conteúdos ensinados ali não servem para nada e que tiram tempo que pode ser usado para o trabalho, para o lazer ou para o ócio.
As escolas que a sociedade entende como boas, na verdade, vivem em função do dia do vestibular. Ensinam o máximo possível para que os alunos acertem questões em um ou dois dias de prova de seleção. Isso é terrível.
Imaginem que estas escolas passam exatos 600 dias dedicadas a preparar o aluno para uma única finalidade. Sim, preparam para o vestibular e não para capacitar o aluno para a vida universitária, como tentam convencer. Isto devido ao fato de que o que é exigido pelo vestibular está totalmente dissociado das habilidades e competências necessárias para o sucesso no ensino superior.
Hoje, o vestibular é como aquelas licitações direcionadas, onde o governante "escolhe" quem vai vencer colocando no edital exigências que poucas empresas são capazes de cumprir. Cada questão de uma prova de vestibular faz isso. Seleciona só aqueles que passaram por aquele conteúdo, o que está longe de conseguir medir quem são os melhores talentos para entrar na universidade.
Como a sociedade reconhece essas escolas como boas, as outras, inclusive as públicas, tentam seguir o modelo. Até as piores colocadas nas avaliações de ensino médio se esforçam para ensinar algum conteúdo desimportante para o aluno, mas cobrado no vestibular, de física, química ou biologia e outras matérias.
Acontece que os alunos possuem talentos e interesses diferentes. Com a velocidade do mundo da informação isso fica mais latente. Como querer que o aluno ache normal ficar sentado pelo menos cinco horas por dia ouvindo alguns donos da verdade? Como querer que o aluno concorde em decorar os afluentes da margem direita e esquerda do Rio São Francisco para obter melhor consciência ambiental?
Como querer que fique quieto em sala um aluno que vive sob os estímulos de alta velocidade da TV, das grandes cidades, da internet, das baladas ou do mundo do trabalho ? Como querer que alunos com altas capacidades em desenho, em artes, em oratória, em inteligência emocional ou espacial, entre outras, tenham que se resignar e aceitar o currículo escolar em detrimento do desenvolvimento pessoal naquilo que gosta?
Com essa escola, que faz a opção de ensinar em detrimento de educar, essas e outras coisas não são possíveis. E, mais uma perversidade, a maioria dos que passam por ela e se formam acrescentam pouca coisa a mais que um diploma em suas vidas.

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