terça-feira, 19 de abril de 2011

Igualdade: A gente lê por aqui

A luta pelo direito da pessoa com deficiência auditiva em encontrar livros em LIBRAS
Por Renata Soares
divulgação / Biblioteca Pública Anísio Teixeira

Espaço da biblioteca para pessoas com deficiência auditiva

Ana Carolina Praxedes aprendeu a se comunicar com a Língua Brasileira de Sinais desde bem pequena, já que, ainda bebê, ficou surda. Formada em Pedagogia com especialização em Materiais Pedagógicos, ela é autora de jogos educativos elaborados em Libras, uma espécie de suporte aos alunos que estão começando a aprender o português. Segundo a especialista, essa é uma ferramenta essencial para reconhecer o significado das palavras e deve ser inserida de maneira paralela ao aprendizado da Língua Portuguesa. Ana, mais que ninguém, sabe da importância do acesso à informação dessa linguagem, já que, além de atuar profissionalmente na área, tem a experiência pessoal como fonte de motivação. "Tive que superar a dificuldade de outras tantas pessoas com deficiência, que encaram o problema da falta de livros e pouca variedade deles durante o processo de alfabetização", conta a especialista.

O Ministério da Educação e Cultura (MEC) exige que todas as escolas se adequem à diversidade linguística de seus estudantes, criando formas igualitárias de acesso ao material escolar, didático e de pesquisa. "Para pessoas com surdez, isso significa ter disponível o livro traduzido em Libras e materializado em software específico que comporte um vídeo na língua dos sinais", esclarece Neiva Albres, fonoaudióloga e pedagoga. A profissional adianta que o MEC tem trabalhado na produção desse material, e que as enuobras selecionadas e adquiridas para o plano de 2011 deverão ser entregues em breve. "Esses livros devem integrar também o Acervo Digital Acessível, um espaço virtual que estará disponível no portal do Ministério.

Estamos vivendo um momento de mudança, em que ações são desenvolvidas para minimizar a desigualdade social", afirma. Se na teoria tudo é perfeito, na prática o cenário é outro. Neiva chama a atenção para um dado preocupante: a dificuldade das pessoas com deficiência auditiva em ter acesso à cultura se deve ao fato de poucas editoras estarem preocupadas com a causa.

De grão em grão

"O acesso aos livros em sua línguamãe (no caso do surdo, a Libras) é uma forma de trabalhar com o conhecimento de mundo, por meio de situações reais e contextualizadas, com sequência de fatos e acontecimentos", enumera a pedagoga Débora Rodrigues Moura, mestre em Línguística Aplicada pela PUC-SP. A pedagoga reforça que a leitura de uma obra regular mesmo para o surdo que tem o domínio do português é uma atividade realizada em um idioma diferente. É preciso que as bibliotecas com um bom acervo nessa linguagem tenham exemplares de assuntos diversos, de história contemporânea a materiais didáticos. "A criança deve ter acesso a vários tipos de textos e gêneros discursivos. É uma maneira de utilizar a leitura e a escrita com diferentes propósitos e práticas sociais. Com a criança surda não é diferente. Essa diversidade é igualmente necessária", alerta Débora. O conceito é compartilhado pela Biblioteca Pública Anísio Teixeira, em Salvador (BA), que embora conte com um acervo pequeno de livros na língua dos sinais, mantém um setor de atendimento especial para pessoas com deficiência auditiva. "Estamos começando. De um total de 14 mil obras, nosso acervo em Libras conta com 40 títulos, alguns periódicos, DVDs com histórias, documentários e contos infantis", explica a diretora Laura Galvão.

"Ter uma biblioteca com livros em Libras é garantir que qualquer pessoa tenha acesso à cultura em sua primeira língua"
defende Débora Moura, mestre em Línguística Aplicada pela PUC-SP

A frequência dos usuários que procuram o acervo especial é quase 20% da procura geral da biblioteca. A biblioteca, que deu início às atividades do Setor de Atendimento à Criança e ao Adolescente Surdo (SACAS) há apenas dois anos, ainda encontra dificuldades para prosseguir. Segundo Laura, a demanda cresce e nem todas as solicitações podem ser atendidas. "Apesar do suporte que recebemos da Fundação Pedro Calmon, precisamos de mais títulos, CDs e DVDs para esse público. Doações são mais do que importantes, já que o papel da biblioteca pública é socializar e dar ao leitor espaço organizado onde possa buscar e trocar informações gratuitamente", explica a diretora.

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