Claudia Laitano | claudia.laitano@zerohora.com.br
Todo mundo já ouviu – do pai, da mãe ou de ambos – um “quando eu tinha a tua idade não era assim”. Essa é uma daquelas frases que a gente passa a adolescência inteira escutando – convictos de que, esclarecidos como somos, jamais vamos passá-la adiante para a geração seguinte. Até que um dia, em uma discussão boba com o filho sobre lavar ou não a louça, ganhar ou não o último modelo de videogame, você é surpreendido pelo som da própria voz dizendo uma frase que obviamente foi implantada no seu cérebro por forças muito mais poderosas do que suas convicções de adolescência: “Quando eu tinha a tua idade...”.
Pai trocando fraldas, mãe pagando as contas, filho morando em casa até os 30 anos e achando ótimo, casais gays adotando crianças, tudo isso transformou e continua transformando os arranjos familiares tradicionais. Mas existe alguma coisa na relação de pais e filhos que, em essência, mudou pouco ou quase nada. Continua havendo o período do amor incondicional, o momento da ruptura e, com sorte, o retorno ao entendimento mútuo na maturidade. Até mesmo acusar seu filho pelo crime de não ser exatamente como você era na idade dele (queixa que traz implícita a confissão de que você não foi um pai exatamente como o seu, para o bem e para o mal) parece fazer parte de um script tão antigo quanto inescapável. E la nave va.
Meu palpite é que as maiores vítimas do ocaso do patriarcado não foram os pais, mas os professores. Muito mais do que na família, é na sala de aula que o modelo de hierarquia que sustentava boa parte do processo de apredizagem tradicional parece ter ido para o espaço. Dentro de casa, pais e filhos tendem a concordar que o ideal para a convivência – e a sobrevivência – é encontrar um meio-termo entre a família de antigamente, que proibia tudo, e a ausência total de limites. Na sala de aula, em muitos casos, saiu-se da palmatória para o vácuo total de autoridade. O modelo O Ateneu de ensino – alunos massacrados por professores tiranos que espancavam com a régua quem errava a tabuada – tornou-se tão anacrônico quanto as polainas. E não podia ser diferente. O problema é que o oposto desse modelo, o não-reconhecimento da autoridade do professor, virou lugar-comum no Brasil, tanto na escola pública quanto na particular – onde o aluno aprendeu a ver o educador como um prestador de serviços, um funcionário que pode ser confrontado inclusive quando faz corretamente seu trabalho, reprovando e cobrando desempenho.
Uma notícia publicada na semana passada ilustra o ponto a que chegou esse clima de enfrentamento em sala de aula. Uma universitária de Brasília foi condenada a pagar R$ 5 mil de indenização por danos morais a um professor por tê-lo xingado e ameaçado fisicamente. Depois de ter sido pega colando e ter a prova recolhida, a universitária deu uma aula de falta de civilidade para o professor e os colegas: “Ela me chamou de babaca, moleque e usou até palavrão. Disse que iria me bater na saída da aula”, contou o professor estarrecido.
Um professor ameaçado fisicamente pode chamar a polícia ou abrir um processo, como fez esse professor de Direito. Mas os pequenos desrespeitos cotidianos – já ouvi histórias até de alunas sacando da bolsa o esmalte e a acetona para fazer as unhas durante a aula... – são os mais assustadores. Não apenas porque mostram que os alunos (futuros juízes, futuros médicos, futuros professores...) não têm a mínima noção do que estão fazendo ali, mas porque uma instituição de ensino que permite que isso aconteça está mais perdida ainda do que os alunos.
No meu tempo de aluna, definitivamente não era assim. Ops.
Publicado em 24 de janeiro de 2009 em Zero Hora
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